A Espiral Dourada, Nuno Crato, Luís Tirapicos, Carlos Santos, Gradiva, 2006
Gradiva | A Espiral Dourada
Wikipédia | Proporção Áurea
Wikipédia | Número de Fibonacci
Goste-se ou não, o que é inegável é que o Código da Vinci é um enorme sucesso. Gerou polémicas, gerou opiniões, gerou celeumas. Enfim, there is no such thing as bad publicity, dizem os entendidos. Mas o Código da Vinci também gerou toneladas de livros que andam às voltas com os mais ou menos polémicos conceitos esotéricos e gnósticos do livro. Uns apoiam as teorias, outros desacreditam-nas, outros tentam ir mais além. Enfim, o que é certo é que a quantidade de livros que este fenómeno gerou dava bem para encher umas bibliotecas de tamanho médio.
Se os conhecimentos ocultos são o que faz sucesso nas publicações à volta do Código, pouco se fala nos conhecimentos matemáticos, científicos e de história de arte presentes no livro. E é nesta lacuna que se insere este A Espiral Dourada, escrito a três mãos por Luís Tirapicos, Carlos Santos e Nuno Crato, famoso nos nossos meios pelas suas críticas às prosápias educativas. Dois cientistas e um jornalista de divulgação científica juntaram-se para desvendar os segredos matemáticos do Código da Vinci. Não falam de nada de novo - apenas contextualizam os clássicos números de Fibonacci, analisam os trânsitos de Vénus debaixo da afirmação de que estes representam um pentagrama nos céus, introduzem-nos à criptografia e desmontam o mito da proporção dourada, uma constante matemática que muitos querem ver a influenciar directamente as mais belas obras de arte.
Aqui a minha experiência artística leva-me a concordar com os autores. A chamada razão de ouro, a proporção divina, tem vindo a ser apontada como factor estruturante em obras tão díspares como as pirâmides egípcias, os templos gregos e a pintura renascentista. Mas quem olha, geralmente vê aquilo que quer... é certo e sabido que o posicionamento de formas numa superfície plana (traduzindo, a pintura) respeita regras de percepção visual que não são muitas vezes aparentes. Nestes jogos, a perspectiva é o elemento mais fácilmente identificável; mas qualquer artista, quer realista quer abstracto posiciona formas de uma maneira mais ou menos intuitiva no espaço da tela ou da folha respeitado regras relacionadas com o peso visual dos objectos, com a exploração do espaço negativo, com a relação forma-fundo e com o direccionar do olhar na leitura do quadro. Ou então, consciente destas regras, desrespeita-as intencionalmente.
O fundamental é perceber que isto é intuitivo - o acto de criação não se faz espartilhado por estas regras, embora mais tarde possa haver uma adaptação. É por isso um erro olhar para uma obra de arte e ver nela uma aplicação deliberada da regra de ouro - porque aquelas obras que foram deliberadamente criadas como aplicação destas regras são, geralmente, entediantes e irrelevantes. O acto de criação é intuitivo, e enriquecido pelo conhecimento destas regras, não espartilhado por elas.
A Espiral Dourada é um livrinho que se lê bem, recordando ou ensinando fragmentos culturais curiosos sobre matemática, geometria, ciências e arte. E aproveita o fenómeno em código para nos mostrar alguns dos verdadeiros códigos da natureza.