Descobri coisas que desconhecia. Alfred, o eterno mordomo de Batman (pelo menos até Tom King o ter morto, mas nos comics as mortes raramente são finais), começou por ser um comic-relief na época mais clássica, como um gorducho e desastrado inglês com a mania que é detetive. Mas foi sendo melhorado, ganhando novas dimensões, de tutor do jovem Bruce Wayne a um passado nos serviços secretos e forças especiais. Agora percebo a versão Alfred de Warren Ellis em The Batman's Grave, ao mesmo tempo um mordomo especialista em operações secretas com extremo prejuízo e um sentido de humor corrosivo, vénia às raízes do personagem.
A evolução é registada em várias histórias, dos clássicos Bob Kane e Bill Finger aos argumentistas como Gerry Conway que realmente deram a Batman o seu peso icónico. Contém uma das mais deliciosas histórias de Batman de sempre, escrita por Tom King, um conto de natal de humor fino onde Alfred salva um cão traumatizado pelo Joker, animal violento que ninguém acredita ser domesticável, ensinando-o pacientemente a conviver com os humanos, até se tornar um fiel amigo do Cavaleiro Negro. A história termina na noite de natal, com Batman a trocar prendas com Alfred, perguntando-lhe porque é que o mordomo não lhe ofereceu uma prenda, enquanto afaga o cão tranquilo. "World greatest detective indeed", resmunga Alfred, perante a incapacidade de Batman em perceber a prenda que verdadeiramente recebeu. Há mais boas histórias a descobrir neste volume dedicado a uma das mais icónicas personagens secundárias dos comics.
Justin Giampaoli, Andrea Mutti (2020). Starship Down. Milwaukie: Dark Horse Comics.
Uma antropóloga é convocada para uma missão secreta, que reúne militares de várias nações e até um cardeal do Vaticano. Numa mina siberiana, foi feita uma descoberta que irá mudar o destino da humanidade: uma nave alienígena, contendo corpos neandertais em animação suspensa. A análise aos seus sistemas revela que a humanidade na Terra teve origem em experiências genéticas de uma civilização alienígena, que procurava espalhar-se e sair do seu mundo natal ameaçado por colapso.
Boa premissa, ilustração competente, mas um desastroso desenvolvimento narrativo. A história é incoerente, evoluindo de forma abrupta. Há conspirações que não se desenvolvem, um bizarro salto entre operação secreta e revelação que se torna normalizada.
Joe Quesada (2007). Daredevil: Father. Nova Iorque: Marvel.
O peso do legado dos pais é a inspiração para este mergulho na origem de Daredevil. A memória do seu pai sempre pesou na mitografia do personagem. Mas outros legados ficam em evidência nesta história. A de um ativista milionário que também funda um grupo de vigilantes para limpar o seu bairro do crime, tal como Daredevil o faz em Hell's Kitchen. Este milionário mantém publicamente o legado positivo do pai, morto violentamente por criminosos, embora saiba que o real legado foi um de corrupção. Os cruzamentos entre estes dois heróis serão sempre amargos. Já Daredevil terá ainda de enfrentar um misterioso assassino em série, que se parece especializar em matar e tirar os olhos a ex-clientes da firma de advogados de Matt Murdock, a identidade secreta de Daredevil. Uma ameaça que lhe está mais próxima do que suspeita, na forma de uma cliente que quer processar uma empresa poluidora pelo cancro que lhe provocou. Essa mulher é a assassina, mas os seus motivos prendem-se com o passado: é obcecada por Matt Murdock, desde que este, quando era rapaz, salvou o seu pai cego de ser atropelado na rua. O que permitiu ao homem continuar a sua longa história de abuso sexual sobre a filha. A história do cego salvo é exatamente a da origem de Daredevil. Uma intrigante variação sobre as origens de um personagem marcante.