Imai Arata (2025). Flash Point. Lisboa: Sendai.
Quando uma jovem adolescente decide passar o verão a baldar-se às aulas e passar os dias em casa do marido da irmã, que está desempregado, mal esperariam mergulhar num universo de conspirações. Diga-se que esta não é uma história de amores proibidos, a jovem e o homem passam os dias a jogar videojogos e a gravar vídeos patetas para as redes sociais. Chegam a ter sorte, com uma coreografia da rapariga que viraliza. Sem fins comerciais, vão recriando a coreografia em vários locais, até mesmo próximo de um comício onde está o ex-primeiro ministro japonês Shinzo Abe. Nesse momento, tornam-se em testemunhas do assassinato deste político.
É aqui que a história se torna bizarra, e interessante. Começam a surgir publicações em redes sociais que apontam para uma relação entre os gestos da coreografia da jovem e o assassinato, que depressa explodem nas mais bizarras teorias da conspiração. Os utilizadores de redes sociais vêem de tudo nos vídeos da jovem, começam a persegui-la, chegam a raptá-la para fazer uma grande manifestação no dia do funeral do político, congregando os mais estranhos grupos e canalizando através da jovem todos os temas de protesto da sociedade japonesa, com teorias bizarras à mistura. Tudo termina de forma rocambolesca e surreal, com um marcante grande balão que representa o rosto do político a salvar a jovem do topo da Dieta japonesa (é spoiler, eu sei, mas tão surreal que merece referência).
Sabemos que da Sendai só nos chegam propostas de mangá interessantes, fora da caixa, incomuns e inesperados. Este mantém a regra. O que parece ser uma pequena história de dramas familiares e adolescência depressa se transforma numa parábola sarcástica sobre redes sociais, paranóia, neuroses sociais e o alastrar de posições extremadas a partir de conteúdos descontextualizados. Ou seja, uma metáfora dura que se aplica bem ao momento cultural e social em que vivemos.