terça-feira, 8 de dezembro de 2015
Interzone #260
Uma edição excelente da Interzone, a contrabalançar as anteriores que não se distinguiram acima da mediania. Dois veteranos, Shirley e Noon, colocam a fasquia elevada mas os contos dos autores menos experientes, não atingindo a excelência dos veteranos, também não lhes ficam muito atrás em termos de qualidade literária, conceito e ideias que intrigam o leitor.
Weedkiller, John Shirley: Um conto impecável do veterano escritor cyberpunk. Num futurismo próximo distópico, elementos considerados improdutivos ou inúteis para a ordem financeira são caçados e eliminados, usando as crises ambientais e económicas para justificar o extermínio dos socialmente indesejáveis. A ironia dos sacrifícios individuais em nome do bem geral é uma clara alusão ao discurso de crise neoliberal.
Blonde, Priya Sharma: Uma bem montada e aterrorizante variante do conto de fadas. Aqui, Rapunzel é uma rapariga mantida numa mansão por uma madrasta fiel, que usa os seus cabelos loiros para enriquecer, vendendo-os a cabeleireiros. Sharma reconta a lenda com toques de contemporaneidade deprimida, revendo a lenda sob perspectivas de vitimização e libertação.
No Rez, Jeff Noon: Por debaixo do fortíssimo experimentalismo linguístico do autor, há uma história de FC pura sobre um futuro improvável em que trocamos a visão do real pelo virtual, onde a afluência se mede em pixels e se murmura que há um mundo para além da resolução, um real mais vívido do que as mais requintadas virtualidades em alta resolução. Uma fabulosa experiência de leitura, para os que sejam capazes de desenvolver empatia com técnicas narrativas experimentais, e com um final memorável, com um personagem a perder os implantes oculares que lhe davam acesso ao mundo virtual e acordar para uma realidade onde tudo, as ruas, os edifícios, as roupas, a sinalética, está coberto pelo azul que permite a sobreposição do virtual sobre o real.
Murder on the Laplacian Express, C.A. Hawksmoor: Por detrás do título a fazer vénias a Agatha Christie está um conto feérico, homenagem aos tempos mais simples do passado da FC. Aqueles tempos onde a ciência ainda não tinha destruído a ilusão que os planetas do sistema solar poderiam ser habitáveis e estariam repletos de vida exótica, quando as histórias de aventuras no espaço traziam o espírito de fantasia das aventuras na selva para os conflitos interplanetários. O conto vale precisamente pela forma descontraída como aborda esta nostalgia pela ficção científica do passado.
The Spin of Stars, Christine Gholson: Um pouco de southern gothic para encerrar a Interzone, num conto que nos transporta aos mistérios que vivem nos pântanos dos Everglades floridianos.