John Kissee (2025). Doctor Rigby: Tales from the Deep. Markosia.
Uma boa surpresa em novela gráfica. O estilo retro é rebuscado, equilibrado e bem cuidado, com uma ilustração comedida mas cheia de pequenas surpresas para os conhecedores do terror clássico. As histórias seguem o mesmo molde, evocando visões evocativas do terror pop dos anos 50 do século XX. Um livro divertido, bem estuturado e visualmente interessante.
Chris Claremont, et al (2025). Cosmic X-Men Omnibus. Marvel Comics.
É difícil de ultrapassar a influência do trabalho de Chris Claremont como argumentista dos X-Men. Nos anos 90, pegou num título bastante menor da Marvel e transformou-o num mini-império dos comics, com vários títulos complementares e uma galeria crescente de personagens que que tornaram icónicos. A sua receita foi relativamente simples. Mudou a metáfora dos mutantes, sempre a braços com os seus poderes, da lógica de identificação com a adolescência e as transformações do corpo, com prego a fundo em direção às questões raciais. Sempre em luta contra o racismo e a incompreensão, antagonizados por uma sociedade que os rejeita. O outro lado da equação inspirou-se diretamente nas telenovelas. Claremont deu mais corpo aos personagens, dotando-os de vidas complexas (entendam este complexo ao nível dos comics, claro), bem como teias de interrelações sociais e amorosas. Integrou isso no meio das aventuras típicas do género, criando linhas narrativas convolutas que ainda hoje são exploradas. Foi uma fórmula de sucesso, que catapultou o argumentista para o estrelato, mantida ao longo de décadas e que talvez só Jonatham Hickman, com a linha narrativa House of X, conseguiu quebrar um pouco.
Outro pormenor que Claremont soube explorar envolve alguns elementos distantes do mythos central dos X-Men - a sua ligação com o longínquio império estelar Shi'ar. É a oportunidade perfeita para doses valentes de space opera ao estilo dos comics de super-heróis, e Claremont legou-nos algumas sagas interestelares em que os heróis se vêem envolvidos em complexas conspirações e jogos de poder entre planetas e civilizações alienígenas. O tom de aventura dinâmico é contínuo, sempre divertido de ler. Este omnibus colige aventuras similares já criadas pelos argumentistas que sucederam a Claremont, num tom mais grimdark que espelha a evolução posterior dos personagens.
Rob Williams, Arthur Wyatt (2025). Judge Dredd: A Better World. Londres: 2000 AD.
De vez em quando, a cultura pop surpreende com a visceralidade com que aborda temas delicados. Sabemos que Judge Dredd é uma das mais mal interpretadas metáforas sobre o fascismo autoritário. O futuro das megacities não é uma visão a aspirar, nem a justiça de Dredd sequer justa. A metáfora dilui-se imenso no uso que é dado ao personagem, muitas vezes em tom de policial e heroísmo futurista. Há séries que escapam, e esta foi uma delas. Foca-se numa Juiz que é essencialmente uma administradora, responsável pela contabilidade do departamento de justiça que governa Mega City 1. E que, nas suas contas e simulações, percebe que o investimento linear em mais forças, em reforço da segurança repressiva, tem como efeito o aumento do crime e insegurança. Se os recursos são priorizados para estas áreas, outras, como a educação e o bem estar dos cidadãos, deterioram-se e as pessoas reovltam-se. Percebendo isto, a Juiz avança com um projeto experimental que melhora as condições de vida de um dos bairros da cidade. Um projeto mal visto pelos poderes tradicionais, que se aliam aos media sensacionalistas para denegrir e pintar uma falsa imagem do projeto, enquanto conspiram para assassinar a Juiz que trabalha para construir um mundo realmente melhor. E, sendo o mundo de Mega City 1 uma distopia, serão bem sucedidos. A metáfora sobre os dias de hoje é palpável. Rendidos ao canto da sereia do populismo, estamos a deixar que as nossas condições de vida piorem para favorecer oligarquias plutocráticas, enquanto achincalhamos aqueles que nos mostram como é realmente possível melhorar o mundo.