domingo, 27 de março de 2022

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Esta semana, destacamos o legado de Val Lewton, música muito independente, e as seduções do centenário Ulisses de Joyce. Fala-se dos implantes oculares biónicos que deixaram de funcionar com a falência do fabricante, de linguagens de programação para computação quântica, e da iniciativa da UE de monitorizar o uso de plataformas não europeias pelos serviços públicos. Ainda se olha para o aproveitamento de casos mediáticos para espalhar agendas securitárias, dos infernos de Bosch, e da relação entre a Ikea e a desflorestação na Europa central. Outras sugestões de leitura vos aguardam, nas Capturas da semana. 

Ficção Científica e Cultura Pop


Rodney Matthews: E diga-me, qual foi a sua inspiração para a nave espacial?

The Little Pests: Um projeto que sigo há alguns anos, que se dedica a recuperar pérolas (não necessariamente boas) dos comics de terror pré-comics code.

Revisitando as Sombras - Pensamentos Livres sobre o Ciclo de Horror de Val Lewton na RKO dos anos 40: Um mergulho na obra de um realizador de culto, responsável por alguns dos mais influentes filmes de terror das décadas de 40 e 50 do século XX. Um daqueles realizadores capazes de maravilhas estéticas dentro dos constrangimentos temáticos e financeiros dos filmes de série B.

4794) A reciclagem na canção popular (15.2.2022): Sobre as referências cruzadas e polinização de ideias; não plágio, mas uma das mais essenciais técnicas artística, um trabalho inspirar outro.

The Strange,obscure, diy and outsider music group Volume 2: Soa bizarro estar a destacar um grupo de rede social aqui (especialmente dado que a dada rede social está a iniciar o seu processo de decadência), mas este espaço tem sido dos mais interessantes. É dedicado a música obscura e independente, tem de tudo, das bandas rock, pop e punk esquecidas, discos raros, música étnica e bizarrias sonoras que, neste espaço, são tratadas não com escárnio, mas com o respeito por aqueles que se atrevem a fazer a sua cena.

DuoMoji combina el clásico juego de memoria de encontrar parejas con el estilo Wordle: Confesso, estou viciado nos clones portugueses do Wordle, e este vem-se juntar à liça. O que me seduz nestes jogos é o serem tão anti-gratificação imediata. Demore-se o tempo que se demorar a tentar decifrar o puzzle, o próximo só está disponível no dia seguinte. Perfeita antítese dos dark patterns e exploração de comportamentos aditivos a que os jogos nos habituaram.

The Seductions of “Ulysses”: É, deveras, um dos livros mais sedutores que já li. Por ser desafiante. Pela linguagem fluida e complexa. Pela densa rede de referências e analogias. Por ser uma das grandes obras primas da literatura do século XX.

Marvel To Publish "Dark Web" Comic Book Series: Ah, Dark Web, essa coisa medonha... ou então, apenas uma variação sobre o Homem Aranha.

Star Trek Transporters Through the Years: A evolução do teletransporte em Star Trek. Ou melhor, a evolução da forma como os efeitos especiais permitem mostrar o efeito de teleporte.

Guy Lardreau, Fictions philosophiques et science-fiction (1988): Visões francófonas sobre a ligação entre especulações e filosofia.

Predicting the Future: How’s That Working Out?: É sempre divertido analisar as futurologias do passado, revelam imenso sobre a sua contemporaneidade através da forma como se projetavam nos futuros prováveis.

Tecnologia


[no title]: Velhos sonhos.

Data Is Not The New Oil: Interessante comparação, dados como... material fissível radioativo, pela proliferação, formas e consequências do seu tratamento.

Going Analogue, Returning To Digital: A espelhar uma certa saturação que todos sentimos com o digital. Ou melhor, com um aspeto específico do digital, ruidoso, inconsequente, e na verdade pouco útil.

Si tienes un móvil con Android 13, ya puedes instalar una máquina virtual con Windows 11 en él: Sim, certo, mas porque é que iria fazer isso? Na verdade, há muitas razões possíveis, desde a experimentação a usos de nicho.

Expert: No, Russia Isn’t Going Pull Its Modules to Sabotage the ISS: Diria que o modelo ISS é o a seguir nas relações internacionais. Se alguém decide desligar e sair, condena-se. É um modelo de interdependência profunda, na verdade bastante similar ao ecossistema global.

Billionaire plans more trips to space under the Polaris Program: Apesar de haver algumas medidas ostensivamente científicas (estou para ver como é que fazem o passeio espacial numa nave não preparada para isso, numa indústria tão naturalmente aversa a riscos como a do espaço), isto é claramente mais um bilionário a divertir-se com o espaço. Não é necessariamente mau; se reclamamos uma maior abertura do Espaço, este é um dos caminhos a trilhar.

Are You Still Using Real Data to Train Your AI?: Do uso de simulações como forma de treinar algoritmos para desempenho no mundo real.

Hello Many Worlds in Seven Quantum Languages: Como escrever o clássico hello world, em linguagens para um tipo de computação onde a resposta do programa não será um hello world, mas a probabilidade de um dos mundos.

How many words does it take to make a mistake?: Mecanizar a educação, é uma ideia que já está entre nós há muito, e precede a explosão digital. Mas agora a tentação de metrificar todas as ações educativas, substituir a intuição humana por dados, passar o ensino para vídeos e atividades mecanizadas, está em crescendo. 

Armageddon: Só mesmo os japoneses para inventarem uma variante de xadrez com mais de oitocentas peças e de mil e duzentos quadrados.

Their Bionic Eyes Are Now Obsolete and Unsupported: Isto recorda o clássico conto Flowers for Algernon, mas na vida real. Cegos que utilizam um inovador sistema de visão artificial, que lhes conferiu alguma capacidade de visão, estão a regressar à condição de cegueira total. Com a agravante de não conseguirem extrair as próteses visuais. A razão disto? A falência da empresa que fabricava estes dispositivos, que deixaram de ter qualquer suporte em caso de avaria ou simples perda de bateria. É algo pelo qual já todos passámos com um gadget ou outro, tornado obsoleto com o desaparecimento do seu fabricante. É chato, mas não passa de inconveniência. Neste caso, a coisa adquire uma gravidade que ultrapassa em muito a mera inconveniência, o fim do suporte a estes dispositivos médicos anula na prática todos os seus benefícios. Esta questão, da sustentabilidade financeira de empresas que produzem dispositivos médicos, é de levar em conta nos sonhos e deslumbres com tecnologias implantáveis para aumento das capacidades humanas. 

Fantastic collection of pixel fonts inspired by classic games: Um recurso útil. E nem se atrevam a dizer o contrário.

Classic Chat: Preserving Computer History: Entre o preservar do património computacional, e o fascínio pela estética intríseca da tecnologia.

Windows 11 vai exigir internet e conta Microsoft durante instalação: A Microsoft está a regressar às velhas práticas de ética duvidosa com o windows 11; começa pelos requisitos de instalação, que alienam quem tenha hardware um pouco mais antigo, e continua nisto, na necessidade de ter conta microsoft para poder instalar o sistema operativo.

DeepMind’s AI can control superheated plasma inside a fusion reactor: Um desenvolvimento fascinante, que nos poderá aproximar mais do sonho de gerar energia nuclear limpa.

Smart Canvas no Google Docs livra-se do formato de páginas: Confesso que muitas vezes me pergunto para que é que arcaísmos como rodapés e paginação são tão considerados, numa era de leitura digital em deslizamento.

How Every Developer Knew All The Wordle Answers From Day One: Uma forma muito técnica de fazer batota no Wordle... e uma reflexão sobre segurança de dados. 

AÇÃO COORDENADA DA UE PARA INVESTIGAR O USO DE SERVIÇOS DE 'CLOUD' NO SETOR PÚBLICO: Ui, isto vai dar confusão. Tendo em conta que demasiados dos nossos serviços públicos assentam sobre soluções Google ou Microsoft, onde não é claro se a obrigatoriedade de manutenção de dados no espaço europeu é cumprida. Assentam, note-se, em regime de total dependência, com desconfiança perante soluções abertas e livres.

Modernidade


Ian Miller: Um pouco de fantasia.

Listening to the Colors in Kandinsky’s Paintings: É algo que quase esquecemos, o artista russo era sinestésico, o que significa que a cor nos seus quadros está associada a sons.

Booster protection from omicron hospital stay dips from 91% to 78%: Só um lembrete para nos recordar que a pandemia ainda não passou. A terceira dose, de reforço, perde eficácia com o tempo. Ou seja, quarta dose no horizonte. E, sem me querer fazer parecer especialista em epidemiologia, quinta, sexta, sétima e em diante doses. Até porque endémico não significa controlado.

Why Is This AK-47-Toting Ukrainian Grandma Being Trained by Neo-Nazis?: Se também viram as imagens da avózinha a aprender a dispara uma AK-47 nas televisões, e ficaram a estranhar a bizarra futilidade daquilo, a coisa é ainda mais estranha: envolve brigadas neonazis. A Ucrânia está um caldeirão a ferver.

The Paris of Tomorrow That Thankfully Never Was: O plano de Le Corbusier para arrasar a velha Paris, substuindo os boulevards do século XIX por torres modernistas. Hoje parece inconcebível, mas ao tempo pareceria uma forma de modernizar espaços urbanos vistos como antiquados. E isso recorda-me ter visto um documentário sobre Lisboa nos anos 30, onde o narrador advogava o arrasar de Alfama e Mouraria, esses bairros infectos, para os reconstruir com casas modernas e ruas amplas. Imaginem, Lisboa sem os seus bairros...

The Case for Defending Ukraine: São jogos perigosos, mas no essencial, ceder-se aos caprichos de um autocrata é um tremendo risco para a democracia ocidental.

The Case for Restraint on Ukraine: Parte do problema ucraniano advém de um certo expansionismo da aliança atlântica.

How books, movies and TV help us understand the infodemic, anti-vax messages and conspiracy theories: Uma curta história da forma como as epidemias de desinformação alastram, um padrão repetitivo ao longo da história humana.

How Painter-Architects Brought Built Spaces to Life: Da ligação íntima entre arquitetura e desenho, como forma de visualização das futuras edificações.

New Research Shows Humans Arrived in Europe Much Earlier Than We Thought: Achados que desafiam a perceção sobre as nossas origens no passado profundo.

How Bosch Experienced his Own Kind of Hell: Entre a mitologia cristão, os horrores de uma vida entre guerras e pestilência, e a probabilidade elevada de psicadelismo induzido por fungos na farinha de pão. Recordar o proto-surrealismo intemporal de Bosch.

China Now Understands What a Nuclear Rivalry Looks Like: Sou só eu que fico com a sensação que esta segunda década do século XXI arranca com um gostinho mau a série televisiva nostalgista? Autocracias a crescer, novos imperialismos, desunião, ameaças de guerra, e, porque não meter no caldeirão um pouco de guerra fria e proliferação nuclear? Parece que estamos a recuar mais de meio século.

O “terror” que nos governa: Leitura imperdível, esta análise sobre a forma como o caso do estudante que alegadamente planeava uma vaga assassina na FCUL está a ser tratado pelos media. Não pelo lado de aproveitamento abutre, foi notória a alegria de editores e comentadores perante assunto tão chocante, tão espremível até para lá dos limites de éticas e deontologias (isso, é coisa que só é invocada em momentos específicos, o que interessa é gerar audiências e com isso valor para os acionistas). O Shifter, mais observador, olha para outros aspetos, para o empolar de um possível crime sob o ponto de vista de uma agenda securitária. Também reparei nisso, como muitos a advogar para grandes audiências que a internet deveria ser mais vigiada, e que os metadados dos cidadãos deveriam ser facilmente acessíveis. Porque é que isso é má ideia? Este artigo mostra muito bem.

Ikea’s Race for the Last of Europe’s Old-Growth Forest: O tipo de histórias que pensamos só acontecer nas zonas remotas, como a Amazónia. Desflorestação gritante, corrupção endémica e assassínio de polícias e ativistas que se opõem às atividades da indústria madeireira. A passar-se em plena Europa, na Roménia. Embora a Ikea faça alarde do seu compromisso com o ambiente, os crimes ambientais cometidos para fornecer a matéria prima para os móveis que fabrica diluem-se ao longo da cadeia de distribuição.