domingo, 7 de abril de 2013

Blender e 3DAlpha


Apresentação sobre o projecto na conferência Blender PT, que decorreu nos dias 6 e 7 de Abril no pólo do Porto da Universidade Católica Portuguesa. Esta conferência esteve centrada no software de modelação e animação 3D Blender, e caracterizou-se por um grande conjunto de palestras de introdução aos recursos do programa, aplicações avançadas, face rigging, utilizações específicas para arquitectura, animação e medicina. Destacou-se a masterclass sobre escultura digital em Blender por Luís Belerique, que surpreendeu pela mestria e pela abrangência. Desta experiência específica retiro a importância dada por um modelador digital 3D às concepções plásticas de forma e volumetria, cânones de representação, esboço e pesquisa.

Uma vez que o público-alvo desta palestra não é composto de professores e educadores, na apresentação do 3D alpha focalizamos o trabalho desenvolvido com crianças, mostrando as valências e limitações deste género de trabalhos no ensino público em detrimento de reflexões sobre a aplicação pedagógica de tecnologias Web3D. Deixo aqui algumas notas sobre a apresentação:

- Começar por uma pequena brincadeira: observar a imagem inicial referindo a sua extrema simplicidade, demasiado básica para um público constituído por profissionais e estudantes avançados ligados ao 3D. A imagem é simples e com defeitos, sem texturas e poucos pormenores. Foi criada ao longo de seis horas por quatro pessoas, crianças de doze anos de idade sem experiência prévia de utilização de programas em 3D.

- Falar do 3D como uma das vertentes possíveis de estimulação do uso criativo das TIC por crianças e jovens, aproveitando aprendizagens informais vindas da cultura mediática de jogos e filmes de animação, estimulando também uma atitude de capacidade de produção de conteúdos ao invés de simples consumo do disponibilizado pela cultura mediática online; olhamos também para alguns aspectos metacognitivos de aprendizagem de colaboração, processos de trabalho que envolvam fases de pesquisa, recriação e modelação, e o puzzle mental que é a modelação 3D que obriga a interiorizar visualização espacial na conceptualização mental das formas a recriar, estimulando o desenvolvimento destas capacidades nas crianças e jovens.

- Fazer uma breve observação sobre a grande quantidade de aplicações utilizadas, salientando que foram escolhidas pela sua enorme simplicidade de utilização e facilidade de obter resultados em tempo real, sublinhando que ao trabalhar com este público é importante que o aluno obtenha resultados rápidos de boa qualidade que o estimulem a aprofundar a aprendizagem. A utilização do VRML como tecnologia base prende-se com questões de estabilidade da tecnologia e facilidade de acesso no ambiente económico das escolas.

- Resumir o tipo de produtos criado pelos alunos, essencialmente objectos em 3D que são utilizados por si, em rendering gráfico, aplicados em mundos virtuais temáticos ou como elementos de animações simples.

- Reflectir sobre o carácter inter e trans-disciplinar; ao longo do projecto tem-se trabalhado com crianças do 1.º Ciclo, que surpreendem pela aderência e capacidade de exploração; quer aqui quer no 2.º Ciclo a aposta está na interdisciplinaridade, integrando a aprendizagem e criação em 3D com processos de pesquisa e aprendizagem noutras áreas curriculares, nomeadamente no domínio das ciências.

- A introdução da disciplina de TIC no 3º ciclo trouxe um novo desafio. Aqui, procuramos integrar o 3D com as metas curriculares, especificamente no domínio da produção multimédia, pesquisa e tratamento de informação, essencialmente desafiando os alunos a trabalhar em conjunto, estimulando a destreza na utilização do computador (se sobreviverem ao 3D, não há tarefa que lhes faça medo), e a aprender processos de criação que obriguem a interacção entre imaginação, pesquisa e construção.

- Os processos de trabalho implicam a aprendizagem elementar das aplicações, e sua utilização em projectos "multimédia" à escolha dos alunos, utilizando as aplicações que lhes são favoritas. O objectivo deste projecto é iniciar os alunos de forma lúdica, abrindo horizontes e despertando interesses, e não um percurso formal de aprendizagem de 3D que não se justificaria nestas idades e nível de ensino. Isto explica, entre outros detalhes, a utilização do jogo Minecraft como ferramenta de criação de conteúdo 3D, aproveitando o forte interesse dos alunos neste jogo, onde desenvolvem construções e espaços virtuais de complexidade assinalável.

- E porque não utilizar o Blender? Os objectivos do 3D Alpha estão na introdução lúdica e criativa, integrada curricularmente, a um largo espectro de crianças e jovens. Se a gratuitidade e potencial do programa o tornam numa escolha a ponderar, a sua complexidade não é adequada a utilizadores jovens, muitos dos quais não têm experiência prévia e depois desta introdução devido aos seus percursos pessoais futuros não irão aprofundar o 3D. No entanto, em contextos mais específicos em cursos de formação ou ensino secundário, cremos que se justificaria o investimento na utilização do Blender por jovens.

- Referimos algumas das mais valias deste género de trabalho, ao nível da descoberta do 3D com autonomia, trabalho em colaboração entre crianças, processos e disciplinas, e equilíbrio entre meios, privilegiando o 3D mas sem esquecer outras formas de expressão plástica ou outras vias de introdução às TIC, como as aplicações office, vídeo ou edição de imagem.

- Convidamos à visita à página do 3D Alpha, à galeria no Sketchfab e ao Babel. Para encerrar, reflectimos sobre a citação de Mitchel Resnick, “children have many opportunities to interact with new technologies – in the form of video games, electronic storybooks, and “intelligent” stuffed animals. But rarely do children have the opportunity to create with new technologies”.  Às crianças são dadas muitas possibilidades de interagir com o digital, mas poucas de criar com o digital, dando significado pessoal às suas aprendizagens. Marshall McLuhan apontava o computador como uma extensão da mente. Com o 3D Alpha, queremos que também seja uma extensão da mão criadora.

A conferência Blender PT 2013 caracterizou-se por dois dias muito intensos de partilha e aprendizagem, que deixaram um leigo como eu perfeitamente espantado com as possibilidades do programa e as suas aplicações. As demonstrações de animação 2D com o Blender de Jorge Ribeiro, rigs optimizados para animação facial por Pedro Bastos ou rigging avançado por Jorge Perdiz foram disso exemplo, aplicações avançadas demonstradas com uma paixão assinalável. Mais acessível a iniciados ou leigos do meu calibre foram as demonstrações do inteface de utilizador do Blender por José Andrade, graças à qual consegui, finalmente e ao fim de tantos anos a tentar sem sucesso, perceber como trabalhar com o programa, e a conversão de 2D para 3D por Ricardo Pereira que mostrou como a partir do desenho se chega ao 3D com facilidade. Foram momentos importantes para ajudar a vencer a barreira de introdução a este programa.

Muito mais foi visto. Possibilidades de rendering hiper-realista, o scripting como forma de automatizar animações tridimensionais interactivas em tempo real , exemplos de filmes criados neste programa de potencial tão vasto. Diria que o saldo final desta conferência abrangente foi muito positivo, quer para utilizadores avançados quer para participantes que, como eu, estavam como peixe fora de água pela distância entre este mundo e o mais habitual mundo da educação. Confesso que finalmente comecei a vencer a minha alergia ao Blender e a perceber que é possível encontrar formas de o explorar com aqueles alunos mais dotados que merecem um estímulo específico para desenvolverem as suas capacidades.