O dia de ontem foi passado num dos tradicionais rituais do verão português: o casamento. Foi um longo dia, que correu como correm todas as cerimónias de casamento, com muitos votos de felicidade, muitos olás como está a perfeitos desconhecidos mas que serão familiares de alguém, muitos risos e vozes estridentes. E, claro, o longo ritual gastronómico de acepipes, almoços de três pratos, muitos doces e as cornucópias que libertam cascatas de fatias de carne e camarões. Enfim, um festim. Desejam-se as maiores felicidades aos noivos, enquanto de saboreia um whisky a acentuar o paladar de um charuto (suspendi temporáriamente a minha resolução de deixar de fumar durante cerca de meio charuto) e se observam os vários preparos e despreparos dos restantes convidados.
Claro que não vou divulgar de quem foi o casamento; fico-me por dizer que foi coisa de família. Aos noivos, que conheço mal, desejo as maiores felicidades e agradeço um dia bem passado.
O pormenor desagradável no clássico casamento português é a ênfase do casamento em pleno verão. Na época mais quente do ano, em dias tórridos em que o corpo só pede para estar alapado à sombra tentanto absorver alguma frescura, o convidado de um casamento tem de se enfarpelar com um fato completo, preto (que absorve mais intensamente a radiação solar, aquecendo que nem um forno), composto com uma gravata (não sou normalmente apologista do genocídio mas creio que a nação croata devia ser totalmente exterminada como punição pelo seu legado ao mundo, a gravata). E assim continua, ao longo do dia, passando pelo local de culto escolhido para a cerimónia - no caso de ontem, um relvado sem qualquer sombra sob o sol escaldante do meio do dia, até que a insopurtabilitade do calor supera o decoro e o sentido da elegância das vestes. Passado este patamar, é ver gravatas dependuradas das cadeiras e camisas bem abertas para arejar o corpo. Por outro lado, as convidadas não sofrem tanto, uma vez que os vestidos femininos são muito mais leves e arejados do que o fato de três peças masculino - por outro lado, o sofrimento das convidadas em conseguir encontrar as peças de roupa certas, os vestidos perfeitos e as écharpes a condizer é muito maior do que o dos convidados a suar em bica debaixo de um fato e de uma gravata. Acreditem, falo por experiência própria...
O comentário habitual é de que os noivos tiveram sorte com o tempo, está um lindo dia com um belíssimo tempo. Isto sob um sol tórrido que queima a pele mesmo através do tecido quente do fato preto, enquanto o corpo se esvai em suor. Pois claro, então, um dia perfeito! Não havia assim um diazinho de primavera, solarengo mas arejado, ou um daqueles dias de inverno bem fresquinhos?
Resmungos à parte, sentimo-nos sempre mais humanos após uma destas cerimónias, independentemente de acreditar-mos nelas ou não. Faz parte das tradições, é um ritual simpático que compõe o rico desfile da diversidade da vida.