terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Lusitânia #1



Pedro Cipriano, et al (ed.) (2012). Lusitânia. EuEdito.

Mais uma boa surpresa, surgida num momento de grande vitalidade no panorama nacional de Ficção Científica e Fantástico. A revista Lusitânia foge às etiquetas posicionando-se como de ficção especulativa e surpreende pela sua frescura de juventude, apostando em novos autores sem se socorrer da ancoragem em nomes já consagrados.

O tom da literatura fantástica é dado no arranque com o conto Sonhos de uma Noite de Natal onde Marcelina Leandro mistura ambientes tradicionais do género com premonições e tempo não linear. Subtis invasões alienígenas contaminam a humanidade através do vinho do porto em Vinho Fino de Inês Montenegro. Segue-se Catarina Lima, tongue in cheek a recordar certas afirmações recentes de alguns políticos, num  Como Portugal Foi Salvo Pelos Pastéis de Nata misturando cataclismos lisboetas e a estética da bruxaria benfazeja que se remete mais para a fantasia do que para o horror. Uma prosa mais rebuscada, fortemente dentro do gótico literário, é o que nos reserva a reinvenção do mito de Viriato por Nuno Almeida em A Guerra do Fogo.

A Cidade das Luzes intriga pelo seu conceito, para mim fortemente reminiscente da emergência contemporânea de uma sociedade panopticon potenciada pela tecnologia, onde os perfis digitais de cada um colidem com uma ideia de privacidade em desaparecimento. Neste conto são luzes que mostram e condicionam estados de alma. O retrato de uma sociedade totalitária assente no controle emocional é outra das vertentes interessantes deste conto. A prosa de José Pedro Lopes, com clareza descritiva mas com problemas de interligação dos diferentes momentos narrativos dificulta a compreensão deste texto que parte de premissas intrigantes. Pedro Cipriano termina com um sólido futuro ficcional em A Passagem Uivante, conto em que vai revelando vistas progressivamente mais abrangentes de um futuro distópico inspirado no passado histórico.

Vozes novas, frescas, com ideias interessantes numa edição com curadoria cuidada é o que nos reserva este primeiro número da Lusitânia.