Duas experiências estéticas que tocam, cada qual à sua forma, neste pulsar eléctrico-digital dos primórdios do século XX. A primeira surgiu-me no radar cortesia do Virtual Illusion. Vídeo publicitário para a marca de lingerie Coco de Mer, é deslumbrante e luxurioso no seu visual. Sensual e hipercinético, deslumbra com a justaposição acelerada de imagens de grande beleza em alta resolução, com as obrigatórias mas perfeitas desfocagens, desenquadramentos e efeitos glitch. Tem aquela perfeição de alta definição que associamos a um digital de pureza cirúrgica. Quase ballardiano na frieza da sua beleza.
No outro extremo da estética digital surge este vídeo para Double Bubble Trouble, da rapper britânica M.I.A.. Este explode com a estética internet, de video-memes, gifs gritantes, justaposições aleatórias a revelar uma fortíssima inspiração nos recantos mais radicais da net art. O seu visual caótico, de subúrbio deprimido de betão decadente, vive numa espécie de continuum thug life com Arduino, drones a pulsar com luzes de neon e impressoras 3D. É cultura urbana crua, de transgressão em busca de afirmação, onde o culto da arma se cruza com a impressão 3D e estilo burka chic da colisão entre a europa islamizada com a expressão do individualismo. 1984 is now e Yes we scan são os gritos deste pulsar dos realmente nativos digitais, utilizadores sabidos e desconfiados da pureza das stacks do mundo digital.
As similaridades entre estes dois vídeos são intrigantes. Se um é planificado até à perfeição, o outro é aparentemente desconexo e assumidamente grotesco. Ambos usam a mesma estética saturada que grita don't worry, m'am, we're from the internet. Mas se Coco de Mer nos dá a elegância de alta resolução da estratosfera do mundo digital, M.I.A. colide tecnologia com as ruas. Como observou William Gibson, the street finds its own uses for things.