sexta-feira, 22 de abril de 2022

Futuro


Lívia Borges (2021). Futuro. Barcarena: Editorial Divergência.

À beira da extinção, a tenacidade humana resiste, mesmo quando a própria esperança já desapareceu. É esta a sensação que retiro da leitura deste romance, uma sólida proposta de ficção científica saído da Editorial Divergência. O  livro está em firme âncora neste campo literário, com uma premissa, história e mundo ficcional entre a ficção pós-apocalíptica e a distopia.

O título, e a capa, enganam. Este Futuro não sonha com utopias de perfeição, ou nos descreve futuros radiosos. Bem pelo oposto. Nem sequer é claro se o futuro deste romance é um futuro, ou um tempo presente arrasado. O livro é impiedoso, e com um final amargo, de condenação. 

A Terra está condenada, neste romance. A humanidade está em extinção, caçada e exterminada por uma invasão alienígena incompreensível, que se dedica a extrair todos os recursos e a caçar seres vivos. Invasores que, ao longo do romance, iremos perceber serem em tudo iguais aos humanos, e por isso ainda mais difíceis de combater. Poderá haver aqui uma metáfora sobre a nossa própria atitude para com o planeta, os efeitos nocivos da nossa incessante extração de recursos, da nossa incapacidade de lidar com as crises ambientais, mas isso não é claro no texto.

Acompanhamos as desventuras de uma mulher que soube transformar as dores e traumas em força para sobreviver, com um único objetivo  - chegar a uma ilha que será o último refúgio da humanidade. No seu percurso, acaba por salvar um homem enfraquecido, pelo qual, apesar de todos os inconvenientes, se apaixonará. A ilha acabará por se revelar uma utopia triste, à qual as personagens  nunca se adaptam por completo, e sucumbirá à ameaça alienígena. O livro termina desta forma, sem esperança, apenas a irredutível vontade de viver só mais um dia.

Esta proposta literária foi surpreendente. Uma história bem construída, com enorme fluidez narrativa, e um constante suspense que mantém viva a curiosidade do leitor. Uma fuga às expetativas, com um lado apocalíptico que não se resolve com um final feliz, e uma visão da utopia como algo restritivo e sufocante. Contra as minhas expectativas, dei por mim a lê-lo praticamente de uma só assentada. Já há algum tempo que não me cruzava com um livro que não se consegue largar até ao virar da última página.