terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Nos Limites do Infinito


 
Pedro Cipriano (ed.) (2015). Nos Limites do Infinito. Vagos: Editorial Divergência.

Esta terceira antologia editada pela Divergência mostra um enorme salto qualitativo relativo às anteriores. Nota-se evolução no cuidado editorial, com a selecção de seis contos afinados, boas surpresas literárias. Neste tipo de antologias espera-se geralmente obras de qualidade mediana, algo normal e expectável em livros que dão voz a escritores novos, mas esta consegue escapar à regra com um conjunto de contos bem construídos e com boa qualidade literária, misturando a boa história com elegância na escrita. Esperemos que os editores consigam manter esta boa tendência editorial num campo, o da literatura de género, que é pouco clemente e demasiado de nicho.

Sorte ao Jogo, Ana Luiz: uma caracterização deliciosa de uma taberna daquelas à antiga serve de palco a uma história sobre tentações e pactos com o demo. O toque de contemporaneidade é dado no final, num conto onde se sente um Portugal parado nos meados do século XX, onde a sociedade masculina da tasca é a fuga para a pobreza e exploração laboral.

A Pele de Penélope, Ângelo Teodoro: um conto bem construído sobre maldições e amores obsessivos, com um ritmo bem marcado que leva o leitor à tenebrosa conclusão.

Memórias de Teddy, João Rogaciano: entre o terror e a ironia negra, um conto sobre um adorável ursinho de peluche que tem uma necessidade inexplicável de estropiar ou eliminar aqueles a quem se afeiçoa. História que nos leva da corte inglesa dos Tudor a um museu dos brinquedos nos dias de hoje. Tem um senão: o discurso final, apontando os crimes do boneco, é algo desnecessário embora se perceba o seu carácter de redundância. O conto está bem construído e é bem perceptível ao leitor aquilo que o ursinho fofo realmente é.

A Casa da Rua dos Mirtilos, Ricardo Dias: como não sorrir com este conto onde um grupo de crianças, a explorar uma casa abandonada, quase se cruza com um tímido fantasma bibliófilo? O ambiente, entre o deslumbre da descoberta e a premonição de algo assustador que nunca chega a acontecer, é o grande elemento do conto.

A Colina que Olha para Ti, Rui Bastos: uma belíssima surpresa, este conto de homenagem a António de Macedo que começa pela sugestão do terror mas termina na metáfora alegórica. Dos contos da antologia, é o que ultrapassa a fronteira da narrativa e entra no experimentalismo literário, embora de forma compreensivelmente tímida. Fazendo referência-tipo anos 90 a algo que só duas pessoas conhecem (e eu sou metade desse binómio), um conto do baril.

Entre Estações, Yves Robert: mais vinheta que conto, a encerrar a antologia, uma história simpática sobre imaginário, fluidez temporal e casas decrépitas avistadas da janela do comboio.