quarta-feira, 28 de dezembro de 2016
Babylon's Ashes
James S.A. Corey (2016). Babylon's Ashes. Londres: Orbit.
Tenho sentimentos mistos em relação a este livro. É, por um lado, mais um da série Expanse, em modo space opera, excitante, plausível, e a trazer o melhor da FC enquanto espectáculo ao leitor. Por outro, é mais um da série Expanse, às voltas com as intrigas e guerras entre os habitantes de um sistema solar divido entre a Terra, Marte, a constelação de estações espaciais, asteróides e luas habitadas que forma a Cintura, com alguns laivos da expansão humana para lá dos limites do sistema solar mediada pelos anéis-artefacto alienígena que nos limites do sistema permitem às naves humanas explorar outros sistemas estelares. Ou seja, a mesma história que a série conta desde o primeiro livro, tirando a rara excepção de Cibola Burn, uma espécie de western com biologia incompatível e artefactos alienígenas a colidir com os diferendos entre colonos e corporações num planeta extra-solar.
O irritante na série é que se sente sempre que enquanto mergulhamos nas intrigas bizantinas que culminam inevitavelmente em empolgantes batalhas espaciais, o mais interessante passa-nos ao lado. Não sei se a comparação é justa, mas imaginem o que seria o Senhor dos Anéis se fosse passado integralmente no Shire, centrado nas aventuras de um punhado de personagens que, com um pano de fundo de transformação, se dividem em conspirações e pequenas guerras de controlo territorial, com de quando em vez algumas sugestões de que algo muito maior se passa para lá da história, com Mordor, irmandade do anel e restantes peripécias. Este foco no colapso fraticida da humanidade tem merecido comparação com Game of Thrones, o que não é necessariamente um elogio, a menos que se seja mesmo fã de intrigas palacianas e se ligue pouco às possibilidades imaginárias levantadas por sistemas extra-solares, artefactos alienígenas e armas biológicas adormecidas num tempo em que a humanidade ainda era uma possibilidade celular nos oceanos da Terra primeva. Por muito interessante que seja o enredo da série Expanse, a maneira como não toca nos pormenores intrigantes que despertou logo nas primeiras páginas do primeiro livro, com os efeitos da protomolécula alienígena, focando-se apenas nas lutas políticas musculadas dentro do sistema, chega a ser desesperante.
Especialmente porque está muito bem montada e escrita. Os Corey mantém-se no campo da plausibilidade cientifica e técnica, com poucas concessões. Os artefactos alienígenas e os motores Epstein, capazes de acelerar naves a velocidades sub-lumínicas, são as poucas excepções numa narrativa onde o espaço é vasto, demora semanas ou meses a atravessar, os combates são travados não com lasers e escudos mágicos, mas armas cinéticas e variações orbitais de trajectória. Onde os projécteis de titânio dos canhões protectores das naves que não encontram o seu alvo estão condenados a seguir para sempre a sua trajectória no vácuo do espaço. Ou os efeitos da ausência de gravidade e radiações sobre o corpo são um dos elementos chave da narrativa. São estes pequenos pormenores que dão um valor especial à série.
Este sexto livro da série inicia-se à beira do apocalipse, com a Terra em escombros sob ataque constante de asteróides, lançados pela facção mais radical dos rebeldes libertários da Cintura. Donos de uma poderosa frota desviada à marinha espacial marciana que intitulam de Free Navy, com as Nações Unidas a lidar com o colapso do berço da humanidade, parecem prontos a dominar o sistema, travando a migração humana para lá do sistema solar. A descoberta de planetas habitáveis colocou em risco a sobrevivência das sociedades marciana e da cintura, motivando este ataque que desestabilizou o consenso entre as diferentes facções humanas. No entanto, o que resta da Terra e de Marte não deixam de ser forças poderosas, e a consolidação da Cintura pelos rebeldes da Free Navy colapsa graças à sede de poder do seu líder, cego perante a ruína económica e sistémica a médio prazo provocada pelas suas acções. O resultado é uma aliança estranha entre terrestres, marcianos e rebeldes, que lançam uma frota de reconquista das principais estações e asteróides da Cintura como manobra de distração para possibilitar que, com uma acção cirúrgica, Holden e os companheiros da nave Rocinante consigam conquistar a estação espacial que controla os portais de passagem para os sistemas exo-solares. A cegueira do líder dos rebeldes da Free Navy custar-lhe-á as suas conquistas e a própria vida, com a união entre as facções da humanidade a mostrar um novo caminho para os nativos da Cintura, já não os sobreviventes que arrancam a sua subsistência a minerar asteróides, mas como os únicos capazes de garantir a transição de exploradores e comércio entre os planetas colonizados.
Esperemos que a história fique por aqui, com este ponto final de triunvirato entre Terra, Marte e OPA que dá paz ao sistema solar. Ao longo livro os Corey vão largando algumas sugestões do que por aí virá, com algumas interferências de uma das novas colónias que se isolou e parece estar a construir uma base industrial e militar capaz de rivalizar com a do sistema solar, sem nunca anunciar as suas reais intenções. Parece ser por aqui que os autores vão seguir o caminho desta divertida e muito bem escrita Space Opera.