segunda-feira, 7 de setembro de 2015
Comics
Material #04: Aposto que muitos escritores adorariam responder assim às questões mais intrusivas de alguns fãs. Este comic de Ales Kot distingue-se pela sua modernidade, apesar de não ser ainda aparente a forma como as quatro linhas narrativas se vão cruzar. A mais meta-texual e intrigante é a do filósofo envelhecido que está a servir de olhos para uma inteligência artificial conseguir experimentar a percepção humana. Mas as restantes não lhe ficam atrás. Há o sobrevivente de Guantánamo que se envolve com uma dominatrix e tem uma esposa que apesar de boa muçulmana recusa-se a não estar em pé de igualdade com o marido no que toca à sexualidade e sentimentos. O jovem afro-americano que caça polícias corruptos numa revolta inteligente inspirada no movimento Black Lives Matter. Já a linha do realizador de cinema dividido entre arte e comercialismo e da actriz inexperiente que escolhe como musa é a que mais se afasta das restantes. Por si só, é um comic interessante, especialmente para os admiradores da filosofia de Virilio, Baudrillard e Debord ou fãs das edições da Zero Books. Sabem ao que me refiro. Amantes de especulações obscuras que tentam fazer sentido de uma modernidade inquietante. Resta-nos esperar pelo ponto de colisão das linhas narrativas.
Providence #04: Se estão à espera de um susto ou monstruosidade a salta da próxima vinheta, desenganem-se. Um dos elementos mais interessantes deste revisitar por Alan Moore da obra de Lovecraft é a forma está a manter e construir um progressivo sentimento de pavor sem recorrer a sustos. É suspense puro, e uma abordagem enciclopédica que interliga os seus contos mais influentes.
We Stand On Guard #03: Apesar de fazerem lembrar haunebus, estas naves de combate são uma alusão directa a essa outra narrativa de guerra futura que foi Buck Rogers, com as cidades flutuantes mongóis a sobrevoar uma América invadida e subjugada. Se não reconhecerem esta visão de Buck Rogers recomendo a leitura de Armageddon 2419 AD de Philip Nowlan e as primeiras tiras de banda desenhada, cujas imagens de cidades flutuantes são muito similares às naves desta vinheta. We Stand On Guard pareceu ser uma bizarria bem humorada, com a ideia implausível de um Canadá invadido pelos EUA. Mas estamos a falar de Brian K Vaughn, argumentista de peso que sabe olhar para o futurismo. Se a vénia a um clássico da guerra futura, subgénero da FC, está lá, quer na iconografia quer na ideia de uma força avassaladora que reduz o norte da américa a cinzas, há mais elementos incómodos. A resposta ao porquê da invasão é-nos dada nesta edição, com o desvio de recursos hídricos canadianos para fazer face à desertificação dos EUA. Esta é também a edição em que Vaughn antevê as horríficas possibilidades da realidade virtual enquanto instrumento de tortura.