terça-feira, 7 de abril de 2020
Waste Tide
Chen Qiufan (2019). Waste Tide. Nova Iorque: TOR.
Um misto curioso de cli-fi com cyberpunk, vindo da pujante FC chinesa. Os habitantes de uma ilha periférica, cuja economia depende da reciclagem de desperdício tecnológico, estão numa encruzilhada. O misto de interesses políticos e senhores quasi-feudais locais que os dominam está a ser abalado pela proposta de um forte investimento de uma empresa americana, que pretende transformar a perigosa reciclagem artesanal numa indústria segura e modernizada. No entanto, os interesses da empresa não são benignos. No meio disto, um jovem tradutor sino-americano, originário da ilha, apaixona-se por uma rapariga da classe mais baixa dos seus habitantes. Esta, ao ser oferecida em sacrifício num ritual supersticioso para salvar o filho de um dos senhores locais, acaba por despoletar estranhos acontecimentos. A sua consciência parece mesclar-se com os sistemas digitais de um robot, e com isso gerar uma inteligência artificial consciente. Tudo está relacionado com a empresa americana, fachada de um grupo que, nas sombras, procura usar a discrição de uma zona de fronteira para investigar os efeitos a longo prazo de tecnologias de controlo mental, originalmente criada por uma cientista exilada, também originária da ilha. Tecnologias essas que têm como efeito secundário o possibilitar o mesclar da consciência humana com sistemas computacionais.
Há muita coisa em jogo neste nem sempre interessante romance. Qiufan invoca conceitos interessantes, mas nem sempre os consegue levar dentro de uma história cuja estrutura nem sempre aguenta com a sua complexidade. O toque cli-fi, com a linha narrativa dos habitantes condenados ao trabalho sujo da reciclagem de desperdício eletrónico, nem sempre se conjuga com o lado cyberpunk do enredo sobre mesclas de consciência humana e digital. Toda a história sobre intrigas políticas e económicas ocupa mais espaço do que devia, e a parte sobre tecnologias secretas, que cola todo o romance, acaba por ser deixada muito no ar. Não sendo um livro excelente, é no entanto um sinal de maturidade da FC chinesa.