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quinta-feira, 15 de agosto de 2024

Os Crimes do Bandido Lampeão

Floriano Sergipe, Victor Machado (1931). Os Crimes do Bandido Lampeão. Lisboa: Henrique Torres

Não consegui descobrir muito sobre estes livros, editados por Henrique Torres em 1931. Econtrei-os na Livraria Suméria em Leiria, onde se pode encontrar boa parte da coleção. Adaptam os textos de Floriano Sergipe e são um ponto algo discreto, apesar dos seus quinze volumes, na literatura de aventuras que explora os mitos de Lampião e dos cangaceiros, transformando o sertão brasileiro numa espécie de western lusófono. Encontrei aqui, Os pioneiros da literatura cangaceira, algumas informações sobre o género, claramente pulpy, e os seus praticantes, mas com escassa informação sobre a edição portuguesa. O autor brasileiro nem sequer é referenciado em mais lado nenhum.

Isto é claramente literatura escapista, de entretenimento, empolgando os leitores com a invocação do distante Brasil. O ritmo de escrita é rápido e cheio de peripécias, com capítulos curtos que terminam sempre em suspense. No primeiro volume, descobrimos a origem do anti-herói, que começa por ser um honesto fazendeiro despeitado por uma mulher que se aproveita dele e o troca por outro amante. Semi arruinado, de coração partido, decide transformar-se num criminoso para exercer uma vingança mortífera sobre a mulher volúvel e os seus restantes amantes.

Ao mesmo tempo que abandona as suas propriedades e se assume como chefe de um grupo de cangaceiros e espalha o terror nos seus inimigos, o fazendeiro regressa à cidade, assumindo também o papel de um primo distante que vem viver com a tia e se apaixona pela prima, procurando negócios que o levem a recuperar as riquezas perdidas. Mas esta prima cai debaixo do olhar lúbrico de um comendador, que organiza o seu rapto para satisfazer os seus desejos. Termina aqui o primeiro volume.

No segundo volume, as aventuras do bandido seguem um cariz mais violento, com a perseguição que lhe é movida pelas autoridades, terminando num confronto com os soldados comandados por um tenente que lhe dá caça. Entretanto, o destino da prima raptada parece ser o encontrar uma nova paixão nos braços de um filho de boas famílias que a salva durante a fuga na selva. E, para compor as aventuras, a coesão dos caboclos que seguem o bandoleiro parece estar ameaçada por suspeitas de traição.

Há mais livros nesta série, são quinze no total, mas creio que chegam estes dois para sentir o pulso ao caráter desta literatura de aventuras escapista, que invoca as visões do sertão e da selva brasileira junto com as aventuras dos fora-da-lei. São o que são, histórias encadeadas sem fim, para entreter o leitor, e certamente longe da realidade violenta dos cangaceiros.

quinta-feira, 4 de abril de 2024

Ace of the White Death


Robert Hogan (1970). Ace of the White Death. Berkley Medallion Books.

Uma leitura divertida, que transporta para as aventuras pulp de outras eras. No caso, para todo um género muito palpitante mas hoje esquecido por completo, as aventuras dos ases da I guerra. Não são aventuras particularmente verosímeis, e a série G-8 distiguiu-se pelos trilhos do fantástico onde se meteu, com as ameaças combatidas pelos destemidos pilotos dos biplanos aliados a serem muito surreais (pensem mortos-vivos no ar, ou coisas ainda mais insanas). Nesta aventura, a história é mais comedida. O intrépido G-8 terá de travar uma perigosa ameaça de guerra química que se oculta sob minas na Béligca ocupada pelo invasor alemáo, vivendo inúmeras peripécias que incluem prisão e um quase fuzilamento ao dealbar do dia, muitos combates no ar e tremendos volte-faces de sorte. Apesar dos quase cem anos desta prosa pulp, a história mantém-se acessível e divertida. Uma leitura curiosa, originalmente publicada nos anos 30 do século XX, para quem quiser mergulhar um pouco mais na tradição pulp.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Tempestade de Neve


Henry Dalton, Philip Gray (1958). Aventuras de Anton Ogareff #4 Tempestade de Neve. Lisboa: Livraria Civilização.

Tenho uma certa queda por ir descobrir personagens heróicos do passado, hoje esquecidos. Faz parte do gosto pela evolução da ficção pulp. Encontrei este Ogaraff num alfarrabista, e arrisquei a leitura. O formato é episódico, e a história só faz realmente sentido se se ler todos os volumes (bem, posso apreciar ficção pop pulp do passado, mas com conta, peso e medida, não exageremos...). Estamos na Rússia do século XIX, e Ogareff é o inesperado líder de um bando de rebeldes, vistos como criminosos por se revoltarem contra a ordem legal. Mas a sua revolta assenta no pressuposto de acabar com os servos, alfabetizar o povo, e modernizar o país, ou seja, depressa percebemos que os vilões são os aristocratas, dententores de vastos territórios cujas riquezas exploram, e a condição de bandoleiro atribuída a Ogareff vem precisamente da ameaça que a emancipação do povo traria aos rendimentos dos aristocratas.

Apesar da promessa de aventuras, este romance é essencialmente de intriga palaciana, o personagem principal faz aparições fugazes. Seguimos a aventura de Sergio, um nobre progressista que simpatiza com a causa modernizadora. Os seus pais foram mortos pela ação predatória dos vizinhos, que lhes cobiçam as terras. Sergio procura a compreensão de outros nobres, amigos de família de longa data, mas acaba por aperceber-se que a condição de nobreza é apenas um verniz para justificar a sanha de poder e dinheiro. Os seus supostos amigos depressa o traem, até porque ao fazê-lo, vêem uma oportunidade de se apropriarem das terras que herdou. Será quase morto pela veleidade de confiar nas antigas relações, mas num volte-face final, será salvo por Ogareff.

Há intrigas, imensas cenas de salão aristocrático, promessas de amor, e essencialmente um embate entre o idealismo dos revoltosos e o calculismo da classe dominante, para a qual o desejo de enriquecer se sobrepõe a tudo. O romance não é nada de especial, mas esta visão sobre a sociedade numa série de aventuras escapistas surpreende um pouco. Tendo em conta que o progressismo patente nas aventuras de Ogareff se aproxima dos ideais socialistas, fica-se com a sensação que editar por cá os feitos deste aventureiro nos tempos do fascismo teve o seu quê de subversivo.

terça-feira, 4 de outubro de 2022

Tarzan e a Cidade de Ouro


Edgar Rice Burroughs (1973). Tarzan e a Cidade de Ouro. Lisboa: Portugal Press.

Confesso, era uma lacuna, mas nunca tinha lido uma aventura de Tarzan no original, escrita por E. R. Burroughs. Foi uma boa surpresa, um mergulho na pulp fiction de aventuras dos inícios do século XX, quando África era o palco do sonho da aventura pura, com as suas selvas, perigosos animais, exóticas tribos e misteriosas civilizações ocultas no vasto continente. É, também, um olhar sobre esta forma narrativa, sobre a capacidade de um autor há muito desaparecido em escrever de formas que, ainda hoje, são empolgantes e agarram o leitor até ao final do romance. Originalmente publicado em 1933, Tarzan e a Cidade de Ouro é literatura pop, escapista, é certo, mas está muito bem feita.

Nesta aventura, o circunspecto Tarzan vageia pelos desertos da Abissínia, esquivando-se a bandoleiros. Ao salvar uma vítima de um destes grupos, Tarzan acaba por descobrir duas cidades perdidas no meio das montanhas, eternas rivais. Uma é riquíssima, graças a um veio de ouro que permite aos seus habitantes viverem em faustosas arquiteturas douradas. É essa a cidade que Tarzan irá explorar, entrando nela um pouco por acaso, sendo feito prisioneiro. Uma condição que depressa perde, ao mostrar-se inflexível perante a bela rainha da cidade, uma mulher enlouquecida pela sua condição de poderio, cruel, infeliz, e em eterna luta contra as intrigas palacianas. Claro está que o herói irá ver-se envolvido nestas intrigas, enfrentando perigos e desafios cada vez mais violentos.

Esta história toca em todos os pontos deste género de literatura. Temos o superior homem branco, simbiose entre a civilização ocidental e a sabedoria da selva (a descrição física inicial de Tarzan roça o homoerótico). Temos os perigosos bandoleiros árabes. Cidades esquecidas e civilizações misteriosas. Nobres sem escrúpulos que fazem tudo para chegar ao topo do poder. Sacrifícios humanos e rituais violentos. Portentosos leões que terão de ser enfrentados. E, claro, uma sensual femme fatale, que irá tentar o herói. É marca de época, pulp clássico no seu melhor.

terça-feira, 20 de setembro de 2022

O Escorpião de Ouro


Sax Rohmer (1933). O Escorpião de Ouro. Porto Alegre: Livraria do Globo.

Sax Rohmer era especialista nos romances sobre o perigo amarelo, onde obscuras organizações secretas vindas da China conspiram para dominar o mundo. Sempre coordenadas por sombrios génios do crime, misteriosos e implacáveis super-criminosos orientais capazes de manipular o sub-mundo londrino para destruir a Inglaterra e controlar o planeta. Legou-nos Fu-Manchu, talvez o seu mais icónico vilão.

Fu-Manchu não entra nesta aventura, mas o perigo amarelo continua o mesmo. Um pacato médico inglês vê-se envolvido numa conspiração mundial, que levou à morte destacados cientistas e estrategos militares. Os indícios dos assassinatos apontam para a influência da misteriosa ordem do escorpião dourado, encabeçada por um temível mandarim que se oculta sob  uma máscara verde. O pacato médico descobre-se num turbilhão de luta contra o crime, ajudando um circunspecto inspetor da Scotland Yard e um irreverente detetive francês a desvendar o mistério e a travar a conspiração. Terá de enfrentar o temível chinês, e acabará por encontrar o amor numa jovem de ascendência oriental, agente forçada da terrível organização.

Rohmer tinha o seu nicho, que explorava bem, com romances frenéticos que hoje nos parecem muito datados. Em parte, porque a nossa sensibilidade evoluiu, e imagens invocadoras do terrível perigo civilizacional trazido pelos homens amarelos são obviamente racistas. O romance em si é puro policial pulp, cheio de peripécias que no final se resolvem pelo melhor. Datado, mas merece ser lido como referência de literatura fantástica de época.

terça-feira, 28 de junho de 2022

O Mistério da Rua Saraiva de Carvalho


Reinaldo Ferreira (2017). O Mistério da Rua Saraiva de Carvalho. Lisboa: Pim! Edições.

Quando, numa noite escura, um vizinho com insónias espreita pela janela e vê uns vultos a arrastar um fardo que se parece suspeitosamente com um corpo nas imediações de um prédio na Rua Saraiva de Carvalho, isso é o despoletar de um mistério que se revelará ter proporções rocambolescas. O estranho acontecimento é apenas a ponta de uma complexa conspiração criminosa, que se revelará ser uma temível organização de espionagem. Um grupo de criminosos liderado por um português renegado que procura enviar para a Alemanha os segredos militares portugueses, vitais nos tempos da I guerra, e que para os obter recorre aos mais mirabolantes estratagemas. O grupo de facínoras será travado pelo incansável Gil Góis, um detetive amador que, intrigado pelo mistério da Rua, arregaça as mangas, investiga, enfrenta os maiores perigos, encontra o amor, e salva as vítimas da temível conspiração.

Não resisto a uma piada histórica: seriam realmente importantes os segredos militares portugueses para o império alemão em 1917, dado o conhecido estado lastimoso do CEP, enviado por uma jovem república que se queria legitimar mas não tinha os meios para o fazer?

Reynaldo Ferreira, repórter de grandes parangonas e verdades duvidosas, foi aquele que talvez entre nós se possa apelidar de verdadeiro escritor pulp. Os seus romances são a metro, com enredos convolutos e cheios de peripécias, mas que se percebe serem escritos sem uma grande visão de conjunto. Interessava encher páginas de jornais e manter o interesse dos leitores, e isso conseguia-se com peripécias constantes e inesperadas. 

Um ponto de interesse deste romance, originalmente publicado como folhetim em 1917, é começar por ser uma espécie de colagem epistolar, feita de vários pontos de vista. A história começa como um conjunto de cartas publicadas regularmente no jornal O Século, onde vários escribas dão o seu ponto de vista sob o misterioso crime, que poderá até nem ser crime e ter uma explicação banal. Umas começam a tornar-se mais prevalentes, escritas pelo tal Gil Góis, que vai narrando carta a carta as suas aventuras. Algo que acontece, suspeito, porque o ter textos muito diferentes torna a sequência demasiado confusa, e Reinaldo Ferreira não era assim tão bom escritor, experimenta a lógica fragmentada mas depressa condensa na narrativa tradicional. Embora, nunca perca o efeito suspense de cortar os textos a meio e encerrar com frases do tipo "não conseguimos publicar toda a carta por ser longa, mas continuamos na próxima edição". Tudo marcas de escrita a metro, e muito eficaz a manter a atenção. Cem anos depois, apesar do artifício ser óbvio, não deixa de nos arrastar.

Intriga uma certa visão de modernidade. A imagem que Reinaldo Ferreira coloca nas suas aventuras é a de um Portugal moderno, cosmopolita, onde as perseguições se fazem de carro e os personagens viajam habitualmente entre a Europa, vivendo aventuras  cosmopolitas, onde o país era palco de conspirações internacionais. É uma visão de escapismo modernista, uma fuga imaginária às realidades de um país pobre e atrasado. No fundo, o eterno sonho das nossas elites intelectuais, aqui utilizado para ficção popular escapista.

quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Eu, Ross Pynn


Frank Gold (1985). Eu, Ross Pynn. Odivelas: Europress.

Uma homenagem àquele que talvez tenha sido o melhor, entre prolífico e intrigante, escritor de literatura popular policial e de westerns, feita por um dos seus colegas. Se por cá nunca houve literatura pulp no sentido clássico do termo, com revistas dedicadas, houve outras formas de entretenimento literário, o folhetim ou os romances serializados em jornais. E, claro, o livro de bolso, especialmente focado nos géneros que despertavam o imaginário da população portuguesa, o policial e as histórias do velho oeste. Hoje algo praticamente esquecido, exceto talvez no policial, a única literatura pop tolerada pelo nosso mainstream conservador, o pequeno prazer culposo aceitável entre doses das leituras consideradas boas e pertinentes.

Não é de atrever dizer que tivemos por cá grandes escritores destes géneros, eram essencialmente jornalistas que ganhavam uns trocos a imitar o pulp policial e western que também se editava por cá. Geralmente, assinavam os livros com nomes de um sonante anglófono, sublinhando que os esforços eram comerciais e pseudónimos estrangeirados sempre eram melhor publicidade, ligando-os aos autores americanos e ingleses que imitavam. Ross Pynn, ou melhor, Roussado Pinto num dos seus pseudónimos, foi um dos mais interessantes praticantes desta literatura a metro, com uma curiosa capacidade para decalcar os modelos policial noir e velho oeste em histórias que ainda hoje merecem ser lidas, são um primor de purple prose, iconografias bem batidas e esterótipos literários.

Eu, Ross Pynn mergulha-nos numa tortuosa, nem sempre muito lógica, história de vícios, crime e degradação moral. O próprio Pynn é o personagem principal, assumindo o manto estereotipado de investigador duro e sempre na corda bamba financeira. Cruzar-se-á com mulheres sensuais e fatais, com o mundo obscuro dos vícios dos muitos ricos, com conspirações que usam a sexualidade para garantir a riqueza de pessoas desesperadas. Há um pouco de tudo nesta história despoletada quando um rico comendador contacta o investigador para descobrir o paradeiro da mulher que ama, aparentemente desaparecida.

Frank Gold, outro dos nomes do policial à portuguesa, pseudónimo de Luís Campos, constrói um livro de homenagem, em que interpreta a prosa púrpura de Pynn e a leva a novas profundidades (as descrições de emoções sensuais são um mimo de prosa púrpura), cruzando a sua linha narrativa com excertos de textos de Pynn. É tudo muito cheio de vício, duro, hardboiled, decadente. A história pode não fazer muito sentido, percebe-se também o estilo do encher páginas e criar acidentes sucessivos para esticar o romance. Ou seja, o estilo típico da prosa comercial para livros baratos, de entretenimento despertador de sensações nos leitores. Um estilo que, tanto quanto sei, se perdeu por completo, cá.

quinta-feira, 8 de outubro de 2020

The Living Shadow

Maxwell Grant (1971). The Living Shadow. Pyramid Books.

Quando o jovem Harry Vincent, desiludido de amores e da vida na grande cidade de Nova Iorque, está quase a atirar-se de uma ponte para meter um ponto final a tudo, é salvo no último momento por um homem que lhe propõe um emprego. Uma figura misteriosa e sombria, que pede a Vincent que execute diversas missões de vigilância. E é assim que o jovem desencantado com a vida na grande cidade se torna um dos ajudantes de The Shadow, o elusivo e implacável combatente do crime. 

Nesta primeira aventura daquele que é um clássico das personagens pulp, o crime envolve o roubo fraudulento de jóias e uma rede de criminosos e receptadores no bairro chinês de Nova Iorque. Seguimos os passos de Vincent, à medida que se vai adensando na trama. Cruza-se com criminosos violentos, e nas suas missões parece estar sempre um elemento de predição, com algum elemento previsto pelo Sombra.

O livro é notável pela ausência da sua principal personagem. Seguimos Vincent, um dos colaboradores da rede de combatentes do crime que auxilia O Sombra, mas raramente nos é dado mais do que vislumbres do grande personagem pulp.  Sublinha que vive nas sombras, conhecedor da escuridão que se oculta no coração dos homens. Esta reedição de 1971 faz regressar a primeira aventura escrita por Maxwell Grant, o pseudónimo dos escritores da série The Shadow, originalmente criada para a rádio, mas com tanto sucesso que depressa chegou ao mercado dos pulps.. Esta primeira aventura literária foi escrita por Walter Gibson.

quarta-feira, 15 de maio de 2019

Revividos


Ralph Barby (2011). Revividos. Santa Úrsula: 23 Escalones.

Tudo começa num jantar elegante, num palacete de Viena. Um grupo elegante, mas cheio de tensões interiores, como não podia deixar de ser numa história destas. Casais desavindos, mulheres atraentes, e um homem honrado que se tornará o inevitável herói. Um passeio de avião que se torna um pesadelo, quando são forçados a aterrar num descampado. E aí, o horror começa. As personagens dão por si num local fora do tempo, onde mãos cadavéricas saem de areais e decapitam os homens. Uma bruxa sensual faz a sua aparição, revelando um genocídio esquecido e um deus sanguinário que exige cabeças para fazer regressar os seus seguidores à vida. Ou então, tudo não passa de uma alucinação, induzida pela hipnose de uma governanta louca, perdida em mitos esquecidos.

Não resisti a este livro quando o vi numa visita à Gigamesh. Isto é horror pulp espanhol clássico. Não é especialmente complexo, nem é esse o objetivo. Este livro serve para chocar e intrigar o leitor, numa leitura que se quer rápida e divertida. Isso nota-se na forma como está estruturado, em capítulos curtos que acabam sempre com revelações que deixam o leitor em suspense, e curioso por saber como continua a história. Este é um tipo de literatura de terror clássica pouco sofisticada, assumidamente pulp e a metro, para livros de bolso descartáveis. O formato desta reedição que replica o original parece-me similar ao das nossas coleções clássicas Vampiro e Argonauta. Revividos foi publicado originalmente em 1973, escrito por Ralph Barby, pseudónimo do escritor Rafael Barbarán Rodriguez.

terça-feira, 29 de maio de 2018

Mundo Sem Estrelas


Poul Anderson (1967). Mundo Sem Estrelas. Lisboa: Editorial Panorama.

A tripulação de uma nave de transporte comercial que segue em direcção a uma civilização recém-descoberta no espaço intergaláctico despenha-se num planeta desconhecido, não identificado na sua rota. As hipóteses de salvação são mínimas, é preciso reconstruir um dos salva-vidas para que um dos tripulantes siga até ao planeta de destino e monte uma missão de salvação. Tempo não é problema, os humanos deste futuro são praticamente imortais graças ao progresso da medicina, mas os tripulantes precisam de mão de obra para os ajudar a reparar a nave.

O contato com os indígenas do planeta é inevitável. Seres bípedes inteligentes de aspeto vagamente marsupial, estão divididos em duas grandes facções. Uma, mais selvagem, de tribos livres no hinterland planetário, e outra, com uma civilização de construtores navais que domina as zonas costeiras. Há uma outra espécie inteligente no planeta, anfíbios descritos com aspeto similar a golfinhos com poderes telepáticos, fundadores de uma civilização milenar que fez evoluir por indução mental a outra espécie inteligente do planeta, utilizando-os como os utensílios que a sua morfologia não permite usar. São deuses para os civilizados, e demónios para os selvagens. Esta civilização é estática, teme a mudança, e decide manter cativos os tripulantes da nave acidentada. Estes percebem que a sua única opção é acicatar uma guerra civil que mantenha os seres dominados por telepatas à distância. Tudo isto num planeta de um sistema solar no espaço intergaláctico, sob um céu onde raras estrelas se vêem.

O que segura este livro é a história de Valland, um vagabundo do espaço que se contenta em vaguear pelos sistemas trabalhando a bordo das naves comerciais. Tudo o que quer é regressar ao planeta Terra de vez em quando, ostensivamente para visitar a sua esposa, à qual é tremendamente fiel num futuro onde a fluidez de relações é a norma. Um imortal antiquado, mantém bem vivas as memórias do passado terrestre antes da imortalidade e expansão espacial, com forte pendor para cantar velhas canções do século XX. A sua personalidade gregária e sentido histórico serão o elemento que serve de fio condutor a esta história.

Mundo Sem Estrelas é uma típica obra de aventuras pulp, vinda dos tempos em que a FC se podia permitir voos especulativos imaginários sem grande preocupação de fiabilidade científica. Abundam planetas habitados, todos com atmosfera compatível com os humanos, cheios de vida nativa inteligente, a humanidade tornou-se imortal graças a um soro, e deixa de temer as vastidões do espaço-tempo intergaláctico. Uma leitura divertida para quem conhece o estilo da FC clássica.

quinta-feira, 25 de junho de 2015

"So-Long" Jim Matou


Ross Pynn (1969). "So-Long" Jim Matou. Lisboa: Galeria Panorama.

Isto daria um excelente mau filme, pensei enquanto lia este clássico do western pulp português. Um sangrento b-movie ou western spaghetti, que hoje não passaria no crivo do politicamente correcto, por muito bom que fosse o possível realizador a passar uma mensagem de ironia. Este livro é, de facto, pulp violento, machista, misógino e xenófobo onde as tropes do género são esticadas ao absurdo.

Acompanhamos So Long, o cowboy clássico de Pynn, numa amarga aventura cheia de mortes e crimes violentos. A sua passagem num campo mineiro granjeia-lhe a morte violenta de uma mulher que o ama, uma vingança inabalável, uma curiosa paixão, o assistir a um assalto bem sucedido e a um violento confronto com uma tribo índia cujas descrições de selvajaria e brutalidade deixarão qualquer leitor de hoje espantado pela visão xenófoba. Mas percebe-se que Pynn apenas estava a responder aos gostos do público da época com um romance que titilava os leitores com as descrições de duelos, lutas, violência sexual, combates entre cowboys e índios, que termina num apocalíptico duelo onde So Long decepa metodicamente o portentoso chefe índio num duelo corpo a corpo de tomahawks.

Isto é pulp clássico, que não pretende ser mais do que é. É intrigante como esta escrita a metro, cheia de pérolas da má literatura que fazem revirar os olhos, mas mantendo sempre um ritmo alucinante, quase cinematográfico.