Quem gosta da Ericeira mas não vive cá pensa sempre que a Ericeira é uma bucólica vila piscatória com um clima muito especial, terra de crepúsculos grandiosos, verões fresquinhos e céus azuis. A Ericeira tem uma imagem de sonho, feita de mar, sol e surf, e é assim que quem só a vê ao fim de semana ou nas férias a julga.
Quem cá vive, sabe bem que a Ericeira é uma terra como as outras. À beira do mar, escondem-se os mesmos problemas e os mesmos dramas que existem noutras localidades. A Ericeira sofre de uma expansão urbanística que coloca pressões tremendas sobre os recursos naturais, e as tensões de uma população composta por filhos da terra, recém chegados que fogem ao bulício e aos problemas das zonas suburbanas e uma população heterogénea de emigrantes na sua maioria de origem brasileira.
Por isso não me surpreendo com o que aconteceu ao Turmentus, companheiro de lutas e tertúlias. É enfurecedor que tal possa acontecer na nossa Ericeira, terra em que escolhemos viver porque quem conhece a Ericeira, apaixona-se por ela. Aos tipos que assaltaram o carro, creio que o destino mais apropriado era serem amarrados e atirados para dentro dos buracos das furnas na maré alta. Deixaram o carro, é certo; mas para pessoas que trabalham, muito e honestamente, a perda de documentos é trágica. Quanto aos agentes da lei que tão competentemente tomaram conta da ocorrência, um lembrete: não há campanhas de boas vontades ou declarações públicas de boas intenções que vos valham, se nos momentos em que os cidadãos mais precisam de vós não são capazes de, pelo menos, fazer um atendimento correcto.
Por vezes pergunto-me se vale a pena ser honesto em Portugal. No país em que os publicamente corruptos são eleitos para cargos públicos, o cidadão honesto e cumpridor da lei é forçado a uma verdadeira penitência digna da inquisição sempre que precisa da ajuda das forças policiais que supostamente existem para servir os cidadãos.