sábado, 30 de novembro de 2013

Herland


Charlotte Gilman (1979). Herland. Nova Iorque: Pantheon.

Bolas, que este custou a escorregar. Leitura curricular para o mooc Fantasy and Science Fiction: The Human Mind, Our Modern World, foi apresentado em paralelo com A Princess of Mars de Burroughs como exemplo da literatura pulp. De todo o currículo do curso apenas duas leituras me eram de todo desconhecidas. Se os contos de Nathaniel Hawthorne foram uma excelente surpresa, este Herland é uma experiência dolorosa. Não é um livro de todo inútil, sendo representativo de uma vertente de especulação científica e social na FC pulp.

Herland é uma utopia feminista onde um grupo de aventureiros encontra num vale amazónico uma sociedade matriarcal composta unicamente por mulheres que se reproduzem por partenogénese eugenista. Isoladas do mundo, desenvolveram um mundo perfeito, comunal e equalitário, mas não deixam de ser curiosas pelo conhecimento trazido pelos homens extraviados que as descobrem. E, feminismos à parte, nem se importam nada de experimentar um gostinho dos velhos tempos pré-Herland entre homens e mulheres, com casamentos à mistura.

Como todas as utopias Herland defende uma aterradora visão totalitária de perfeição. Pessoalmente sempre senti que há algo de profundamente arrepiante nas visões de sociedades perfeitas, onde cada qual vive feliz no seu lugar na hierarquia social e há um consenso geral no ideário oficial. É tudo demasiado igual, demasiado homogéneo, demasiado civilizado. Estas terras de cocanha escondem sempre um esmagamento do indivíduo por detrás da compreensiva abundância.

Esta é relativamente liberal, apesar de poder ser melhor descrita como uma mistura do mito das Amazonas com uma versão feminista das Stepford Wives num mundo perdido na floresta amazónica. O livro em si é um enorme infodump de ideias sociais. A visão que nos é dada do mundo perfeito é-o em comparação com o mundo real, obrigando o leitor a reflectir sobre virtudes e injustiças da sociedade que lhe é contemporânea. Tem toques de socialismo utopista e eugenia, dois ideários em voga nos primeiros anos do século XX, perfeitamente apropriadas para um livro publicado originalmente em 1915. Como exemplo de uma vertente narrativa da FC tem o seu interesse, mas em termos literários percebe-se o livro ao fim de poucos parágrafos e tudo o resto um longo périplo num atoleiro literário.