terça-feira, 9 de maio de 2006

Narnia

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As Crónicas de Narnia - O Sobrinho do Mágico, de C. S. Lewis, Editorial Presença

Editorial Presença | Crónicas de Narnia
Narnia World
Wikipedia | The Chronicles of Narnia

Publicado originalmente em 1955, O Sobrinho do Mágico representa o primeiro volume, em ordem cronológica, da série de livros infantis da autoria de C. S. Lewis que descreve as aventuras de crianças que passam além deste mundo até Narnia, um mundo de fantasia onde os animais falam e se trava uma batalha constante entre o bem e o mal. As Crónicas de Narnia são um dos grandes clássicos da literatura infanto-juvenil anglo saxónica. As obras literarárias, publicadas nos anos 50, ainda hoje despertam encantos, fazem a imaginação levantar voo e deixam sonhos de mundos imaginários cheios de aventuras promissoras em paisagens de maravilha.

Dizer que O Sobrinho do Mágico é o primeiro livro da série é controverso. Na realidade, o primeiro livro a ser escrito e publicado por C. S. Lewis, que introduziu o mundo literário às terras mágicas de Narnia é O Leão, A Feiticeira e o Guarda-Roupa, recentemente adaptado para cinema pelos estúdios Disney numa tentativa de superar a excelência cinematográfica de O Senhor dos Anéis. Esta primeira publicação gerou toda a fama da série Narnia, com um conjunto de sequelas que nasceram da inspiração de C. S. Lewis e, de certa maneira, terminam com este O Sobrinho do Mágico, onde se conta toda a história da criação de Narnia e onde, no fundo, se desvenda tudo o que fica por desvender em O Leão, A Feiticeira e o Guarda-Roupa. Este artifício de escrever obras com uma ordem de publicação diferente da ordem cronológica é comum às boas obras literárias de fantasia. Há medida que o autor vai "explorando" o mundo fantástico que criou, lhe vai adicionando novas histórias, personagens e paisagens fictícias, o mundo evolui de uma forma desregrada mas profundamente natural. Tolkien, o grande senhor da literatura fantástica, fez o mesmo com as suas obras. Após publicar O Hobbitt e os três livros de O Senhor dos Anéis, trabalhou o seu quase ilegível Silmarillion, com todas as histórias e mitologias a que tinha aludido nos livros anteriores. Numa leitura cronológica da obra de Tolkien, o Silmarillion é o primeiro livro a ser lido, mas isso é algo pouco recomendável. A densidade da obra, que é no fundo uma exploração dos mitos de criação da Terra Média, não a deixa ao mesmo nível da simplicidade quase mágica de O Hobbitt nem da grandiosidade mítica de O Senhor dos Anéis. Passa-se algo semelhante com este O Sobrinho do Mágico. Tenho a certeza que quando ler O Leão, A Feiticeira e o Guarda-Roupa não sentirei o impacto que sentiria se o lesse sem rede, sem saber o que é Narnia, sem saber que paisagens fantásticas me esperam por entre as páginas do livro.

O Sobrinho do Mágico conta-nos as aventuras de Polly e Digory, dois amigos que através das suas brincadeiras acabam por correr algum perigo quando são forçados a passar para lá deste mundo até outros mundos paralelos ao nosso, onde a magia reina, suprema. Digory é o sobrinho de um mago (que me desculpem os tradutores, mas eu traduzo magicianpor mago e não por mágico) bastante cobarde que sabe que detém a chave para outros mundos, mas não é capaz de ele próprio os explorar. Consegue assim, através de um estratagema, enviar Digory e a sua amiga Polly para os outros mundos, onde numa sucessão de estranhas aventuras, libertam uma feiticeira malvada de um encantamento milenar e assistem à criação de Narnia, um ermo desolado, um não-espaço que se gera enquanto Aslan, o leão, canta a sua canção de criação.

C. S. Lewis partilhava com Tolkien os encontros de uma sociedade de escritores fantasistas que se reunia na casa de Lewis para discutir as suas obras. É nessas reuniões que podemos encontrar a génese da Terra Média de Tolkien e a génese de Narnia, mas compará-las é um erro. Enquanto a obra de Tolkien vai beber às fontes da mitologia nórdica, grega e cristã para criar uma nova saga, uma ficção que se lê como uma lenda, C. S. Lewis, indo beber às mesmas fontes, cria uma pérola literária, uma obra de simplicidade com que os seus leitores cedo se identificam. No fim de contas, C. S. Lewis escreveu Narnia para um público infantil. Se a obra de Tolkien se destaca pelo fabulos ecossistema que cria, a de Lewis distingue-se pela textura linguística. Ao ler este volume das Crónicas de Narnia, fiquei fascinado pela simplicidade poética que cada frase detém. Neste livro, não há frases descritivas secas, que nos levam de parágrafo em parágrafo, mas sim frases pensadas, que nos forçam a ler mais devagar, saboreando as palavras. Só isto já vale bem a leitura deste livro. A vida e a literatura estão cheias de riquezas, de ideias conflituosas, de coisas boas e coisas más. De ideias teneborosas e voos feéricos de sonho. Ler Narnia é soltar as asas da imaginação daquela criança que ainda reside, e resiste, dentro de nós.