sexta-feira, 30 de março de 2007

Naqueles tempos é que era...

David Soares, talentoso escritor de tenebrosos contos de horror, está mesmo muito irritado com a história do Salazar como grande português. Isso, e mais uns pormenores recentes da vida política, como a busca do inenarrável PNR pelas luzes da ribalta através da afixação de cartazes ilegais. Mas em vez de se ficar pelas lamúrias ou pelos comentários, David Soares meteu mãos à obra, dedicando o seu blog a uma semana muito anti-fascista. Leiam os seus posts Cinco Minutos com Salazar, Nachlass e Mnémonica e... arrepiem-se.

Para os meus leitores que, como eu, são professores e lidam todos os dias com o resultado de cinco décadas de obscurantismo sob a forma de alunos e suas famílias que não têm a mínima noção da importância da aplicação nos estudos, deixo aqui estas citações que nos vai arrepiar, pois representa tudo aquilo contra qual lutamos, e que também nos fará perceber o quanto, em trinta anos, conseguimos avançar, tendo em conta que em 74 partimos de um ponto de partida que era menos do que o ponto zero.

"Saber ler para acreditar cegamente no que dizem certos jornais e certas publicações? Saber ler para fazer a cultura do ódio entre os homens e do ódio entre as classes? Saber ler para saber até que ponto vai a práctica e a ciência do mal? Pergunto: vale a pena saber ler para isto?"

"Ensinai aos vossos filhos o trabalho, ensinai às vossas filhas a modéstia, ensinai a todos a virtude da economia. E se não poderdes fazer deles santos, fazei ao menos deles cristãos."

"Se todos souberem ler, a instrução desvaloriza-se."

Tudo palavras daquele que os consumidores àvidos da televisão consideraram o maior português de todos os tempos, daquele de quem muitos ainda hoje ainda dizem "que nos tempos dele era tudo melhor". Palavras que já cheguei a ouvir da boca de pessoas da minha geração, o que é simplesmente aterrorizante.

É com ideias que se combatem ideias. É com a luz que se combate a trevas e o obscurantismo. Estes posts, e aqueles que certamente se seguirão, são uma leitura obrigatória para combater a desinformação complacente de um ambiente mediático subordinado às necessidades financeiras, um ambiente mediático que substituiu eficazmente a isenção pelo espectáculo. Os meus parabéns a David Soares por ousar fazer aquilo a que ninguém hoje se dá ao trabalho: combater fogo com fogo.