Esta semana, destacamos a ideia de "curiosar" (que delícia de palavra!), os prémios Amadora BD, e o papel dos Penny Dreadfuls na promoção de literacia. Fala-se da vida de Ada Lovelace, dos problemas sociais induzidos pelo Facebook e a sua tentativa de os escamotear com o metaverso, e de robots pintores. Ainda se reflete sobre a capacidade comunicativa dos cães, e Bocage, patos e ladrões. Outras leituras vos aguardam, nas Capturas da semana.
Ficção Científica e Cultura Popular
The Big Terrarium: Pulp clássico.
BANG 30! ESTÁ AÍ!: O mais recente número da Bang! já está disponível. Nas lojas FNAC, encontram a nova edição desta revista gratuita, a única em Portugal dedicada à cultura do fantástico. Confesso-me curioso, depois de no Fórum Fantástico o editor Luís Corte-Real nos ter falado da renovação gráfica da revista nesta edição.
Amadora BD 2021 - PBDA: os vencedores: O FIBDA despachou os seus prémios logo no primeiro fim de semana. Quer os nomeados, quer os vencedores representam o que de melhor se editou por cá de BD no ano de 2020. Fico especialmente contente pelo prémio a A Planeta Psicose, uma BD batshit crazy que retrata na perfeição a forma como os nossos discursos sociais se tornaram reféns das teorias da conspiração.
How feasible are Dune's ornithopters?: É um dos pormenores que nunca percebi em Dune, ornitópteros são uma daquelas tecnologias beco sem saída. O interessante, é ver que há quem os construa.
Dune poster art by Drew Struzan: O antigo Dune.
The Most Important Device in the Universe – Blinking Tubes Without Function: É uma das tropes normais da ficção científica no cinema, os botões e as luzes que piscam. Mas este vai um pouco mais longe, uma prop com tubos que piscam, constantemente reutilizado em diferentes filmes. Há de tudo, de Star Trek a clássicos obscuros. Claramente, uma piada insider dos criadores americanos de ficção científica televisiva e cinematográfica.
Chris Foss concept art of a Sardaukar ship: Modo Dune, ligado.
The Simpsons Library: Um apanhado dos livros (e outras publicações) que vão aparecendo nos Simpsons, entre o humor corrosivo e a vénia erudita.
‘Dune’ is too big for your TV: Já o vi, e sublinho por completo. Villeneuve pensou, e filmou, Dune com o tipo de enquadramentos que só fazem sentido no ecrã gigante de uma sala de cinema. É aí que realmente se sente o filme.
How Gruesome Penny Dreadfuls Got Victorian Children Reading: Um pormenor interessante, nesta história - as taxas de literacia elevaram-se antes da universalização da educação, em parte devido à popularidade desta forma de entretenimento. Outro pormenor: as histórias dos penny dreadfuls, violentas, sangrentas, lúridas, e imensamente populares, despertaram à época pânicos morais, sendo apontadas como más influências para a mente das crianças. Quaisquer semelhanças com pânicos morais posteriores (lembram-se dos videojogos, da internet, ou do mais recente sobre a série Squid Games) não é coincidência. A história dos media está cheia de episódios onde a influência de um novo meio de comunicação foi vista como perniciosa, detrimental para mentes influenciáveis. É um padrão.
4756) Borges e a erudição por brincadeira: Neste magnífico texto de Bráulio Tavares sobre Borges, há uma visão que, como educador, me fascina: "Muitos leitores se tornam eruditos devido ao prazer de ler. Começam a curiosar pelo prazer de curiosar". Sempre me pareceu o grande paradoxo da educação, todos gostamos de aprender e descobrir ideias novas, da literatura à educação física, mas no entanto, dentro do sistema educativo, este gosto, este "curiosar", não só parece ficar à porta da escola como parece ser deliberadamente extirpado da mente das crianças (e dos professores, também). Talvez porque o gosto na descoberta depende do tempo, do modo e do acaso, e o foco na rotina deixa isso tantas vezes de lado.
art-of-illlustration:Steele Savage - Stand on Zanzibar, 1968: E se leram o livro, percebem que tem tudo a ver com os mundos de Shalmaneser.
Let's Talk About Criticizing a Movie in Spoiler Culture: Confesso que sempre tive alguma dificuldade em compreender o problema dos spoilers. Se saber à partida o desenlace de uma história estraga a experiência de quem a frui, como qualificar? A história (livro, filme, série) é assim tão esquecível que sem o McGuffin ninguém a atura? Há um certo ar de redução intelectual sempre que se fala em spoilers, de reduzir uma obra a alguns momentos chave. Quando na verdade, o que nos cativa numa obra é todo o percurso, o estilo, a capacidade narrativa, o envolvimento. Ninguém lê um calhamaço maçudo só para chegar ao McGuffin da última página. E se os spoilers são assim tão importantes, não faria muito sentido rever filmes ou reler livros.
Tecnologia
Stevens Institute of Technology: Valerie Aurora - Rebooting the Ada Lovelace Mythos: De filha de Lord Byron a criadora do primeiro programa informático da história, e tanto mais para além disso, a vida de Ada Lovelace foi rica, ligada à ciência, matemática e primórdios da computação. É uma das figuras histórias cujo trabalho alicerça a nossa era digital.
The Accident That Led to Machines That Can See - Issue 107: The Edge: Intrigante, descobrir que experiências sobre percepção visual em animais permitiram chegar a componentes eletrónicos foto-receptivos, a base da visão computacional.
The original Macintosh PowerBook and laptop innovation: Confesso que, em público, sou um Apple hater, em grande parte por estar ligado ao mundo da educação e me ser totalmente incompreensível que se favoreçam equipamentos a que uma enorme maioria de alunos nunca poderão aceder (o entusiasmo "iPads na educação", ao qual respondo com um "e como é que os alunos de classe média ou pobres os podem adquirir"). No entanto, se a posição pública é de falso radicalismo, reconheço que de facto a Apple e os seus produtos têm um longo historial de inovação e qualidade. E, claro, design. Como se percebeu pelo iPhone, os designers da empresa têm a capacidade de determinar a forma-função das tecnologias de consumo. Antes do iPhone, havia uma variedade enorme de modelos de telemóvel e smartphone. Depois do iPhone, passou tudo a ser um paralelepipedo negro. É curioso ver que o mesmo se passou com os portáteis, com o Powerbook a consolidar alguns elementos de design que se tornaram o essencial de qualquer computador portátil.
NASA’s tiny electrical aircraft is almost ready for lift-off: A motorização elétrica é um dos futuros de uma aviação que se quer mais sustentável, e este protótipo curioso da NASA mostra alguns dos caminhos possíveis.
The Metaverse Is Bad: Provavelmente o texto mais lúcido que lerão sobre a iniciativa metaverso do facebook, desde a concretização dos sonhos de ironia negra de Snow Crash (o cyberpunk não era suposto ser levado à letra, mas foi, e agora vivemos numa certa distopia digital) ao hipercapitalismo que vê no virtual uma forma de maximizar lucros. A iniciativa irá falhar; o histórico dos mundos virtuais aponta para isso, mesmo que hoje se disponha de tecnologias mais portáveis do que as de há 10, 20 ou 30 anos (citando três ondas de mundos virtuais). Possivelmente, porque todos estes sonhos de geografias virtuais esbarram com o nosso gosto humano pelo real e tangível. Não invalida a realidade virtual e aumentada, são tecnologias excelentes, especialmente para os mais criativos, mas queremos mesmo passar muito tempo a interagir de forma virtual e imersiva? Claro que, contas feitas, esta iniciativa Metaverso é essencialmente a gestão da rede social a querer desviar as atenções de todos os problemas que levanta e das críticas que tem sido alvo.
STARLAB: A New Private Space Station is in the Works: Bem, a menos que a Space X esteja envolvida, só acredito nisto quando esta proposta estiver tripulada, em órbita. Projetos e intençõs há muitas, e markeitng também.
Flingbot: Um robot pintor que não segue o método riscador habitual neste tipo de projetos. Baseia-se na catapulta. Um robot pintor ao estilo Jackson Pollock, com aleatorização e action painting. A página do projeto é detalhada, como é habitual entre makers, para os quais a partilha de conhecimento e o poder construir a partir de projetos anteriores é algo de fundamental.
The Metaverse Could Help Us Better Understand Reality: Se as promessas dos mundos virtuais sociais geralmente falham (pista: uma tecnologia imersiva que nos obriga ao isolamento não é sinónimo de sucesso), isso não significa que a realidade virtual não seja uma tecnologia poderosa, nos domínios que vão das ciências às artes.
How AI is reinventing what computers are: Talvez seja a evolução para lá da lei de moore; rapidez já não é o único parâmetro que valorizamos nos processadores, porque cada vez mais os dispositivos que usamos recorrem a aplicações de inteligência artificial, com outros requisitos. Isto mostra que a inteligência artificial já está presente no nosso dia a dia, em múltiplas aplicações que nos são invisíveis, dentro dos dispositivos móveis que são os nossos principais meios de computação.
Drawing Robot Creates Portraits Using Pen, Paper and Algorithms: Mais uma intrigante máquina de desenho, que gera retratos a partir de fotografias.
Photos Are Too Flattering Now: Um artigo que nos recorda os velhos tempos em que o ato de fotografar era algo de especial. Dependia da sorte, do acaso, e tinha de se esperar até que a revelaçáo nos mostrasse se realmente a captura do momento tinha sido bem sucedida. Hoje, é quase impossível tirar más fotos, daquelas memórias únicas dos nossos dias que ficaram desfocadas, desenquadradas, muito escuras ou muito claras. Ah, e recordam-se do efeito demoníaco dos olhos vermelhos?
How Facebook Fails 90 Percent of Its Users: É um problema que nós, por cá, sentimos um pouco, com o inexplicável espaço dado a trolls e alguns discursos violentos e extremistas. Mas na américa e europa, a rede social investe em moderação forte. Tal não acontece noutras partes do mundo. O resultado? A rede social como poço de desinformação e expansão da incitação ao ódio e violência. A explicaçáo da dificuldade de encontrar recursos de moderação para contextos e línguas complexos cai por terra quando se percebe que foi necessário a Apple ameaçar retirar o Instagram da sua app store para que o Facebook atuasse contra contas que promoviam o tráfico humano no mundo árabe. É nestas observações que se percebe como o Facebook está a ser danoso para a sociedade global.
Modernidade
Bocage e os patos: Descobri de relance esta história, se calhar apócrifa, sobre Bocaje no twitter e tenho de ir investigar mais. A piada, está na forma como desmonta a ineficácia do excesso de complexidade.
Surprise: the Big Bang isn’t the beginning of the universe anymore: No princípio, foi o big bang. Depois vieram as estrelas, os dinossauros, até que chegaram os humanos e deram cabo de tudo (os whovianos percebem esta frase; os não whovianos, bem, googlem). Mas, e se extrapolar o que se conhece - os primeiros microsegundos do universo, para o que não se conhece, pensando numa singularidade não for a forma mais correta de compreender como surgiu o universo?
Do dogs miss us when we leave? A "talking" dog offers insights: Como dog person assumida, fico encantado sobre as possibilidades de usar sistemas técnicos que aprofundem a comunicação canina. Por muito que tenha aprendido a ler o olhar e a linguagem corporal da minha Alice (rafeira adota, essa raça sublime), nunca saberei o que lhe vai no espírito. Já ela, sabe manipular o meu na perfeição. O meu lado mais científico teme que este tipo de experiências revele não a capacidade canina de comunicar a sua vida interior, mas sim o condicionamento inconsciente por parte dos seus tutores. Este é um factor importante em etologia. Mesmo assim, como gostaria de ouvir a Alice. Kudos ao grande Paulo Morgado por me apontar esta captura, porque dog persons of the world, unite and take over!
Legendary psychologist Mihaly Csikszentmihalyi dies at 87: Obituários são raros nestas Capturas, mas não consigo deixar de recordar este psicólogo húngaro, que nos legou o conceito de estados de fluxo criativo.
MAGA, the CIA, and Silvercorp: The Bizarre Backstory of the World’s Most Disastrous Coup: Daquelas histórias que é demasiado bizarra para ser credível como enredo de filme. Quando venezuelanos contactam um ex-soldado das forças especiais americanas para treinar uma força militar para derrubar o governo de Maduro, o que é que poderia correr mal e quão estúpido se pode ser? Nem o governo de Trump, dificilmente luminárias de bom senso, lhes quis pegar. O resultado foi desastroso.