António Freire (1965). Grécia Antiga e Grécia Moderna. Porto: Centro de Estudos Humanísticos.
O gosto por descobrir livros curiosos no acaso das bancas de alfarrabista tem destas coisas. Esta edição dos anos 60 do livro Grécia Antiga e Grécia Moderna seduziu pelo tema, nunca é demais ler sobre aquele que é um dos berços da nossa civilização ocidental. O livro não desilude, apesar de obviamente antiquado (mas seria idiota criticar um livro editado por anos 60 por não ser atual, claro).
Lemos aquilo que é um misto de sabedoria clássica com registo de viagem. O livro parte de uma viagem à Grécia feita pelo seu autor, e quando nos fala da antiguidade clássica, cruza a erudição com o entusiasmo da descrição, dando uma perspetiva pessoal das antigas pedras e histórias. Sabemos hoje mais sobre a antíga Hélade,
Corre um pouco pior quando se foca na Grécia moderna. Aí, as convicções conservadoras do autor tomam a primazia. O elogio à monarquia e às regências nobres é quase bajulador. Quando nos fala do povo, elogia a sua singeleza (leia-se pobreza) mas teme a penetração de ideias subversivas ou imorais, com uma estranha fixação no quão chocante é para o escritor deparar-se com livros sobre sexualidade nas livrarias gregas. Torna-se ainda mais problemático ao falar das liberdades gregas na época, passando a ideia que isso da liberdade é muito bonito, mas na verdade não funciona, entre a transmissão de ideias perniciosas aos incómodos das greves e lutas laborais. Chega inclusive a incluir todo um capítulo sobre Salazar, elogiando as suas virtudes e acusando os estrangeiros que o criticam como injustos. Exato, leram bem, um livro sobre a Grécia inclui todo um capítulo elogioso ao ditador português e ao estado novo.
Bizarrias de alfarrabista. Sorri com o conservadorismo bafiento, com toda a manifestação de xenofobias (o autor não é muito simpático com turcos ou árabes), dogmatismos ideológicos e traumas sexuais (com aquele fascínio que os moralistas têm em chocar-se com o imoral). Tudo passa a fazer mais sentido ao perceber que o autor foi um padre minhoto, o que também explica o interesse demasiado detalhado para com os ritos da ortodoxia cristã grega. Já no que toca à visão sobre a antiguidade, apesar de um pouco data, não deixa de ser uma viagem interessante a um passado histórico que, pela sua herança, também é nosso.