Esta semana, destacamos o balanço do trabalho de Nehisi-Coates em Black Panther, curtas de BD portuguesa, e a presciência quase preditiva de J.G. Ballard. Fala-se de usar o GPT-3 para programar em linguagem natural, dos níveis de autonomia automóvel, e de prováveis ataques de drones autónomos a humanos. Ainda se reflete sobre a eterna promessa falhada do equilíbrio entre trabalho e vida, das bactérias que limpam obras de arte, e das histórias dos amantes da história de Lisboa. Outras leituras vos aguardam, nas Capturas desta semana.
Ficção Científica e Cultura Pop
On The Stroke Of The Hour: Pulp clássico.
X-Men's Brood Are What Brood X Nightmares Are Made Of: The Brood, uma espécie alienígena de insetos agressivos que se expande pelas galáxias num frenesi de consumo. Uma das ameaças recorrentes de X-Men, que copia a estética e lógica dos monstros de Alien, até mesmo na parte de serem instrumentalizados como arma por terceiros. Muito similares, mas com diferenças suficientes para evitar problemas de direitos de autor. É típico, na cultura pop.
1979 concepts for the never-built Rockwell Star-Raker: Há que adorar os conceitos de aeronave espacial.
O que É Natural: Adorei a ilustração desta curta BD de duas pranchas, originalmente publicada na Cais. De facto, o que é natural é ultrapassar preconceitos.
What Ta-Nehisi Coates Did For Black Panther: Foi de facto uma excelente temporada como argumentista. O Washington Post mergulha a fundo, analisa a primeira metade em que Coates revê o mito da nação negra progressista, avançada e nunca colonizada como tendo pés de barro, e a segunda metade, em que pega na ideia e a leva, literalmente, às estrelas.
Gene Szafran, “All the Gods of Eisernon,” 1973: Há que admirar o foguetão pronto a descolar, sem infraestrutura de suporte.
Hitting the Books: Sci-fi strategies may be needed to stave off climate change: Como responder aos problemas trazidos pelo aquecimento global? Algumas estratégias requerem o tipo de pensamento antecipatório divergente que é especialidade da Ficção Científica.
The Sandman: Neil Gaiman Has Zero F*cks to Give Death, Desire Pushback: Confesso que fui daqueles que ficou boquiaberto quando vi a escolha de casting para a personagem Death. Que, quem conhecer os comics sabe bem isto, tem como iconografia o ser visualizada como uma goth girl. De rapariga gótica a afro vão universos de distância, mas Gaiman justifica a escolha com a capacidade de encarnar a personalidade do personagem. O que até faz sentido, na fantástica e clássica série da DC Vertigo, estes Endless (Morte, Desejo, Destino, Sonho, Guerra, Desespero, e, claro, o Sonho que dá mote a toda a série) são encarnações de conceitos abstratos - ou seja, a forma como nós os vemos, e não como realmente seriam. Pessoalmente, vou sentir saudades da Morte como rapariga gótica. Quanto a ver a série, nem por isso, não por desgostos ou desagrados, mas porque retirei a televisão da minha dieta mediática, o meu foco é mesmo literário. Quando ao choque por a personagem Desire ser não binária, bem, caros, ide ler o comic, ide... que é um dos portentos da banda desenhada dos anos 90.
Black Panther Writer Ta-Nehisi Coates Wants Better for Creators Bringing These Stories to Life: Nehisi Coates é um anacronismo no mundo dos comics. Escritor, jornalista e ensaísta, escreveu muito sobre política e herança afro-americana. No entanto, tinha como um dos seus sonhos escrever argumentos de comics para a Marvel. Encerrou neste momento uma temporada muito interessante de Black Panther, que começou com um olhar para a noção de estado e acaba com space opera, e continua a fazer um trabalho interessante em Captain America, indo ao cerne do personagem. Aqui, infelizmente, muito mal acompanhado em termos gráficos, a série merecia um melhor ilustrador.
Why on Earth did Amazon spend $8 billion on a zombie studio?: Não me interessam particularmente os movimentos de negócios da indústria dos media, agora com o streaming a ditar a direção. O intrigante é perceber que estes investimentos não são feitos para aproveitar know how, mas sim propriedade intelectual prévia, que será posteriormente espremida ao máximo.
75 Nonfiction Books You Should Read This Summer: Ui, nem a ler dois ou três livros por dia se esgotava esta lista... mas há ali propostas interessantes, nos campos da tecnologia. E uma nova biografia de Pessoa e seus heterónimos.
Jack Gaughan: Clássico e retro.
How Did a Censored Writer from the 1970s Predict the Future with Such Uncanny Accuracy? Bem, uma imprecisão. Ballard dificilmente pode ser considerado um escritor censurado, pese embora as reações a Atrocity Exhibition. Quanto à sua capacidade preditiva, Ballard sempre foi um observador do confronto entre as pulsões da psique e a tecnologia. É, praticamente, o grande tema da sua obra. Por isso, ler que nos anos 70 antecipou o nosso gosto contemporâneo por procurar fama nas redes sociais, a rapidez com que as ideias viralizam, ou a informação em rede, não correspondem a predições oraculares sobre o nosso presente. As tendências que Ballard identifica sempre existiram. Se as consideramos predições, estamos a confundir o que são ferramentas e adereços, com os impulsos humanos que nos levam a desenvolver e usar estas tecnologias e comportamentos. O digital apenas amplifica o que sempre existiu na alma humana.
Tecnologia
Microsoft uses GPT-3 to let you code in natural language: Em direção a um futuro em que se possa programar sem ter de aprender a sintaxes de linguagens de programação, embora tenha de se conhecer a lógica de programação. Usando implementações do GPT-3, a Microsoft está a desenvolver produtos que permite criar programas descrevendo a sua função em linguagem natural. O algoritmo interpreta, e converte para código.
Fragility Of The Web: When All Those Hyperlinks Expire: A internet é ao mesmo tempo um vasto arquivo, e um eterno agora, um fluxo de momentos fugazes. Mas quando se quer memorializar, catalogar, manter registos históricos, depressa se percebe a facilidade com que muito do conhecimento disponível na internet se perde. Servidores avariam, serviços fecham, recursos são apagados. E com isso perdem-se textos, imagens, enfim, conhecimento. O linkrot é a praga da sociedade da informação.
Amazon: Overworked Warehouse Employees Can Go Reflect in the Despair Closet: Como melhorar o bem estar dos funcionários? Com condições de trabalho mais humanizadas? Não. Cabines de meditação. É o que dá quando o pior do capitalismo predatório automatizado por algoritmos se cruza com a tretologia do mindfulness.
AI is learning how to create itself: Algoritmos que se treinam e programam a si próprios? Bem, não é ainda a AGI, mas é sem dúvida mais um passo nessa direção.
The Many Levels Of Autonomous Motoring: Do que é que falamos quando falamos sobre veículos autónomos? É um pouco mais do que carros que andam sozinhos. A autonomia é definida por cinco diferentes níveis, e só no último é que de facto a condução é totalmente autónoma, em todas as condições. Por enquanto, mesmo os mais avançados projetos estão à volta do nível 2.
Mass Media Shapes Our Values & Innovations like Artificial Intelligence: Não é grande novidade. Sempre que discuto sobre IA nas minhas formações para professores, inevitavelmente alguém puxa do exemplo do robot Sophia, e lá tenho eu que desmontar a ideia de que um boneco animatrónico seja uma forma de vida artificial. Mas essa ideia é a que os media veiculam.
Data isn't oil, so what is it?: A metáfora dos dados enquanto petróleo talvez não seja a mais adequada, observa este ensaio. Tendo em conta que os dados que alimentam a economia digital são fundamentalmente baseados no comportamento individual, talvez a questão seja que os dados, são as nossas vidas.
Israel's operation against Hamas was the world's first AI war: Intrigante. Na mais recente iteração do interminável (e irresolvível) conflito israelo-palestiniano, a escolha dos alvos por parte das forças israelitas usou ativamente algoritmos de inteligência artificial.
Google reportedly made it difficult for smartphone users to find privacy settings: Não há aqui grande novidade. É a isto que se chama dark patterns - a ofuscação intencional do que deveria ser simples e direto, para manipular o comportamento do utilizador.
Relógio Tetris com ESP32: Construir um relógio que dá as horas com números que formam a partir das peças do clássico Tetris? E porque não? Alguma montagem, soldadura e programação necessárias.
Think Big At Virtual Maker Faire Galicia 2021: O destaque dado pela Make: à Maker Faire Galicia, que irá decorrer de 2 a 6 de junho em Santiago de Compostela, mas em modo virtual e acessível a todo o mundo. Um extenso programa de demonstrações, apresentações de projetos, conferências e workshops, com um foco especial na educação. Pessoalmente estou muito contente por ter lá os meus alunos com os seus projetos, e poder dinamizar um workshop sobre telemóveis, 3D e pensamento computacional. Vai ser interessante... o meu castelhano falado é inexiste.
The age of killer robots may have already begun: Preocupante, mas não inesperado. Análises ainda não confirmadas a ações militares na guerra civil líbia apontam para que um drone tenha agido de forma autónoma contra combatentes, tendo sido programado para voar sobre zonas de combate e atacar eventuais alvos sem ligação a supervisores humanos. Na verdade, isto é um parágrafo de um extenso relatório sobre a situação caótica no território, e os indícios do envolvimento de países terceiros no fornecimento de sistemas de armas em contravenção às leis internacionais: https://undocs.org/S/2021/229.
Modernidade
How the Covid pandemic ends: Scientists look to the past to see the future: Da pandemia à endemia, entre o historial de pandemias passadas, o papel da vacinação, e a forma como a fisiologia humana acaba por acomodar alguns tipos de vírus.
U.S. Soldiers Accidentally Leaked Nuclear Weapons Secrets Online: Report: Escrever apontamentos daquilo que se quer memorizar e depois esquecer-mo-nos deles algures, quem nunca? Se bem que neste caso, os apontamentos eram sobre códigos e procedimentos de uso de armas nucleares. De facto, um grande oops.
The Future Of Work Will Be Five-Hour Days, A Four-Day Workweek And Flexible Staggered Schedules.: Lol. Deixem-me repetir, lol. Estas ideias são giras, mas estamos em 2021 e cada vez mais longe da sociedade de equilíbrio entre tempo livre e trabalho prometido que os teóricos da economia tanto prometem desde os anos 70. Trabalha-se mais horas, e com mais precariedade. É doce, pensar que o futuro do trabalho é laborar 5 horas por dia, mas na verdade o que estamos a ver é que o futuro do trabalho é andar entre o limiar da pobreza a prestar serviços para plataformas.
Olissipógrafos, os que amam Lisboa… e a estudam – a BD: Um artigo duplamente interessante, pela curta BD que nos fala daqueles que estudam a história de Lisboa (e escrevo isto mesmo que, pessoalmente, não aprecie o traço de Nuno Saraiva), mas essencialmente pelo projeto de coligir e reeditar em livro eletrónico obras que olharam para a cidade que Lisboa foi.
The Specialized Bacteria Cleaning Michelangelo’s Masterpieces: Esta é inesperada, usar bactérias para limpar os mármores das esculturas clássicas.