Tag (Sion Sono, 2015)
Quem não se orienta a tempo de adquirir bilhetes para a sessão de abertura tem de se contentar com as sessões paralelas. E ainda bem, senão facilmente me escaparia este bizarro filme gore fetichista que consegue ser tão feminista quanto filme de exploitation. Livremente baseado num romance sobre um jogo mortal, leva-nos num périplo delirante onde mundos paralelos se fundem, cada qual mais bizarro e sangrento. Não é intencionalmente claro que forças malévolas atormentam Mitsuko, a jovem e inocente protagonista. Sublimações de pulsões de descoberta da sexualidade, com alguns momentos de muito óbvia sugestão amorosa entre adolescentes? Espíritos e forças malévolas? Jogadores que se divertem com que acreditam ser personagens cuja existência termine quando se desliga o dispositivo? Ou, como sugere no final, personagens de carne e osso criadas a partir do ADN de uma vítima como material de um jogo onde a fantasia e o real colidiram?
A confusão do espectador espelha a da personagem, constantemente a fugir de situações que não compreende até o seu sacrifício final pôr fim à sucessão de estranhos mundos. Algo que me parece típico do horror japonês, quer em cinema quer noutros meios. Obedece a uma lógica que não se compadece com as nossas expectativas de linearidade, tornando-o profundamente surreal. Ou isso, ou há qualquer pressuposto muito óbvio advindo da cultura japonesa que me é completamente invisível. Tag lega-nos cenas de gore memoráveis, desde o brilhante arranque com dois autocarros carregados de lolitas tagarelas subitamente cortados ao meio, deixando uma estrada coberta com corpos decepados, à inexplicável cena de um casamento onde o noivo salta de um caixão revelando a sua gigante cabeça de suíno. Quase me esquecia da tendência perversa do vento que teima em levantar as curtas saias para revelar as cuequinhas das adolescentes colegiais. Sintoma de um fétiche muito japonês.
Num aceno à minha profissão confesso um carinho especial pela cena em que as professoras de um liceu para raparigas impõem disciplina às discentes com caçadeiras e metralhadoras gatling. Quantas vezes gostaria de..., pensei.
A fotografia é muito bela, com a câmara quase sempre centrada em Mitsuko em composições de grande equilíbrio estético. E assinale-se que a protagonista corre muito. Numa escala WASD, digamos que a tecla W foi a mais massacrada.