W.H. Pugmire (2013). Bohemians of Sesqua Valley. Arcane Wisdom Press.
É provável que não conheçam o vale de Sesqua e os seus estranhos habitantes. Também não conhecia, até a minha curiosidade ter sido desperta por um texto sobre W.H. Pugmire, o excêntrico criador deste mundo ficcional. Personalidade queer e quirky, claramente um apaixonado pelo horror na veia mais clássica, amante e seguidor da prosa lovecraftiana. De certa forma, é um escritor de segunda linha, o seu trabalho é assumidamente derivado do de Lovecraft, mas consegue escrever sem imitar diretamente ou em pastiche. Até porque, lendo as aventuras dos boémios habitantes do vale, depressa percebemos que a estrutura lovecraftiana está lá, quer como pano de fundo quer com referências diretas aos mythos de Cthulhu, mas a voz de Pugmire segue outros caminhos, de um terror mais bucólico e poético do que a rendilhada grandiloquência cósmica de Lovecraft.
Uma cidade isolada num vale do noroeste americano, talvez não muito longe da lovecraftiana Nova Inglaterra, no sopé de uma enorme montanha branca. Um local onde as barreiras entre realidades e sonhos são ténues, cujos habitantes não são completamente humanos. Um local que toca irremediavelmente as almas sensíveis que com ele se cruzam, quer deem com ele ao acaso, quer o procurem como parte de percursos no oculto. Um local onde os misteriosos deuses anciãos são venerados, e por vezes se manifestam.
Pugmire vai entretecendo a cidade e o seu mundo através de pequenos contos, geralmente sobre pessoas estranhas à cidade que lá chegam e se descobrem transformadas pelas interações com os seus mistérios. Ao longo das histórias, vai aprofundando o pequeno mundo de Sesqua, com misteriosas personagens recorrentes que se revelam os pilares da comunidade fantástica. Pilares, embora no sentido de guardiães de segredos que, apesar da sua aparência amigável, não hesitam em eliminar estranhos para não perturbar a vida da comunidade. No entanto, mesmo andando pelos caminhos do terror, há uma forte ausência de violência nestas histórias, por vezes é intuída, mas o terror espreita nos feéricos segredos da cidade e não nas ações específicas dos personagens.
A influência lovecraftiana é perene, mas Pugmire tem voz própria, uma voz muito calma, onde a grandiloquência cósmica do seu mentor se transmuta num bucolismo de mistérios. As suas histórias são tranquilas, feitas de interações e fascínios pelos mundos de sonho que se ocultam nas franjas do real.