terça-feira, 10 de dezembro de 2024

We Had to Remove This Post


Hanna Bervoets (2021). We Had to Remove This Post. Nova Iorque: Houghton Mifflin Harcourt.

Esta curta e dura novela atinge-nos com um murro final no estômago. Olha para os efeitos psicológicos e emocionais de um dos trabalhos mais duros da economia digital, a moderação de conteúdos, através da história ficcional de uma jovem que trabalha nessa área, pensando que o que tem de lidar todos os dias não a afeta, até ao momento em que percebe até que ponto está irremediavelmente traumatizada.

É esse o enorme murro deste livro. Sabemos da dureza deste trabalho, da exposição contínua ao pior do ser humano, das métricas inflexíveis que obrigam a decisões rápidas e corretas. Dos baixos salários, longas horas e falta de qualquer apoio psicológico real aos que diariamente são expostos a conteúdos que podem ir dos mais patetas insultos à visão ao vivo de atos de violência extrema, sexualização e até morte. Tudo isso deixa marcas, e os traumas de quem tem de viver desta indústria são bem conhecidos. Fala-se pouco disso, como se o arrasar da psique de uma classe de trabalhadores fosse um preço aceitável a pagar pela manutenção dos espaços das redes sociais como algo relativamente limpo. Nós não queremos encarar o lixo que grassa por aí, e muito menos quem tem de o limpar.

A história é ficcional, mas constrói-se a partir de pesquisas e depoimentos de pessoas reais. E o que mais surpreende é o seu final. Passamos todo o livro a ser levados em crer que a história da espiral depressiva e traumática, contada pela personagem principal, se aplica à sua ex-companheira, também empregada numa empresa de moderação de conteúdos. Pensa-se estar a ler um testemunho de alguém que viu a saúde mental de um ente querido degradar-se pela exposição às teorias da conspiração e conteúdos violentos. Mas o final do livro leva-nos a perceber que foi a própria personagem a bater no fundo, a decair de jovem tranquila que só quer ter um meio de pagar contas a uma pessoa violenta, que não se apercebe da forma como age perante os outros. Alguém cuja visão do mundo foi corrompida pela exposição incessante e sem apoios ao pior da humanidade e que, no processo, perde a sua humanidade.