sábado, 28 de fevereiro de 2009
Media, Technology and Society
Brian Winston (2005).Media, Technology and Society. Nova Yorque: Routledge
Temos uma fé quase inabalável nos saltos de progresso tecnológico. Cada nova maravilha da ciência aplicada parece abrir novas possibilidades, novos e maravilhosos equipamentos para alterar os nossos padrões de vida.
Brian Winston não segue esta linha de pensamento tecnofetichista. Apoiado num conhecimento enciclopédico da histórias das tecnologias, pinta um quadro muito diferente da adopção de novas tecnologias do normalmente pintado pelos tecno-utopistas. Não se trata de uma visão catastrofista como as de Virilio ou Weizenbaum; antes, é uma visão realista, que encara a tecnologia em duas vertentes - a tecnológica em si, e a do mercado que as utiliza e estimula, ou aniquila.
A tese de Winston é a de que há um ciclo bem definido na adopção de uma nova tecnologia. Em primeiro lugar, assiste-se ao período de deslumbramento que se segue à invenção de uma nova tecnologia. É o momento em que uma solução procura os seus problemas, altura em que as empresas de nova tecnologia se lançam ao mercado com produtos bem definidos mas que não respondem às necessidades presentes, uma vez que as necessidades que a nova tecnologia poderia suprir ainda não são sentidas. Winston ilustra esta fase com o exemplo das calculadoras mecânicas, conhecidas e criadas desde os tempos do iluminismo mas cuja utilização só realmente se desenvolveram com o surgir das corporações empresariais como entidades jurídicas, que criaram a necessidade de mecanização do espaço do escritório.
A adopção da nova tecnologia raramente segue o padrão apregoado pelos defensores dessa tecnologia. O computador, ferramenta indispensável no nosso dia a dia, mal ia sobrevivendo à sua invenção. Apenas o desenvolvimento das armas atómicas, criando a necessidade de potentes cálculos matemáticos deu o sopro que permitiu à indústria desenvolver-se e eventualmente chegar à era dos entusiastas que construiram a computação como hoje a conhecemos.
Segue-se um período particularmente litigioso, que Winston apelida de lei de supressão de uma tecnologia ou potencial tecnológico. Uma nova tecnologia é ao mesmo tempo uma oportunidade e uma ameaça - oportunidade para novos usos e novas estruturas económicas, e uma ameaça às estruturas económicas instituídas. Aqui, os exemplos máximos estão no desenvolvimento do telefone e da rádio, com fortes litígios em tribunal e movimentos de mercado bolsista que fariam empalidecer os tubarões da nova economia de hoje, e da televisão. A aplicação destas tecnologias foi deliberamente protelada e condicionada por poderes económicos que viam na nova tecnologia uma legítima ameaça à sua sobrevivência.
No periodo seguinte assistimos ao que Winston chama de período de supressão do potencial radical. É altura de limar as arestas da tecnologia, não para a tonar mais eficaz ou avançada mas sim mais de acordo com as estruturas económicas convencionais. Aqui, a história dos telefones, com a sua tradição de monopólios estatais e empresariais é o exemplo máximo de supressão de potencial radical. Num dos muito exemplos que Winston cita encontramos um que nos é particularmente interessante: a dificuldade em fazer chamadas telefónicas de grupo não é uma limitação da tecnologia mas sim uma imposição das primeiras empresas de telefonia e telegrafia para maximizar os seus lucros (e é o nicho que as empresas de voz sobre IP tão bem exploram).
Muitas tecnologias promissoras não atingem o seu potencial graças a esta interferência decisiva das forças da economia. Winston dá-nos como exemplo máximo o fax, existente desde os anos 50 mas ainda hoje uma tecnologia sub-utilizada e que está a ser nulificada pela internet.
Quanto à internet em si, Winston não lhe atribui qualquer do potencial revolucionário que normalmente lhe atribuímos. Antes, Wilson prefere demonstrar que o verdadeiro potencial revolucionário se encontra na rede - essa sim, a verdadeira força transformadora. A Internet é apenas a mais recente tecnologia a fazer uso do potencial da rede, tal como em tempos anteriores o telégrafo, o telefone, a rádio e a televisão. No entanto, o texto original de Winston data de 1998, altura em que a Internet estava quase a tornar-se a força tecnológica avassaladora que hoje é. Hoje, Winston talvez reconhecesse que o carácter libertário da web permite ultrapassar as tentativas de supressão do potencial tecnológico (se algo é possível alguém num qualquer recanto obscuro da internet estáa trabalhar activamente para isso) - e utilizasse as guerra jurídicas sobre propriedade intelectual como o exemplo contemporâneo de como uma indústria ameaçada por uma nova tecnologia utiliza o seu ainda considerável peso financeiro para asfixiar a nova tecnologia. As empresas de telegrafia utilizaram a mesmíssima táctica contra as nascentes empresas de telefones no século XIX.
A tese de Winston é contraditória com as correntes teses de deslumbramento tecnológico que postulam o valor do empreendedorismo no trazer para os mercados de produtos tecnologicamente avançados, num ciclo que se renova continuamente. Antes, aponta para o papel catalizador das forças conservadoras de mercado na supressão e domesticação do potencial das tecnologias. E fá-lo de uma forma enciclopédica, expondo a sua tese alicerçando-a numa minuciosa exploração da história das tecnologias e dos media.