quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Antígona


Sófocles (2012). Antígona. Lisboa: Fundação Gulbenkian.

Estes textos são realmente intemporais. Milénios passados sobre a sua escrita e representação, com os tempos e as sociedades a mudar e a modificar-se, as emoções originais continuam vivas. Podemos não adorar os deuses ou respeitar os normativos sociais da época, mas como não nos comovermos com o destino trágico de Antígona, uma mulher que se atreve a desafiar os poderosos, ao colocar o sentimento de dever e amor familiar acima da obediência? E, no fundo, de profundo humanismo, quaisquer que tenham sido os crimes de uma pessoa em vida, não merece que o seu cadáver seja abandonado aos cães. Antígona pagará com a vida o querer respeitar o corpo do seu irmão caído em desgraça, e sua morte coloca um fim na enorme maldição edipiana, esse exemplo de como infelizes acasos conduzem à tragédia e opróbio. 

Também lamentamos a personagem de Creonte. Numa leitura superficial, é o vilão da história, o regente inflexível que procura a justiça exercendo injustiças. Mas talvez não seja isto, talvez seja o exemplo de um líder cheio de incertezas, que coloca no dogmatismo das posições absolutas a forma de ser respeitado, mas também de garantir que todos serão tratados com justiça. E compreenderá que a sua inflexibilidade, o colocar a norma acima dos pedidos e necessidades daqueles que rege, tem consequências fatais, e irá também destruir a sua própria família. 

Este texto milenar não se esgota em simples interpretações de blog, mantém-se no pensamento. E recorda-se sempre do coro em fundo, uma voz de consciência que guia, questiona e atormenta aqueles cujas vidas formam o enredo e a lógica destas tragédias.