Ignácio Brandão (2011). Não Verás País Nenhum. Lisboa: Ulisseia.
Se falamos de uma distopia brasileira, vem logo à mente a história de um país de desigualdades acentuadas e políticos de qualidade atroz. Mas não é desse tipo de distopia a deste livro, que se insere na vertente mais clásica de olhar para um mundo em desagregaçáo, decaído, em que as condições de vida se agravam continuamente.
Num futuro próximo, os brasileiros aglomeram-se em grandes cidades estratificadas, vivendo sob vigilância num mundo regrado onde tudo o que fazem é determinado pelas autoridades. Estes, são os sortudos, porque há uma enorme massa quase sub-humana que se concentra nos arrabaldes. Num mundo ambientalmente devastado, em que o Amazonas se tornou um quase deserto, os poucos terrenos férteis foram ocupados por potências europeias, a vida resume-se aos apartamentos, à comida artificial, a trabalhos de pouco sentido e às ruas cheias de gente resignada a uma vida progressivamente decandente.
Acompanhamos a descida aos infernos - porque há sempre infernos mais profundos, de um pacato ex-professor universitário, que vive uma vida anónima com a sua mulher, lamentando a perda de um passado de esperanças, resignado a uma vida sem futuro. Acabará por ser ver envolvido nas convulsões sociais que erodem uma sociedade à beira da derrocada, perdendo tudo, até mesmo a sua dignidade. No final do livro, só lhe resta esperar a morte, amontoado numa enorme massa humana que se protege de um sol mortifero, enquanto aprende que o calor extremo é uma mera sensação psicológica.
Romance pesado e implacável, este clássico da literatura fantástica brasileira mergulha-nos numa distopia tropicalista, onde exotismos são deixados de lado, e somos mergulhados numa modernidade decrépita, a esboroar-se sob tensões ambientais, económicas e sociais.