quarta-feira, 1 de setembro de 2021

Orvalho do Oriente


 Altino do Tojal (1981). Orvalho do Oriente. Lisboa: Sá da Costa.

Um olhar inocente sobre a mitificação do oriente, sob a forma de uma história infantil. Orvalho do Oriente sublima a visão ocidental da vida oriental, através da visão infantil. Acompanhamos as aventuras de Pi, um menino dos juncos, pobre mas feliz, que vive uma vida solta entre os barcos e as ruas de Macau. É sobre ele a primeira história, sobre a sua vida nos barcos, e o seu grilo de combate, um inseto que apesar de não parecer dos mais fortes, demonstrou ser sempre resistente e invencível, mesmo perante adversários mais fortes. Tão imbatível é que atrai a inveja do dono do mais forte grilo de combate macaense, um rapaz da terra, filho de um burguês, daqueles que ao contrário de Pi, usa sapatos. Parte o desafio, a luta será denodada, e apesar da inferioridade, será o grilo de Pi a vencer. Mas todos perdem,  nenhum dos insetos sobreviverá. 

Pi tem um amor, uma rapariguinha da terra chamada Orvalhinho. É sobre eles a segunda história, uma tarde em que o rapaz leva a rapariga a passear nas ruas de Macau. Descobrimos o seu amigo pintor, que só pinta a mesma paisagem, mas Pi convence-o a pintar uma cena em que este, segurando um papagaio e montado num búfalo que puxa um riquexó onde vai Orvalhinho, leva a rapariga a cumprir o seu grande sonho: ir ter com o pai, que vive no grande e misterioso ocidente. Segue daí o terceiro conto, um sonho em que a pequena, acompanhada por Pi, atravessam as muralhas da China e enfrentam dragões, e pérfido deus menor chinês, para tentar que Orvalhinho abrace o seu pai no ocidente. 

Contos simples, encadeados, uma visão romântica e ingénua do oriente. Mas também uma curiosa inversão, para as crianças do livro, o mistério e promessa distante de exotismo é o nosso ocidente, uma terra longínqua da qual ouviam falar (afinal, à altura destes contos, Macau era colónia portuguesa), mas pouco conheciam. Esta inversão mostra a metáfora do livro, o sublimar das visões ocidentais sobre o oriente, das visões portuguesas sobre o seu território na China, através da iconografia da inocência infantil.