segunda-feira, 8 de outubro de 2012

On The Beach



Nevil Shute (2000). On The Beach. Thirsk: House of Stratus.

É uma tarefa ingrata. Não é tarefa fácil imaginar o impensável na época em que os cientistas atómicos andavam felizes da vida a rebentar bombas para perceber quais os estragos possíveis, ainda longe das teorias sobre o inverno nuclear e sem cair na ideia feita de andrajosos sobreviventes que sucumbem à fome e feridas múltiplas por entre as ruínas radioactivas da civilização ocidental. O notável neste livro é que tudo se fina numa calmaria enorme, longo contraponto de resignação após breves dias de loucura que aniquilaram o hemisfério norte numa chuva de bombas nucleares.

Shute nunca é muito claro sobre o que terá acontecido. Cria uma narrativa histórica a partir de conflitos regionais que por engano escalavam ao hemisfério norte. Trocas de bombas entre a União Soviética e a China, bombardeiros egípcios que arrasam Nova Iorque sob um cogumelo atómico, resposta americana com mísseis disparados para a Rússia, inevitável arrasar do continente europeu... é difuso, intencionalmente. O autor diz-nos que após o facto, pouco mais interessa. A extinção da humanidade torna inúteis as quezílias históricas.

Se o hemisfério sul é poupado à aniquilação imediata pelas bombas, não escapa à morte invisível e silenciosa trazida sob um manto de radioactividade que se espalha metodicamente sobre o planeta. Resta aos sobreviventes viver os seus últimos meses numa normalidade que é progressivamente erodida. É aqui que Shute surpreende. Não há histerias nem revoltas, apenas uma resignação que se traduz em aceitação e ir vivendo o dia a dia até à chegada inexorável da onda de radioactividade. A extinção da humanidade, com fleuma britânica.

De facto, o livro assemelha-se a uma longa novela onde pessoas normais vivem a sua vida banal, num cenário em que a terra onde vivem vai desaparecendo progressivamente debaixo de uma maré invisível. Os detalhes são sempre difusos, ficam sempre por uma perda de contacto que foge à tragédia humana. Os personagens - um oficial da marinha australiana, um comandante do que se torna o último submarino nuclear americano, um cientista que estuda os efeitos da radioactividade e os seus familiares aceitam o destino inelutável e seguem os procedimentos e regras sociais até ao tranquilo fim.

On The Beach vai-se lendo e não nos toca até aos parágrafos finais, em que assistimos ao suicídio colectivo dos personagens através de cápsulas providencialmente fornecidas por um governo previdente. É impossível não sentir uma certa tristeza. Se se lê este livro pelo que é - uma relíquia da era atómica, uma obra que fora dos limites sensacionalistas da FC da altura se atrevia a perguntar o que aconteceria "se os nossos responsáveis políticos perdessem a cabeça e libertassem a energia da fissão atómica contida nas cada vez mais incontáveis armas nucleares", terminamos com uma forte sensação de depressão. O final é previsível, mas não por isso menos triste.