Mostrar mensagens com a etiqueta mangá. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta mangá. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, 22 de abril de 2025

Edens Zero


Hiro Mashima (2024). Edens Zero #1. Lisboa: Penguin.

Dada a explosão do mangá no mercado português, com um número crescente de títulos e editoras, combinado com a minha cada vez mais implacável falta de tempo, confesso andar muito arredado de novidades editoriais. Peguei nesta, para experimentar e porque precisava de uma leitura de baixo esforço intelectual (não interprentem como insulto, esta vertente de mangá é intencionalmente simples, é essencialmente de entretenimento). Seduziu-me a premissa, onde uma jovem criadora de conteúdos vai a um planeta de robots, antigo parque de diversões, para fazer vídeos e cruza-se com um rapaz, o único humano no planeta. Suspeitei que havia aqui algumas glosas quer à cultura pop, quer às culturas de influência digital, e arrisquei.

Saiu-me algo muito bizarro, como só os japoneses conseguem. Uma história a alavancar-se para saga, um mundo ficcional surreal, e algumas surpresas narrativas. Há um toque de humor creepy na relação entre um rapaz que como só conviveu com robots, não sabe estar entre humanos e a rapariga que quer ser famosa e passa a vida a filmar conteúdos com o seu gato. As peripécias são bizarras, começam pela aparente expulsão do rapaz pelos robots que ele considerava como amigos, e de facto eram-no, mas fingirem tornar-se inimigos foi a forma que os mecanismos inteligentes encontraram para fazer com que o rapaz largasse o que sempre conheceu e fosse à sua vida; até ao mergulho num mundo ficcional onde pululam influencers, há piratas espaciais e uma figura tutelar, apelidada mãe, que parece viver no interior de um enorme dragão espacial. Tudo contado num estilo manga muito formal, dentro da norma estética do género. 

Nada como os japoneses para tirarem partido do mais puro nonsense no entretenimento mais simples.

terça-feira, 27 de junho de 2023

Clube de Ocultismo e as Bonecas da Morte


Hideshi Hino (2023). Clube de Ocultismo e as Bonecas da Morte. Lisboa: Sendai.

A editora Sendai continua na sua senda de nos trazer o lado menos pop, mais erudito e experimental do manga. E, surpresa das surpesas, a editar um segundo livro de Hideshi Hino, um autor que não é para todos os gostos. Se bem que este livro surpreende pela sua bonomia, não temos aqui um Hino a fazer o leitor resvalar no horror absurdo e absoluto. A história é mais bucólica e tranquila, apesar de, vinda de quem vem, ter momentos visuais fortíssimos. As bonecas de Hino são indutoras de pesadelos e tremores noturnos.

Um clube de estudantes de liceu que se dedica a experimentar com o ocultismo tem um grande desafio: perceber a origem da maldição que paira sobre um dos seus elementos. E, para isso, terá de viajar para um espaço além da realidade, habitado pelos restos das bonecas descartadas pelas crianças. Brinquedos com alma, decaídos, amargurados, e dispostos a fazer em fanicos os humanos com se cruzam. Uma história simples e divertida, longe dos maiores delírios deste mangaka, mas com momentos visuais de profundo horror gráfico.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

Butterfly Beast


Yuka Nagate (2022). Butterfly Beast Vol. 1. Lisboa: A Seita.

A estreia editorial da Seita no manga faz-se de forma muito promissora. Este Butterfly Beast é um manga histórico, que nos leva ao fragmentado Japão do século XVII e aos frágeis períodos de paz entre as guerras entre os senhores da alta nobreza. É num destes períodos que os shinobi, os ninjas originais, são desmobilizados à força. Alguns tornam-se membros das forças imperiais, mas a maioria, abandonados à sua sorte, tem de sobreviver numa sociedade impiedosa. E, com as suas capacidades únicas, resta-lhes o crime. Mas há ainda um terceiro caminho que estes ex-combatentes podem trilhar - caçar os ninjas criminosos, punindo-os quer pelos crimes, quer pela traição ao seu código de honra. Nas ruas do bairro de Yoshiwara, uma dupla especialmente letal de caçadores age para travar os piores criminosos. Metade dessa dupla é Ochu, uma mulher bela e letal que, sob a cobertura da prostituição num bairro de lanterna vermelha, vinga a sociedade das piores ameaças. 

Belissimamente desenhada, esta história negra assenta numa cuidadosa reconstituição histórica, aliada a um ritmo narrativo frenético. A sensualidade cruza-se com cenas de violência bem coreografadas em luta corpo a corpo. De certa forma, este livro recorda-me Lady Snowblood, por colocar uma mulher guerreira como protagonista numa história de artes marciais e vinganças, embora não seja tão estilística e cinematográfica. 

quinta-feira, 30 de junho de 2022

H-alt: DJ Cat Gosshie World Tour


A premissa é absurda, são as aventuras de um gato DJ que viaja pelo mundo, toca vinis, fuma umas cenas, cruza-se com diferentes pessoas. Não é suposto ser verosímil, é uma sublimação dos gostos de viajar, gatos e boa música. O livro é feito de episódios onde o gato-dj se descobre a tocar música nos mais inesperados cantos do mundo. Este livro tem entrada direta para a categoria dos mais surreais na biblioteca. Um manga inesperado, divertido, luminoso. Recensão completa em H-alt: DJ Cat Gosshie World Tour.

sexta-feira, 17 de setembro de 2021

H-alt: A Raposa e o Pequeno Tanuki


A Raposa e o Pequeno Tanuki é uma belíssima fábula, que se inspira no riquíssimo imaginário das tradições japonesas para nos trazer uma história de sensibilidade muito apurada. Mi Tagawa dá-nos a conhecer os animais divinos japoneses, criaturas que podem servir deuses específicos ou serem mais selvagens. Recensão completa em H-alt: A Raposa e o Pequeno Tanuki.

quarta-feira, 25 de agosto de 2021

Manga: Hyaku Monogatari; Phantom Seer; Kamen Rider Kuuga


 Natsuhiko Kyogoku, Hyaku Monogatari

Com um traço simples e elegante, são adaptadas algumas das pequenas histórias de fantasmagorias que formam a tessitura do sobrenatural tradicional japonês. Não esperem voos de visceralidade, ou cruzamentos com memorialização (como no soberbo NonNonBa). São terrores muito simples, pouco mais do que meros vislumbres que causam arrepios, premonições, sonhos inquietantes. 

Togo Goto, Kento Matsuura, Phantom Seer

Ver fantasmas e outras assombrações é uma faculdade rara, que só alguns conseguem ter. E não é fácil querer ser um jovem adolescente normal, quando se tem a carga de ser um shamã natural, controlando um demónio interno capaz de devorar todo o tipo de assombrações. Complica mais quando se conhece uma jovem adolescente com uma estranha propensão para atrair fantasmas. O resto, é uma daquelas divertidas mas pouco consequentes histórias de mangá juvenil, em que jovens com poderes enfrentam tenebrosas ameaças, crescendo um pouco sempre que superam mais um desafio. 

Inoue Toshiki, Ishinomori Shoutarou, Kamen Rider Kuuga

O planeta é um palco de um jogo mortífero entre alienígenas insectóides. Cada um tenta subir nos rankings de uma competição milenar, e para isso tem de matar muitos humanos. A defesa contra estes monstros é quase impossível, mas há uma esperança: uma força capaz de os deter encarna regularmente em humanos. Estes, os kamen rider, são os únicos capazes de derrotar os insetos alienígenas. É essencialmente isto, apesar de haver algum jogo de interesse entre os personagens. A saga é longa, houve vários kamen rider, mas destila-se tudo numa longa história de aprendizagem de uso de poderes em luta contra monstros. Divertido, mas muito repetitivo.

terça-feira, 10 de agosto de 2021

Manga: Dokuro; Ayako; Shiga Hime


 Tetsuya Saruwatari, Dokuro.

Uma daquelas bizarrias que só no Japão. Dokuro fala-nos de um homem com uma missão: derrubar o líder de uma seita religiosa, um homem que se aproveita da crença dos outros para enriquecer e manter os seus vícios. A sua seita é poderosa e não hesita a recorrer a violência extrema, estando entrosada com a política local. O herói sofrerá uma contínua espiral de violência e tortura às mãos dos agentes do culto, até conseguir aproximar-se o suficiente do líder para o executar. Essencialmente, o argumento é uma desculpa para longas sequências de lutas.


Osamu Tezuka, Ayako.

Uma história cruel, muito longe do otimismo futurista que geralmente associamos a Tezuka. Quando um soldado japonês regressa à casa familiar, depois da derrota, é recebido pelo primeiro de muitos mistérios: uma rapariguinha de quatro anos, que lhe dizem ser sua irmã, apesar da longa idade da sua mãe. A partir daqui, começa-se a desenrolar o intricado nó de uma família tradicional japonesa, cujo patriarca rege com punho de ferro, e o filho primogénito não hesita em oferecer a sua esposa para saciar os desejos do pai, para garantir a primazia no testamento. Apesar das mudanças forçadas pela administração americana, que levaram à distribuição de muitas das terras da família pelos camponeses, estes ainda são suficientemente poderosos para fazerem o que querem. O jovem soldado também não é inocente, é um agente ao serviço de uma organização secreta que, aparentemente, trabalha para os americanos, e torna-se cúmplice numa série de assassinatos políticos. No pano de fundo, o Japão no pós-guerra. As intrigas da família, a sua cegueira pelo prestígio, poder e dinheiro, de onde só uma irmã se safa, levam ao impossível: Ayako é dada como morta, passando a viver escondida numa cave. É aí que cresce, se torna adolescente e mulher, abusada pelos irmãos. Acabará por fugir e refugiar-se junto do irmão ex-soldado, agora líder de uma organização criminosa, que a tenta reabilitar. A história tem um final tenebroso, todos os que tentam dominar Ayako morrem num acidente numa gruta, apenas a jovem sobrevive. Conto muito cruel, violento, e talvez Ayako seja uma metáfora para o Japão contemporâneo. Uma jovem que vive aprisionada pelos familiares que a antecedem, que só com a morte destes se consegue libertar e traçar o seu caminho. Metáfora para a história do Japão, e a sua encruzilhada no pós-guerra, com um país renovado a nascer das cinzar, mas que só ganharia maturidade quando se libertasse das forças obscurantistas do passado?

Sato Hirohisa, Shiga Hime.

Claro que no mundo do mangá, o vampirismo teria de ter contornos ainda mais viscerais. No mundo de Shiga Hime, grandes vampiras pertencem a uma espécie devoradora de sangue, que sobrevive caçando os meros humanos. Mas a imortalidade confere-lhes refinamento, e a mera caçada não as contenta. Preferem subjugar jovens facilmente impressionáveis, tornando-os seus familiares: um meio termo entre humano e monstro, já infetados pelo mal de sangue das vampiras, mas ainda capazes de se mover sob a luz do dia. Para apimentar a coisa, até permitem que estes familiares sejam os únicos seres que, com as suas mutações que transformam membros do corpo em lâminas, são capazes de matar irremediavelmente as vampiras. Escrevo "as" porque isso é um dos elementos da série, as vampiras assumem a forma de mulheres cujo corpo sensual oculta uma tremenda monstruosidade, e não é por acaso que os seus familiares são sempre jovens adolescentes. Os traços freudianos aqui são mais que muitos. Quando um jovem cai sob o poder de Miwako, uma das mais antigas vampiras, que o usa no seu eterno jogo sangrento com as irmãs, este irá ser obrigado a desempenhar as funções de caçador. É dos poucos que não se rende aos encantos da vampira, apaixonado como está por uma colega de turma, o que ainda torna a situação mais deliciosa para a vampira, que se compraz a manipular sentimentos, e até a corromper a jovem adolescente, tornando-a uma jovem vampira (com toques muito explícitos de Carmilla). Algo que não agrada ao jovem inadaptado que foi o familiar de Miwako antes desta trair todas as promessas que lhe foram feitas. O destino destes três jovens será digladiar-se numa interminável luta sangrenta, meros joguetes nas mãos das criaturas que servem por obrigação ou fascínio. Uma divertida mistura de horror com mangá juvenil, com algum toque de erotismo (como não poderia deixar de ser, dado que o vampirismo é em si uma imensa metáfora erótica) mas, essencialmente, daquela visceralidade sangrenta, cheia de vinhetas monstruosas, que o mangá de terror é capaz de nos oferecer. Sim, a vampira Miwako merecer um lugar na galeria de vampiras icónicas.

terça-feira, 3 de agosto de 2021

Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba, Vol. 1: Crueldade


Koyoharu Gotouge (2021). Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba, Vol. 1: Crueldade. Lisboa: Devir.

Tudo aponta para a tragédia. Quando um jovem esforçado desce da montanha para vender carvão  e assegurar um inverno mais confortável para a sua família, está longe de desconfiar da tragédia que o aguarda quando regressa. Durante a noite, um dos muitos demónios que assombra a região fez da sua família um repasto supimpa. Pior, a sua querida irmã sobreviveu, e está a transformar-se numa criatura demoníaca que se alimenta de humanos. Que há um rapaz de fazer? Procurar uma forma de curar a irmã, e graças a isso, envolver-se com os caçadores de demónios, a outra face de uma luta milenar entre as criaturas devoradoras e os humanos. Inexperiente e acabado de cair num mundo que desconhecia, o jovem dedica-se com toda a tenacidade a treinar, para se tornar um defensor das gentes contra as criaturas devoradoras. E, eventualmente, salvar a sua irmã.

Diga-se que a leitura foi uma boa surpresa, um shonen muito leve, bem ritmado. Mas destacaria mais o traço elegante do mangaká, cheio de detalhes, visualmente rico, elegante e com um cuidado trabalho de referenciação visual sobre a época histórica onde esta história se passa.

terça-feira, 1 de junho de 2021

Manga: Your name; Legend of Giants; 2001 + 5

 

Makoto Shinkai, Your name.

O que começa como uma estranha história de amor acaba por resvalar numa intrigante aventura entre diferentes tempos. Quando uma rapariga que vive no interior japonês começa a desejar viver em Tóquio, descobre que tem o poder de trocar de corpo com um rapaz da cidade. O que em si já é um bom argumento para situações de fantasia com toque cómico. Mas a história adensa-se quando o rapaz percebe que se está a apaixonar pela rapariga com quem troca regularmente de vida. Ao tentar procurá-la, descobre que esta morreu anos antes, num estranho cataclisma, quando um meteoro destruiu a sua cidade. Aqui o livro mergulha definitivamente num sci-fi poético, o laço entre estes dos jovens ultrapassa o tempo e permite, até, mudar o curso do passado. Mas há um preço: o esquecimento do amor de duas pessoas, que se vão cruzando pela cidade de Tóquio sentindo sempre que procuram alguém. Surpreendente e tocante, depois de o ler não me surpreende que os meus alunos apreciem tanto esta obra.


Yukinobu Hoshino, Legend of Giants.

Fiquei fã do trabalho de Hoshino com o genial 2001, a sua ficção científica clássica, feita de pequenas histórias Hard SF bem medidas. Este Legend of Giants colige trabalhos mais antigos, claramente dos primeiros anos da sua carreira, do final dos anos 70. Nota-se no estilo gráfico, algo retro e ainda a amadurecer, e nos temas. A história que dá o título ao livro imagina seres gigantes num passado distante da Terra, capazes de feitos impossíveis mas que desapareceram num cataclisma. Destruição de mundos parece ser um tema recorrente, e o livro termina com uma bizarria, as aventuras de dois patrulheiros de auto-estrada numa Terra coberta de vias rápidas. 


Yukinobu Hoshino, 2001 + 5

Continuando o estilo de 2001 Nights, Hoshino publicou mais algumas histórias na mesma veia. São, como o seu percursor, histórias contidas que imaginam um distante futuro nas estrelas. Talvez a mais tocante seja aquela em que duas naves controladas por sistemas computorizados se cruzam na solidão do espaço sideral, e regressam à Terra juntas. Quando a energia de uma começa a falhar, a outra decide acompanhá-la numa morte que será evitada pela intervenção de uma força misteriosa, que incorporará as memórias digitais num casal humano, preservado criogenicamente numa das naves. Não há o compromisso com uma FC hard que caracteriza 2001 Nights, Hoshino cruza aqui alguma fantastia e esoterismo.

quinta-feira, 13 de maio de 2021

Comics: DC Goes to War; Black Magic; Three Jokers

 


Robert Kanigher , et al (2020). DC Goes to War. Nova Iorque: DC Comics.

Um mergulho nos personagens de comics de guerra da DC, durante anos uma importante vertente editorial no género. Tem os suspeitos do costume - Blackhawk, Sgt. Rock, Enemy Ace, Unknown Soldier ou Haunted Tank, mas também personagens mais obscuros como The Losers ou Mademoiselle Marie. A temática é o esperado - histórias de aventura em combate. Mas é interessante ver a evolução de algo que se pedia que não passasse do elementar, do herói que combate os inimigos, para textos mais complexos (dentro dos limites dos comics), muitas vezes com fortes mensagens pacifistas e uma vontade de mostrar que a guerra não é aventura, é tragédia e desespero. Algo inesperado em títulos para entreter adolescentes. Isso é o efeito Robert Kanigher, cujas histórias para Sgt. Rock, Enemy Ace e Unknown Soldier mostram soldados amargurados, com dúvidas sobre o dever negro que cumprem, que convivem com a morte dos camaradas e amigos, ou mal sobrevivem a aventuras que se esperaria que fossem empolgantes. Isso é particularmente notável na história de The Losers que o livro reproduz - personagens que têm em comum ser os únicos sobreviventes das suas unidades, mas que não irão sobreviver a uma missão. Uma excelente introdução aos comics clássicos de guerra da DC, que nos dá um panorama da evolução e temáticas do género, e surpreende pela inesperada profundidade de algumas histórias.

Masamune Shirow (1998). Black Magic. Milwaukie: Dark Horse.

No passado longínquo, Vénus era o berço de uma civilização que se espalhou pelo sistema solar. Composta por seres antropóides, biodróides e humanos, vivia sob as maquinações de influentes políticos. As suas lutas internas levaram-na à destruição. Black Magic é a história dessas lutas, onde uma andróide biológica com capacidades técnicas e mágicas semeia o caos numa sociedade que está a ser conduzida para a sua aniquilação. Ou algo assim. Black Magic não faz muito sentido, é Shirow ainda jovem a desenvolver o seu estilo gráfico e capacidades narrativas. Nota-se os elementos estilísticos que veio a desenvolver em Ghost in the Shell, a incipiência dos seus grafismos tecnológicos e textos onde o humor e a ação coexistem.


Geoff Johns, Jason Fabok (2020). Batman: Three Jokers. Nova Iorque: DC Comics.

Três variantes do Joker. Três variantes de Batman. Geoff Johns triplica o número de Jokers nesta história, em que recupera o Joker camp dos anos 70, o psicopata dos 90 e o atual supercriminoso. Gotham está, como habitual, a ferro e fogo. Como tudo no Joker, é um jogo que instrumentaliza Batman, e os traumas de Batgirl (remetendo para a violência de Killing Joke) e Red Hoode (remetendo para Death in the Family). A aparição simultânea numa é explicada, nem é sublinhada como mistério, a linha narrativa não leva a lado nenhum. Mas de Geoff Johns já se sabe o que esperar: muita pretensão, pouco desenvolvimento. Safa-se a recuperação em tom de ironia muito negra de um personagem secundário obscuro, Gaggy, um dos sidekicks dos tempos camp de Joker.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

H-alt: No Longer Human

 


Em No Longer Human, Junji Ito está firmemente no campo do horror psicológico, do terror que vive no interior do ser humano. Esta adaptação, eficaz, de uma obra sobre a incapacidade de se adaptar à convivência com a humanidade é profundamente inquietante. Ito usa com mestria e equilíbrio a sua estética para nos provocar desconforto, sublinhando o caráter desta história sobre a desumanidade interior. Resenha completa em H-alt: No Longer Human.

quinta-feira, 9 de abril de 2020

Death Note: Black Edition, Vol. 1


Tsugumi Ohba, Takeshi Obata (2010). Death Note: Black Edition, Vol. 1. S. Francisco: Viz Media.

Quando um shinigami, um semi-deus da morte, se esquece do caderninho preto onde aponta o nome daqueles que morrem no mundo dos humanos, está lançada a receita para uma história muito negra. O caderninho é encontrado por um bom rapaz, daqueles estudantes muito certinhos, que depressa se apercebe do poder de vida ou morte que detém nas mãos. Para provocar a morte de alguém, basta escrever o seu nome enquanto se pensa no seu rosto. Escolher uma forma de morte é opcional, mas eventualmente útil. Decide usá-lo para uma versão distorcida do bem, como instrumento de castigo imediato dos criminosos. No entanto, a morte repentina de muitos condenados, mesmo que por influência sobrenatural, não passa despercebida às autoridades, que colocam um misterioso detetive no encalço do misterioso assassino. O jovem detentor do caderninho da morte depressa descobre que tem de ser muito cuidadoso com as suas ações, e eliminar pessoas inocentes para poder continuar a missão de que se incumbiu. Quanto mais a história progride, mais cego fica perante o paradoxo da maldade do que acredita serem boas ações. Claro que o verdadeiro objetivo do semi-deus é o de se divertir com o impacto que o seu objeto tem no mundo humano, especialmente com as ações que despoleta.

Esta história desenrola-se num ritmo episódico muito marcado. A cada novo capítulo o enredo adensa-se, e o jovem vê-se envolvido numa trama cada vez mais complicada. O sentido de ironia negra é muito forte, sublinhando o paradoxo violento da ideia de que os fins justificam os meios. Sem ser um excelente mangá, simples e pensado para leitores jovens, não deixa de ser uma leitura intrigante, que surpreende pelo seu rigor narrativo e discreto humor tenebroso.

terça-feira, 17 de março de 2020

Criatura Maldita


Hideshi Hino (2019). Criatura Maldita. Barcelona: La Cúpula.

Dos mais estranhos, e inquietantes, contos cruéis de Hino. A história é de um surreal negro, com toque daquele sobrenatural japonês que foge às nossas lógicas de crime e castigo, ou de vitimização e inquietude. Um conto de horror que escava sempre mais fundo, mas que termina com um inesperado lampejo de humanismo no fundo de uma tenebrosa descida à selvajaria.

O momento feliz de um pai ao nascer as filhas gémeas é estragado pela misteriosa deformidade de uma. Entre a incredulidade e vergonha, o homem faz o impensável, abandona o bebé deformado numa lixeira. Onde, contra todas as probabilidades, sobrevive, por entre os detritos daquele a que Hino chama de cemitério do mundo. A menina é realmente monstruosa, até os animais fogem dela, por instinto aprende a caçar. Tem uma peculiar fisiologia. O seu corpo está em constante apodrecimento, roído por vermes, e apenas o sangue das criaturas que apanha a mantém viva. Atraída pelas luzes da cidade, depressa encontra na carne humana uma nova fonte de alimentação. É na cidade que o instinto a leva à casa dos pais, onde descobre a sua irmã gémea. Onde percebe, olhando para a menina perfeita da qual é o reflexo distorcido, tudo o que lhe foi negado, o regaço maternal, o conforto mais simples, o amor humano. Poderá, com um gesto canibal, trocar de lugar com a sua irmã. Mas, num momento da história que não consigo compreender, decide não o fazer. Foge por entre as trevas, ao som dos gritos da mãe e irmã que não suspeitam que existe, do desespero do pai que a reconhece, alvejada pela polícia que dá caça à criança canibal. Arrasta-se para o seu covil no meio do lixo, onde se deixa adormecer, talvez para jamais voltar a acordar.

terça-feira, 3 de março de 2020

Dream Fossil: The Complete Stories of Satoshi Kon


Satoshi Kon (2015). Dream Fossil: The Complete Stories of Satoshi Kon. Nova Iorque: Vertical Comics.

O que me surpreendeu nesta leitura de histórias do cineasta Satoshi Kon foi a sua banalidade. São contos sem bizarrias extremas, fantasia grandiosa, ou fantástico avassalador. Não têm um género específico. Umas tocam na ficção científica, outras no desporto, outras nas vidas dos estudantes. A maior parte tem um ritmo de descarrilamento que, para japoneses, deve ser um crescendo de humor progressivamente hilariante. Habituado como estou à obra dos mangaka especializados num género específico, a surpresa foi descobrir como Kon aplica a sua capacidade narrativa e gráfica em diversos contextos. Ver histórias tão díspares reunidas num mesmo livro recorda-nos que, por lá, há títulos para todos os gostos dos leitores. Mesmo aqueles que adoram histórias sobre as agruras de estudantes de liceu em véspera de exames. A leitura tem interesse, a capacidade narrativa de Kon é admirável, mas as temáticas nem por isso. Representam um mainstream comercial do mangá que não atinge a expressão própria dos maiores autores, nem a excelência de obras focadas num género específico.

Carve: Num futuro pós-apocalíptico, a humanidade refugiou-se em cidades para sobreviver à destruição. Mas expulsa delas humanos que revelam capacidades especiais. Estes sobrevivem nas ruínas, agora tornadas habitáveis, mas começam a ser alvo de robots enviados pelos habitantes das cidades. As suas capacidades especiais dão excelentes armas de guerra.

Horseplay: Quando uma equipa escolar de baseball se vê na iminência de ir a um campeonato nacional, rebenta a loucura na escola. Os até ao momento ignorados desportistas levam com treinos exigentes, e as jeitosas cheerleaders da escola deixam de lado a equipa de futebol para os vir animar. As tensões vão-se elevando, e o caos rebenta. Uma história sobre os delírios do desporto, contada com um sentido de humor histriónico.

Baseball Brats: Crianças que jogam baseball, fascinadas pelo jogo, e que se esforçam por jogar sempre melhor. É só isto. Possivelmente, há todo um subgénero de mangá dedicado ao baseball.

Summer of Anxiety: Um jovem estudante de liceu, com o carro avariado, decide usar uma bicicleta para viajar no Verão. O seu destino é a cada da rapariga que gostaria que fosse sua namorada, mas a caminho envolve-se numa aventura mirabolante. Ao acampar numa praia durante a noite, ajuda uma jovem que está a ter problemas com o namorado a fugir deste. Que, não estando pelos ajustes, chama os seus amigos para se vingar do rapaz. Seguem-se peripécias e perseguições, tendo pelo meio a ansiedade de um jovem que se mete em sarilhos para ajudar uma mulher, mas nunca foi beijado.

Focus: Nas vésperas dos seus exames de acesso ao ensino superior, um estudante começa a mostrar um comportamento errático e rebelde. No Japão, estes exames têm uma enorme importância e são decisivos, a pressão é muito elevada. Por isso, os pais preocupados pedem ao seu tutor que siga o jovem no seu dia a dia, para perceber o que se passa com ele. O trabalho de detetive irá levar à descoberta de um segredo algo sórdido, um caso entre a mãe do jovem e o seu professor, que não é do agrado nem deste nem da filha do docente.

Day has Dawned: Tecnicamente, uma ressaca. Jovens finalistas de liceu, algo frustrados pela aparente incapacidade de entrar nas universidades por falta de notas,, decidem fazer uma noitada e tentar perder a virgindade. Mas nestas coisas de noitadas, a coisa nem sempre corre bem.

Kidnappers: Um ladrão encontra uma carrinha com as chaves na ignição, com o condutor distraído numa cabine telefónica, e aproveita logo a oportunidade para a roubar. Mas leva mais do que uma carrinha velha. Lá dentro está uma criança, que o condutor tinha raptado. O ladrão, perseguido pelo raptor, decide ajudar a criança a regressar ao seu lar. Uma história de subtil bom humor.

Guests: Uma família muda-se para uma casa nova, um belo achado no mercado imobiliário. Mas a casa tem um pequeno problema. É continuamente assombrada por um número crescente de fantasmas, que a família tenta ignorar até a um momento verdadeiramente explosivo, em que a casa se enche com hordes de fantasmas. Na verdade, a casa em si não está assombrada, apenas está num caminho seguido pelos espíritos, e um amuleto mal colocado convida-os a entrar, em vez de seguirem caminho. Uma história onde o sobrenatural serve de base ao humor.

Waira: No Japão feudal, um nobre senhor da guerra foge para as montanhas, acompanhado de alguns leais seguidores, após ter sido traído em combate. A montanha é assombrada por uma criatura mortífera, que deixa aterrados os seus perseguidores. Uma criatura que se revelará ser um tigre, que o nobre consegue semi-domesticar para, sozinho, enfrentar o exército rebelde, depondo o líder traidor e reconquistando o seu comando. Visualmente, deslumbrante, num uso eficaz do claro-escuro e no retratar dos trajes militares de época.

Picnic: Uma espécie de contraponto a Akira, onde Tokyo foi destruída não por bombas atómicas, mas pela subida dos mares. Na nova cidade, os jovens emigram para o espaço. Dois amigos, na véspera de emigrarem, mergulham nas ruínas da velha cidade, para recordar os tempos de infância.

Beyond the Sun: Mais uma história de humor. Uma velhota num lar não recebe a visita dos seus familiares, mas a enfermeira que a acompanha distrai-se e a maca começa a deslizar por uma estrada abaixo… e continua, atravessando campos e ruas até chegar ao mar. Na praia, está a família que não quis visitar a avó.

Joyful Bell: Um conto de natal. Um jovem que tem ser pai natal como emprego regressa a casa na véspera de natal, e encontra uma criança perdida. Ajuda-a a regressar a casa, mas vê-a desaparecer na escuridão na rua onde diz que vive. E, da escuridão, aparece a sua ex-namorada, com a qual reconstrói o amor.

The Desert Dolphin: A tripulação de um tanque alemão, perdida no deserto norte-africano, percorre as dunas em busca dos seus companheiros. Com a água a esgotar-se, acabam a fugir de uma patrulha inimiga e, sem prestar atenção por onde vão, acabam atolados no mar.

The Adventures of Master Basho: Uma história curta, onde um mestre budista tem dívidas superiores à sua sabedoria, que é a suficiente para se esquivar de as pagar.

Toriko - Prisoner: Um jovem com  problemas comportamentais está sempre em sarilhos com as autoridades de um regime futurista repressivo. Ao ser enviado para um centro de recondicionamento comportamental, rebela-se de vez e tenta chegar ao centro do complexo, para destruir o computador central e ganhar a liberdade. Mas, na verdade, está a viver ilusões dentro de um tanque de privação sensorial, uma realidade virtual que, fazendo-o acreditar que se está a rebelar, reprograma-o para o tipo de comportamento submissivo que as autoridades impõem.

quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

The Promised Neverland


Kaiu Shirai, Posuka Demizu (2019). The Promised Neverland. Lisboa: Devir.


A premissa desta nova série editada pela Devir é deliciosamente macabra. Um grupo de crianças vive num orfanato, mas a sua vida não é de tristeza. São bem alimentadas, brincam a maior parte do tempo, embora tenham aulas e testes muito rigorosos. São felizes entre si, e sentem-se amadas pela governanta da casa, uma jovem sempre sorridente a que chamam mãe. Vivem alegres até saírem da casa, adotados por famílias que os irão acolher. Só que, na verdade, as coisas não são bem assim. Este orfanato tão anti-Dickensiano (é um perfeito inverso de Oliver Twist) é, na verdade, uma quinta que produz bens alimentares de luxo para o palato delicado de uma elite. E as crianças são o produto. São carne criada para o consumo de demónios. Uma ideia deliciosamente macabra, não é? 

Este primeiro volume introduz-nos à casa e à premissa, pelo olhar de três personagens que descobrem o segredo da casa e juram salvar todos os seus companheiros. Na tradição do mangá pop de arrastar a história o máximo possível, os capítulos são uma exploração exaustiva de pormenores, que vão adensando o enredo e construindo o mundo ficcional. O estilo gráfico é o esperado neste género de mangá, com um certo olhar de deslumbramento com a estética europeia fin de siécle. 

terça-feira, 24 de dezembro de 2019

Planetes Omnibus, Volume 1



Makoto Yukimura (2015). Planetes Omnibus, Volume 1. Milwaukie: Dark Horse Manga.

Este livro conseguiu genuinamente fazer-me sorrir. As visões agora algo retro-futuristas da vida em órbita são tão evocativas da estética espacial dos anos 90 que alimentou a minha paixão pela FC. No entanto, o livro é muito mais do que um toque de nostalgia. Recorda-nos que mangá de FC não é necessariamente às voltas com mechas ou combates no espaço. Alias, Planetes partilha com 2001 Nights, essa outra obra prima da FC nipónica, a falta de drama exacerbado. São histórias da vida no espaço, com os dramas pessoais dos personagens a formar a linha narrativa, sem cenários trágicos ou grandiosos por detrás.

Em Planetes seguimos as histórias de um jovem astronauta que ambiciona participar nas primeiras missões de longa distância a Júpiter. Será um desafio enorme para um jovem que chegou ao espaço como elemento de uma equipe especializada na limpeza de lixo espacial, não exatamente o mais glamoroso dos empregos espaciais. A sua determinação levará a conseguir superar os obstáculos, segundo as pisadas de um pai que também sofre da febre do espaço. Há volta, ainda ficamos a conhecer as histórias de outros personagens, como a capitã da nave de reciclagem que deixa a filha na terra para viver em órbita, a sucessora do candidato a astronauta no seu emprego de reciclagem orbital que se apaixona por ele, e o russo que não perde a esperança de, algures no lixo orbital que recolhe, encontrar o corpo da mulher, falecida num acidente com um avião aeroespacial a que ele sobreviveu. Histórias entre o tocante e o humor, mas que por detrás exploram o fascínio com o nosso futuro nas estrelas.

terça-feira, 6 de agosto de 2019

Fragments of Horror


Junji Ito (2015). Fragments of Horror. São Francisco: Viz Media.

História real. Aqui há dias, uma aluna entrou-me na sala a ler um livro de capa preta. Pareceu-me se mangá e, curioso, pedi-lhe que me mostrasse o livro. Pensava que seria Deathnote, pela capa, mas quando vejo o título, percebo que a jovem de treze anos estava a descobrir Uzumaki. E estava a adorar. Felizmente para ela, também sou fã de Junji Ito, e dei-lhe algumas recomendações que seguiu. Ainda mais felizmente para ela, mais nenhum dos seus professores sabe desta leitura, ou se sabe, não conhece o horror japonês, senão eu teria de enfrentar um infindo conselho de turma com professores preocupadíssimos com o estado mental de uma criança que lê coisas horrorosas. Geralmente, no que toca a culturas de género, os professores costumam ser bastante incultos. E costumam entrar em paranóia com códigos culturais que não conhecem. Aqui há dias a aluna entrou-me na aula com Frankenstein (de Ito, não de Shelley), e disse-me que os pais já mandaram vir Tomie. Fiquei orgulhoso. E disse-lhe que, já que é fã de horror, para experimentar algo diferente, um certo H. P. Lovecraft e os seus mythos.


Sequência de histórias escritas depois de uma pausa de Ito no mangá de terror, mostram bem porque é que este é um dos grandes mestres do horror japonês. São histórias onde a banalidade do normal é invadida de forma violenta pelos horrores mais surreais. Sempre de forma aleatória, sem sentido nem lógica, o que é uma das características deste tipo de horror. Esta sensação dupla de normalidade e estranheza é reforçada pelo traço realista e elegante deste mangaka.

Futon: Um homem condena-se ao isolamento, recusando-se a sair de dentro do edredon da sua cama. Vê-se rodeado dos piores horrores, numa alucinação contínua que não é perceptível pela sua companheira. O seu corpo irá acabar por fundir-se com as fibras da peça de roupa.

Wooden Spirit: Um pai e a sua filha, que vivem numa antiga e prestigiada casa de madeira declarada como arquitetura protegida, são visitados por uma estranha mulher. Esta confessa-se uma amante de arquitetura, e oferece-se para tratar da família em troca de algumas noites na casa. Acaba por ficar, e casar com o pai. No entanto, quando se declarou amante de arquitetura, disse-o no sentido literal. A madeira da casa é acordada, e ganhar+a vida em contornos grotescos.

Tomio: Red Turtleneck: Esta história é particularmente sangrenta. Um jovem troca a sua namorada por uma misteriosa vidente. Esta quer mais do que o seu amor, quer a sua cabeça, para a juntar à coleção de cabeças de antigos amantes. Enrola-lhe um fio do cabelo à volta do pescoço, que o corta. O jovem foge, segurando a cabeça sobre o pescoço com as mãos. O sangue tinge-lhe a camisola de vermelho. Pede ajuda à antiga namorada, e são surpreendidos pela vidente, que acabará morta. Mas a sua morte não trará libertação da maldição.

Gentle Goodbye: Uma história tocante. Uma jovem, que tem como pior pesadelo perder o pai, casa com um rapaz de uma família muito tradicionalista. Na sua casa, vai-se cruzando com antepassados cada vez mais idosos, e irá descobrir o estranho segredo da família: quando alguém morre, juntam-se e invocam a sua alma. O resultado não são bem assombrações, são imagens que, com o tempo, se desvanecem e ajudam os vivos a despedir-se daqueles que amam e faleceram. O surpreendente é apercebido quando a própria jovem descobre que ela, também, é um destes espíritos, invocada depois de ter falecido a poucos dias do casamento.

Dissection-Chan: Um grupo de jovens médicos é surpreendido na aula de anatomia, quando um dos cadáveres que iriam dissecar se revela ser o de uma jovem viva que tem uma enorme vontade de ser dissecada. Um desses médicos recorda a sua infância, e recorda-se que conhece essa jovem, da qual foi amigo e cúmplice no seu estranho fascínio pelo ato de dissecar seres vivos. Agora adulta, está obcecada por ser dissecada. Eventualmente, os médicos livram-se dela. Anos depois, com este jovem agora professor envelhecido de medicina, chega-lhe finalmente o cadáver da amiga. E, quando o abrem, encontram uma surpresa de horror no seu interior.

Blackbird: Numa caminhada em zona isolada, um homem é encontrado. Sofreu um acidente que lhe deixou as pernas partidas. Esteve um mês ali caído. Como é que sobreviveu? O segredo envolve uma misteriosa mulher-corvo, que o alimentava com carne e sangue provenientes de uma fonte muito surpreendente.

Magami Nanakuse: Uma jovem aspirante a escritora vive fascinada com o seu ídolo, uma escritora famosa pelas suas obras bizarras, sobre pessoas com tiques estranhos. Convidada a visitá-la, a jovem irá descobrir o tenebroso segredo daquela que idolatra: é um travesti, que aprisiona os fãs que o visitam, levando-os a desenvolver comportamentos estranhos que posteriormente canaliza, quer nos seus livros, quer em pessoa.

Whispering Woman: Uma mulher discreta arranja emprego a tomar conta de uma jovem com uma problemática muito especial. É levada à loucura pela sua incapacidade de tomar qualquer decisão, mesmo as mais simples. A mulher depressa se enquadra, guiando a jovem em todos os pormenores do dia a dia. No entanto, a sua vida pessoal é marcada pela violência. Vive com um homem que a maltrata. Quando aparece morta, misteriosamente a jovem doente não regressa à loucura. Parece ouvir sussurros inaudíveis, que a guiam no seu dia a dia. E para algo mais. Um dia, regressa a casa ensanguentada, tendo seguido as instruções dos sussurros sobre como se vingar do assassino.

domingo, 14 de julho de 2019

URL


Heavy Metal magazine's 1979 H.P. Lovecraft special: Moebius a ilustrar Lovecraft? Esta, e outros docinhos para os fãs dos mythos, neste post do 70s Sci-Fi Art.

Africa’s Lost Kingdoms: O contraste entre a visão tradicional europeia de África com um continente de selvagens, e a realidade dos diversos reinos, civilizações e unidades políticas que existiram até ao colonialismo.

Ai-Da the robot artist's first exhibition has us asking: What even is art?: Um robot de aspeto humanóide que pinta telas? Apesar do meu gosto, e respeito, pelas experiências de criação de arte usando Inteligência Artificial, robots e algoritmos, pela maneira como isto está montado suspeito de gimmick fácil para atrair atenção, com uma base tecnológica elementar. Um bocadinho como o Sophia, que é essencialmente um boneco animatrónico, e os jornalistas clueless que escrevem artigos sobre ela ser um robot inteligente.

How the world fell in love with manga: O autor do artigo revela surpresa pela forma como o mangá se afirmou como media de relevância cultural. Suspeito que não tenha estado atento aos gostos que os mais jovens evidenciam. Há tempos, em conversa com um dos líderes do Rubberchicken, ele observou que o que via nos alunos dele era o predomínio da cultura japonesa alimentada pelos mangá seinen e shonen. E, nos meus, que são bem mais novos, aparece o mesmo padrão. As novas gerações mostram-se influenciadas pelo Japão, em contraste com os fãs mais maduros do continuum pop Marvel/DC dos comics. São movimentos naturais. Recordo-me quando era adolescente, me sentia frustrado por os comics serem menorizados, enquanto o gosto cultural se focalizava na bande dessiné franco-belga, agora praticamente esquecida por cá. Quanto ao mangá, quer sejam fãs irredutíveis de BD ou comics, deixem-se de paroquialismos e partam à descoberta desta forma nipónica de contar histórias, que tem autores e obras absolutamente geniais.

AMBER LUMP HOLDS SURPRISING 100M-YEAR-OLD CREATURE: Do fascínio do passado profundo, preservado no âmbar.

Twenty-one years of using insect resistant (GM) maize in Spain and Portugal: farm-level economic and environmental contributions: Interessante. O uso de plantações genéticamente modificadas na península ibérica teve dois grandes impactos: melhoria dos rendimentos dos agricultores, devido ao aumento da produção, e diminuição do impacto ambiental, porque estas culturas requerem menos pesticidas dos que as tradicionais. Um bom argumento para usar nas eternas discussões com os naturalistas orgânicos, que não se apercebem que a razão pela qual a humanidade se escapou aos ciclos de fome e escassez de alimentos se deve precisamente àquilo que mais atacam, a agricultura industrial e científica. É essa abundância que lhes permite os recursos para poderem alimentar-se de leite de amêndoas e saladas de bulgur temperadas com especiarias orgânicas. Mais intrigante é o desmontar do impacto ambiental negativo das culturas geneticamente modificadas. Faz sentido. Afinal, estas plantas foram modificadas precisamente para serem mais resistentes a pragas e insetos.

Somebody’s Watching You: The Surveillance of Self-Driving Cars: Não é nenhuma novidade. Os meios digitais trouxeram-nos uma sociedade panopticon embebida nas próprias bases técnicas da tecnologia. Os sensores que comunicam entre si e nos permitem a inteligação digital são perfeitos dispositivos de hipervigilância minuciosa. E no futuro dos veículos autónomos e internet das coisas, esta tendência só irá aumentar.

10 Tourist Sights Around The World On Instagram Versus Reality: Um aviso aos turistas incautos que se guiam nas suas visitas pelas glórias visuais das redes sociais. Aquelas imagens de sonho que perseguem? Dificilmente as vão conseguir. Em vez do silêncio idílico da paisagem de sonho, levam com os empurrões dos magotes de turistas que também vieram em busca daquele momento perfeito que viram nas redes sociais. Aqui, falando como alguém que gosta de fotografia, só posso recomendar que não vão atrás da imagem icónica, e se tiverem paciência, muita paciência, conseguem fazer fotos interessantes mesmo nos locais mais entupidos. Há sempre ângulos que evitam as multidões, ou raros momentos em que os espaços se esvaziam.

Why We Write About This Thing Called the Future: Um ponto de vista intrigante. De onde partiu a nossa saudável obsessão com o futuro? Para este articulista, o Iluminismo, com as suas ideias de progresso social e científico, foi o responsável por nos mudar o ponto de vista, nos levar a imaginar e antecipar futuros possíveis.


Chaohuan: Intrigante. Novas palavras para um novo tempo.

One Day, All of This Will Be Embarrassing: É normal. Depois do entusiasmo com as partilhas em redes sociais e oversharing associado, as normas sociais evoluem. As partilhas não restritas começam a ser mal vistas, e isso nota-se logo na atitude dos mais novos face ao que partilham nas redes.


Embraer’s new EmbraerX eVTOL concept is accessible, autonomous and courteous: Mais um conceito que se junta ao de aeronaves pessoais autónomas. Mas, ao contrário da Airbus, Boeing, Lillium e outras, este projeto da Embraer parece mesmo ser um conceito, e ainda nenhuma aeronave tangível.

Turn-of-the-Century Thinkers Weren’t Sure If Women Could Vote and Be Mothers at the Same Time: São-nos absurdos, hoje, artigos como este que, em 1900, defendia que as mulheres não deviam ter direito ao voto porque já estavam demasiado ocupadas com tarefas domésticas e maternidade, e terem se de preocupar com leis e política seria uma sobrecarga para elas. Pessoalmente, não leio estes artigos com um olhar do tipo olhem só o quanto progredimos. Vejo-o por um outro prisma: dentro de cem anos, quais das nossas normas sociais aceites, pressupostos sobre os quais construímos a nossa visão do mundo, se terão tornado absurdos e obsoletos?


Space Robot Roll Call: Por onde é que andamos no sistema solar? Este gráfico mostra as correntes missões de sondas em missões científicas, quer em órbita ou na superfície de planetas, quer a caminho.


Caption Spotlight (12 Jun 2019): Dune Footprints in Hellas: Para arquivo nas categorias o universo é estranho e isto anda tudo ligado. Esta imagem de uma duna marciana captada pelo Mars Reconnaissance Orbiter faz-me lembrar qualquer coisa. Talvez... to boldly go where no martian has ever gone before?

Tehran’s Desert Ghost Towers look like a Zombie Movie Waiting to Happen: Sintomas de futuros em descarralimento. A confluência da pressão demográfica, especulação financeira e urbanística, e condições reais em terrenos isolados em zonas desérticas dá nisto. Cidades enormes, construídas e equipadas para o futuro, mas sem habitantes. Como templos desertos às ilusões da arquitetura.


The Cold War Bunkers of Albania: Já que falamos em ilusões da arquitetura... sob a ditadura de Enver Hoxha, a Albânia tornou-se um estado isolado e paranóico. Obcecado com o risco de invasões dos antigos aliados soviéticos, ou ocidentais, que nunca aconteceram, o ditador transformou a paisagem do país mandando construir milhares de bunkers, linhas de defesa contra invasores que nunca se deram ao trabalho de aparecer. Estes monumentos à inutilidade são hoje ruínas de cimento em desagregação.

The information arms race can’t be won, but we have to keep fighting: Já tínhamos notado. A informação, ou melhor, a desinformação, é a grande arma deste princípio de século XXI. Fake news, apelo a enviesamentos, trolls digitais, bots, tudo vale para otimizar a desinformação usando os canais digitais.

The Surprising Ways Art Has Advanced Astronomy: As relações surpreendentes entre arte e astronomia. Dois campos que nos legam imagens de tirar o fôlego.

quarta-feira, 26 de junho de 2019

Ángulo muerto


Junji Ito, et al (2018). Ángulo muerto: Antología de cómic de terror. Barcelona: ECC Ediciones.

Confesso-me fã do horror japonês. A mistura de temas ocidentais, nas estruturas narrativas de histórias de assombrações, com as mitologias nipónicas resultam em histórias de uma sensibilidade muito diferente às da tradição europeia. Gosto especialmente dos caráteres aleatório e interminável do terror japonês. Não há exorcismos ou redenções, e as maldições acontecem por acaso. Esta antologia reúne nomes que já conheço e sou fã, como Junji Ito e Hideshi Hino. É sempre um prazer rever os seus estilos gráficos e narrativos. Os restantes são-me desconhecidos, e fiquei bem surpreendido com os trabalhos de Yousuke Takahashi, Amagappa Shoujogun ou Kanako Inuki, que vou manter para referência, caso encontre obras ou antologias suas.

Blancanieves: Cabe a Junji Ito arrancar esta antologia, com uma história levemente inspirada no clássico tradicional. Quão levemente? Ito transforma a rapariga na filha da madrasta, e substitui os anões por espíritos que assombram as masmorras onde a mãe encerrou a jovem. Sendo um conto de horror, a cegueira por se manter a mulher mais bela de acordo com as palavras de um espelho leva a mãe a matar a filha várias vezes, com ajuda do marido. Um tipo de conto curto clássico de Ito, com a sua habitual elegância gráfica a tornar mais leve o seu forte caráter mórbido.

Un Cuento que Finaliza en el Prólogo: Fique surpreendido pelo estilo gráfico de Yousuke Takahashi, num registo mais expressivo do que o habitual rigor estilístico do mangá. A história tem um forte sentido de humor. Um jovem recebe de uma rapariga o dom de ver espíritos, antes desta morrer. Ela quer que ele siga os seus passos, continue a sua missão, mas o rapaz não está nada para aí virado.

Medicina Espiritual: Talvez o que me tenha impressionado menos pelo seu grafismo, por vezes expressionista, por vezes surreal, mas essencialmente grotesco, no mau sentido. A história de Kanako Inuki também é bastante banal. Um médico num consultório vai atendendo pacientes muito bizarros, até a última lhe revelar que está morto, recusa-se a aceitar a sua condição de fantasma e está a atrair as restantes assombrações do cemitério.

El Ratón de Biblioteca: Esta história de Amagappa Shoujogun é uma excelente surpresa. Graficamente muito bem conseguida, num traço clássico e rigoroso. A narrativa leva-nos a uma biblioteca assombrada por um espírito que só se deixa entrever através das estantes, e ao qual nunca se conseguiu ver o rosto. A curiosidade romântica de uma jovem bibliotecária leva-a a conceber uma artimanha para, finalmente, o ver de frente, mas o que descobrirá é horrendo e terá consequências esventradoras.

Una Leyenda del Circo: De Hideshi Hino esperamos o grotesco, e não desilude. A história é grand guignol, com um circo de freaks que oculta demónios, e a separação de duas monstruosidades ligadas entre si. Para além da bizarria narrativa, vale pelo traço grotesco e vincado em contrastes absolutos do preto e branco deste mangaká.

Un Libro de Ilustraciones Repulsivas: A história de Michiru Noroi é um tipo de narrativa bastante convencional, sobre um objeto assombrado que desperta naqueles que o tocam pesadelos, e os levam à loucura e a destinos sangrentos. O traço tem alguns deliciosos momentos de grotesco.

Mujeres en la Oscuridad: Kanako Inuki encontra o horror nas vidas das donas de casa desocupadas, em três pequenas histórias de isolamento. Na primeira, uma mulher que suspeita que o marido a trai alimenta-o com sanguessugas. Na segunda, a curiosidade em espreitar o lixo dos vizinhos leva a uma descoberta macabra. Para finalizar, uma mulher solitária recebe chamadas da vizinha que mora no apartamento ao lado do seu, até descobrir que esta se havia suicidado poucos dias antes de se ter mudado.

El Pájaro Enjaulado: Esta história de Not Osada roça o incompreensível. Não se percebe se envolve bruxarias ou mulheres que julgam que vão crescer asas nos seus ombros. Visualmente, é interessante.

He Empezado El Tejón: Sonhos, infidelidades e pesadelos cruzam-se nesta história de Yousuke Takahashi, onde um homem enfadado com a vida que leva se cruza com uma súcubo.

quarta-feira, 29 de maio de 2019

Semillas de Ansiedad


Masaaki Nakayama (2009). Semillas de Ansiedad, Vol. 1. Barcelona: ECC Ediciones.

Estas Sementes de Ansiedade são um livro curioso. O grande tema é o horror, mas não aquele violento, forte ou escatológico. Não há aqui grandes narrativas de personagens assombradas ou monstros tenebrosos. As histórias são curtíssimas, duas a quatro pranchas e já está. E não são especialmente assustadoras, antes, tocam na inquietação com o banal.

Sabem, aqueles arrepios súbitos sem justificação? A estranha sensação quando acordamos no silêncio da noite com a intuição que algo não está bem? Ou passar por uma rua deserta, com a sensação de se ser observado. O pensamento que estamos a olhar para algo que mais ninguém vê. O arrepio quando estamos num edifício vazio. Sabemos que está tudo bem, que impera a normalidade, mas há algo dentro de nós, profundamente arreigado na nossa alma, que nos faz sentir que talvez não seja bem assim.

É esse o foco do horror neste mangá. Nakayama olhar para os temores fugazes, cruza com lendas urbanas, e uns polvilhos do rico mundo sobrenatural japonês. As histórias são curtas porque os temores são fugazes, centram-se precisamente naquelas emoções momentâneas que nos arrepiam. A nível gráfico, o traço não se afasta do estilo normal no mangá. O único cunho distintivo desta série é o ponto de vista pouco habitual do autor.