quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019
Autonomous
Annalee Newitz (2018). Autonomous. Nova Iorque: TOR.
Há muitas ideias interessantes à solta neste livro. Robots com personalidade, um futuro biotecnológico onde o grande norte gelado, tornado mais habitável pelos efeitos do aquecimento global, pulsa como centro económico e cultural global. A prevalência do sistema de patentes e propriedade intelectual como uma das grandes indústrias de futuro, contrabalançado por pequenos assomos de cultura aberta. Um futurismo ao mesmo tempo progressista e distópico, neoliberal quanto baste, onde as capacidades de inteligência dos robots levam a uma curiosa inversão dos direitos humanos. Se seres artificiais têm de conquistar a sua autonomia, o mesmo também se aplica aos naturais, o que implica que se um humano não tiver a sorte de ter pais com capacidade financeira para lhe adquirirem autonomia, estão condenados a ser servos sob contrato até poderem ser livres. Um pormenor maquiavélico num futurismo que extrapola muito bem muitas das tendências culturais e tecnológicas que vivemos hoje.
Misturem aos ingredientes piratas de propriedade intelectual especializados em engenharia reversível de biotecnologia, uma droga aditiva criada por um laboratório para fazer os trabalhadores concentrarem-se nas suas tarefas que tem efeitos secundários catastróficos, cientistas libertários e agentes ao serviço da polícia dos direitos de autor que se socorrem de todos os meios para intervir em casos de propriedade intelectual, com extremo prejuízo. E, claro, robots inteligentes com consciência de si próprios, entre propriedade dos sistemas ou autonomia. Para apimentar a coisa, há ainda casos tórridos entre humanos e robots que desenvolvem simulacros de sentimento.
Parece a receita para um excelente livro de ficção científica, mas apesar do esforço, Newitz não chega lá. As ideias que o sustentam são excelentes e bem trabalhadas, mas no essencial o livro é uma história de caça ao homem, em que saltitamos constantemente entre os pontos de vista da perseguida e do perseguidor. E nisso, torna-se uma leitura entediante. O ritmo é marcado mas não me agarrou como leitor, e o final em tom sacaroso (sem spoilers: todos têm finais felizes, quer os maus, quer os bons) não ajudou.