terça-feira, 31 de julho de 2018

Holocausto Lunar



Sofia Lobo (2017). Holocausto Lunar: a divisão dos infantários. Edições Vieira da Silva.

A badana deste livro de FC portuguesa apresenta-nos aquela que, para mim, é a melhor biografia de um autor de li nos últimos tempos: "Filha natural de um padre doutorado em línguas mortas e viveu uma infância rigorosamente religiosa". Infelizmente, é também o pico de qualidade literária de Holocausto Lunar.

Estamos num futuro em que a Lua está totalmente colonizada e urbanizada. Serina, filha de um ramo caído em desgraça de uma família rica e proeminente, vê-se forçada aos piores destinos na sequência de uma revolução que derruba as democracias lunares. Uma revolução que traz a coletivização e ateísmo forçado, a deturpação da liberdade por uma ditadura vermelha. Serina e amigos são forçados a tornar-se amorais soldados-crianças, na linha da frente dos rebeldes vermelhos contra as forças da lei, que numa guerra sem quartel tentam reconquistar a Lua.

Pela sinopse, devem ter notado que o livro tem uma veia de anti-comunismo primário, fazendo uso de todos os lugares comuns da propaganda fundamentalista cristã. No livro, mais do que uma veia, é uma artéria, moldando de forma patética toda a história. No entanto, esta é uma escolha ideológica, nada contra isso. O que torna esta leitura um desperdício de papel é a completa falta de sentido de caracterização do mundo ficcional, bem como inexistente qualidade literária. Lamento escrever isto, gosto de apoiar autores portugueses nessa coisa tão rara que é FC portuguesa, mas neste livro, não encontro qualidades.

Se se vai situar uma história na Lua, convém contextualizar o cenário, ou pelo menos arranhar uma descrição do que seriam estas futuras colónias lunares. Pelas descrições, as cidades lunares até poderiam ser um quarteirão urbano da Reboleira. O mesmo se aplica à tecnologia futura. A história é uma sucessão de peripécias desconexas contadas com a perspicácia de um adolescente revoltado com o mundo. A projeção de um ataque à religiosidade, levado ao absurdo, metáfora sublimativa dos movimentos anti-clericais, tem um peso excessivo no livro. Este é o tipo de livro que um pároco de aldeia isolada dos anos 50, daqueles que gosta de manter o seu rebanho controlado com divino punho de ferro, recomendaria como leitura.