sexta-feira, 19 de janeiro de 2007

A Quarta Aliança



La Cuarta Alianza

Gonzalo Giner, A Quarta Aliança, Editora Ulisseia, 2006

Se algum mérito há no estrondoso sucesso que foi o Código DaVinci foi o de trazer para a ribalta um subgénero de ficção, a ficção histórica. Após o sucesso do livro de Dan Brown, as prateleiras encheram-se de obras que exploram de forma ficcionada várias facetas do nosso passado, com especial incidência para aquelas facetas que envolvam pretensos mistérios e segredos do passado que possam interferir com o nosso futuro. Entrem numa livraria, atentem aos escaparates das novidades, e depressa se conseguirão aperceber da quantidade de obras do género lançadas no mercado por editores sedentos de aproveitar a onda do grande romance de sucesso.

São livros fascinantes, cujas capas cuidadosamente ilustradas prometem estranhas revelações que podem transformar a nossa percepção do mundo. Os temas sucedem-se - temos as inúmeras variações sobre as conspirações templárias, as maquinações das seitas religiosas banidas para o lado mais obscuro da história, os segredos esotéricos das sociedades secretas que pretensamente manipulam os mecanismos do mundo. Desconheço se andam por aí livros às voltas com o anitgo egipto, os illuminati ou talvez a atlântida. Mas estes temas andam um bocadinho batidos. Precisamos de novas conspirações para nos excitar a imaginação.

É inegável que estas obras despertam a atenção e espicaçam a curiosidade. Como forma de leitura escapista, são a leitura da moda, divertida, leve e intrigante. Não se chateiem, podia ser pior. Recordam-se da moda da inenarrável literatura light? Pelo menos estes romances conspiratórios põem os neurónios a funcionar.

Infelizmente, este A Quarta Aliança não é uma das melhores obras para representar o género. A premissa é interessante - um romance passado em dois tempos, girando à volta de uma conspiração de seguidores da seira essénia infiltrados nos templários que procuram juntar três peças de joalharia que simbolizavam as três alianças que deus estabeleceu com os homens - a pulseira de moisés, o medalhão de abraão e os brincos da virgem maria. A reunião das três jóias num local especial - uma igreja octogonal templária em Espanha - traria um novo mundo, uma quarta aliança entre deus e os homens. Durante séculos, os elementos ocultos da seita essénia tentaram tudo para reunir as jóias. No meio de tudo isto, um pacato joalheiro madrileno envolve-se nas conspirações após descobrir uma estranha herança familiar.

O que dá algum interesse a este livro são os pormenores históricos e os voos de imaginação conspiratória, infelizmente atascados numa prosa amadorística que se dispersa e caracteriza muito vagamente as situações do livro. Pondo as coisas noutros termos, ler este livro fez-me recordar os textos produzidos pelos meus alunos nas aulas em que eu abordo escrita criativa. Só que os meus alunos têm em média dez e onze anos...

O autor tenta manter o nosso interesse em três níveis - explorando o passado, no mundo dos templários, onde só falha pela estranha modernidade do modo como caracteriza as suas personagens; no presente, através dos poeirentos segredos desvendados pelas investigações sobre o estranho património do joalheiro, pormenores pouco convicentes mas que nos fazem dobrar a página com alguma curiosidade sobre que segredo poeirento será descoberto a seguir; e a um nível mais intimista, explorando as relações indecisamente amorosas entre o joalheiro e duas mulheres fundamentais para a história, num tom classificável entre os mais românticos devaneios adolescentes.

O final do livro mostra como uma boa ideia pode descarrilar. A conclusão da conspiração reúne os três artefactos, dando início à quarta aliança a que alude o título. Mas para a aliança se efectuar, a humanidade tem de ser purificada de forma cataclísmica, mergulhando o mundo num apocalipse purificador. Há aqui pano para mangas, a sugerir desde já um tratamento exagerado, over the top (como a série Left Behind, ou pelo menos um condizente tom apocalíptico. Infelizmente, para apocalipse, a coisa é tão levezinha que mal se dá por ela.

É pena que A Quarta Aliança sofra destes males. Os conceitos sobre os quais a obra assenta são fascinantes, mas a técnica de escrita poderia ter beneficiado de uns olhares sobre o ombro do autor para lhe sugerir alterações e refinamentos. Em suma, de um bom editor.

Como nota final, não posso deixar de referir como este livro me veio parar às mãos - através da moda dos brindes dos jornais e revistas, que atingiu proporções inimagináveis no esforço de marketing. Desta vez, é a revista Sábado - um clone anódino da Visão, por sua vez um clone anódino da Time - que publica uma colecção de livros gratuitos de ficção às voltas com o mistério da história. O que me deixa com uma pergunta no ar: no meio de tanta colecção, de tanta obra editada, quando é que algum editor de jornal ou revista se lembra de juntar à publicação uma colecção de obras de ficção científica?