David Soares (2005). As Trevas Fantásticas. Lisboa: Polvo.
Nos dias que correm, David Soares retirou-se para um discreto percurso académico, do qual nos vai dando vislumbres em vídeos e colunas na imprensa, ou densas e brilhantes notas nas redes sociais. Apesar desta fuga das luzes da ribalta, este escritor continua a ser uma das mais importantes vozes literárias da literatura fantástica portuguesa, autor de romances marcantes e incontornáveis como Batalha ou O Evangelho do Enforcado.
O seu brilhantismo não assenta na simplicidade. Pelo contrário, é bem conhecida a sua implacabilidade no uso da língua, que chega a assumir proporções algo gongóricas. Nas temáticas, nas descrições, Soares não é carinhoso com personagens e leitores. A sua literatura toca, mergulha nos extremos, mas não de forma gratuita e voyeurista. Os mergulhos no horror em que nos leva são sempre profundos e sem condescendência. Isto torna-o numa voz poderosa e inquietante, cuja obra abala a tranquila sensibilidade portuguesa.
Num daqueles bons acasos de alfarrabista deparei-me com esta antiga edição de contos seus, que ainda não me tinha passado pelas mãos. É uma edição dos tempos em que o escritor se estava a afirmar como voz portentosa. Os contos são crus e elegantes na sua concepção, sente-se uma energia que toca os nervos do leitor. São estéticas que o autor viria a trabalhar nas suas obras posteriores. Uma leitura que não nos deixa indiferentes, e que não será para todas as sensibilidades. Para os que não temem abalos e choques profundos, a obra de David Soares é de descoberta obrigatória.