sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Sexta...

... final da semana. O dia inicia-se na EB1, onde vou prestar apoio informático. Não é uma obrigação - as EB1s estão sob alçada municipal e há um técnico de informática que as visita regularmente, mas como coordenador tic de um agrupamento quero fazer sentir a minha presença junto das outras escolas, para lá da sede de agrupamento. Não vou lá arranjar computadores, não posso nem devo pela questão da divisão de competências, mas vou ajudar presencialmente para responder a questões e instalar aplicações de utilidade pedagógica que normalmente escapam ao radar dos técnicos de informática - jogos educativos, multimédia, aplicações gráficas e o open office 3, uma vez que até outubro a escola estava a funcionar com o open office 1. O plano era instalar um conjunto de aplicações nas quinze máquinas da sala de informática, mas como é normal mal consegui passar das cinco. Não por lentidão mas porque surgem sempre outros pedidos e pequenos problemas a resolver. Também instalei o pacote pedagógico (GCompris, Sebran, VLC, Inkscape, Gimp, OpenOffice 3, Childsplay, TuxPaint, SuperTuxCart, SuperTux, TORCS e ArtRage) em pcs "novos" doados por encarregados de educação. Uma delícia, instalar aplicações em pcs pentium a correr o Windows 2000. Dá para colocar leituras em dia. Mas a coisa está nos eixos: ao chegar à EB1, fui saudado por uma professora que, entusiasmada, me relatou que instalou algumas das aplicações que deixei nos pcs da escola noutros computadores. Para quem está de fora pode parecer um pormenor pouco significativo, mas uma grande maioria dos professores sofre de um grande temor face à tecnologia. É recompensador ver os medos a desaparecer.

Tenho uma posição ambivalente no que respeita à doação de computadores para as escolas. Por um lado, é uma boa forma de equipar as escolas e representa um sinal muito positivo de envolvimento da comunidade (encarregados de educação e empresas) na escola que é de aplaudir. Por outro, representa uma forte dor de cabeça a muito curto prazo, pois são máquinas antigas e desactualizadas que correm com dificuldade aplicações mais recentes, com maior risco de falha de hardware a curto prazo. Como gestor de um parque informático envelhecido, conheço bem as chatices que máquinas com muitos anos de uso dão. Pessoalmente, prefiro esperar, embora sentado, pela chuva de máquinas prometida pelo Plano Tecnológico. Como este é um ano de eleições, algo me diz que muito em breve as escolas começarão a receber novos equipamentos. Mas longe de mim desdenhar as máquinas doadas, por respeito aos doadores e consciência de que são uma forma de dar mais oportunidades de uso das TI às crianças. No caso da EB1, gosto particularmente do facto destas máquinas terem sido colocadas em locais de acesso directo pelas crianças.

Regressar à sede de agrupamento para a hora de tutoria. Atrasei-me porque o projector da sala TIC teimava em não desligar. Compreende-se: sobreaqueceu, devido à acumulação de pó no filtro. Problema resolvido, como muitos espirros. O aluno da tutoria tem um trabalho de pesquisa para realizar, que para grande surpresa minha realizou com colegas. Pelos vistos funciona, a minha estratégia suavizadora de socialização de uma criança com predisposição para descontrole que, percebi quando o meu trabalho deixou o âmbito de direcção de turma e se tornou de acompanhamento, é uma criança isolada e sem amigos da mesma idade. O meu trabalho não tem passado tanto por tarefas específicas, optei por falar e ouvir. Por vezes nós, professores, sofremos com a cegueira das aprendizagens medíveis por desempenhos. Mas será isso o que é realmente importante na formação de um ser humano?

Leve irritação com os alunos que frequentam o espaço dos computadores. Optei por permitir a utilização de jogos de computador (uma excelente forma de me manter actualizado) mas o gosto tornou-se febre, com alguns miudos a fazer fila à porta da sala e discussões sobre quem deve estar ou não nos computadores. Dava menos chatice proibir os jogos, mas há chatices que gosto de ter. Expliquei-lhes que jogar, ali, era um privilégio e não um direito, e que para o manterem tinham de cumprir as regras impostas. Senão... adeus jogos. Às vezes é preciso ser-se autoritário. Durante breves momentos libertei o engenheiro sócrates que há em mim.

Regressado do almoço, boas notícias: chegou um pacote da atinformática. Devem ter dado pelo erro crasso da pen de reposição do sistema operativo do magalhães que me enviaram novinha em folha, pronta a estrear e sem qualquer bit de sistema operativo. Não me enganei: nova pen, com os quatro virgula qualquer coisa gigas de reposição do magalhães. Fiquei contente. Não só tenho a reposição disponível, como poupei trinta longos minutos de chamada em espera para a linha de apoio.

A ultima aula promete ser um desastre. Esqueci-me de reservar portáteis e a sala TIC está ocupada. O que é que eu faço com a minha pior turma numa aula que é a última de sexta-feira num dia chuvoso (dias que qualquer professor sabe que não são fáceis)? Fui, literalmente, salvo pelo gongo. A dois minutos da aula começar noto que os portáteis requisitados pelos outros professores estavam a ser devolvidos.

À semelhança da outra turma, o trabalho a desenvolver é um video. Um dos grupos já tem o texto de pesquisa alinhavado e está com vontade de gravar a voz. Os restantes afinavam os textos e pesquisavam videos no YouTube (esta é daquelas que faço mesmo por pirraça, para mostrar que as visões convencionais sobre os perigos de certos sites, exacerbadas pelo jornalismo-choque das televisões, são infundadas). Um portátil, um microfone, o audacity e alguns pedidos estratégicos de silêncio (bem... berros, mas berros simpáticos e bem humorados). Sentei-me com o grupo e gravei com eles os primeiros clips de voz. Ao fim de três, levantei-me e disse-lhes para se desenrascarem com o resto da gravação. Afastei-me e fiquei a vê-los a manipular o audacity e a gravarem voz com todo o cuidado, exportando os ficheiros para wav. Nada mau. Em meia hora aprenderam a manipular a voz, a gravar audio no computador e a manipular os gráficos da onda sonora. Quando a aula terminou não queriam arrumar porque faltava gravar mais um clip de voz.

Quatro e vinte. A escola esvazia-se e silencia-se. Altura de ir tratar da actualização do site da escola. Quatro textos a compor, um dos quais me vai meter em sarilhos: o anuncio que a reposição do magalhães já está disponível. Estou a imaginar filas à porta da escola... avisei que a reposição é um ultimo recurso e que não nos reponsabilizamos por perda de dados (porque "reposição" é um nome pomposo para "reformatação"). Como não planeio tornar-me técnico pro bono ao serviço da JP Sá Couto, avisei também que a iniciativa se restringe à reposição, não envolve problemas com virus ou outras dores de cabeça digitais. Estou a cumprir uma das imposições da CRIE/ERTE sobre os coordenadores tic, a que muitos se recusam, e com razão. Mas não consigo deixar de pensar em servir a comunidade onde trabalho. (Hmm. Isto tem um som pomposo. Ignorem.)

Para não variar, a hora de saída da escola ultrapassou largamente a hora prevista no horário. Quando saio, a escuridão paira sobre a vila. Chove. Não há iluminação pública. Por razões que a minha própria razão desconhece, fujo à monotonia da A21 e regresso à Ericeira pela estrada nacional. Longa viagem pela escuridão da estrada, num silêncio entrecortado pelo ruído do motor e da chuva a bater nos vidros do carro. O auto-rádio fritou os fusiveis à umas semanas...