terça-feira, 28 de fevereiro de 2006

Três Dias

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O carnaval, essa época de transgressões públicas, alegres desfiles e loucura institucionalizada... O carnaval é, e sempre foi, uma época de catarse. O carnaval é a interrupção do inverno frio, em que a alegria e as traquinices funcionam como uma forma de canalizar todas as emoções encobertas pelo cinzento do inverno. Após meses miseráveis de chuva e frio, o carnaval representa três dias em que todas as energias psíquicas acumuladas fluem livremente. Este aspecto de catarse foi necessário durante séculos. Perfeitamente assumidas pelos romanos, as catarses carnavalescas foram toleradas pela mais sóbria cristandade como uma forma segura de extravasar as emoções animalescas que normalmente seriam proibidas.cá por mim, a verdadeira alegria do carnaval é que me permite ter umas mini-férias de três dias. Outra vantagem não lhe descortino. Para perceberem o porquê deste meu espírito tão pouco carnavalesco, deixo-vos aqui uma série de razões para ficarem a gostar do carnaval.

Um dos pormenores mais arrepiantes do carnaval é a música. Carnaval, cá pelos nossos lados, equivale a samba e ao que de pior se faz na música brasileira. Durante estes dias, a música pimba importada do brasil faz furor. Ouve-se nas ruas, nas casas, nas paradas e desfiles, nos bares. É simplesmente inescapável. O sofrimento auditivo daqueles que como eu abominam os ritmos básicos e as gritarias arrepiantes dos sons do brasil é verdadeiramente atroz.

A influência brasileira nos nossos carnavais tem-se traduzido no abandono dos carnavais tradicionais, substituidos por desfiles carnavalescos encabeçados por actores das telenovelas da moda. Os carros alegóricos são seguidos de manadas de gorduchinhas portuguesas que sacolejam as suas banhas em fatos minúsculos ao melhor estilo do carnaval brasileiro, repletos de soutiens e cuequinhas cheias de lantejolas e apenas com algumas penas coloridas para proteger as suas peles branquinhas do frio. O inverno português não é como o verão brasileiro, como fica demonstrado pelo frio que estas estóicas folionas (existirá este termo?) passam, enquanto se sonham morenas a desfilar por um qualquer sambódromo do lado de lá do atlântico.

A tendência mais estranha do carnaval português é a estranha mania que se apossessa grande parte dos homens portugueses. Machos assumidos, de pêlo no peito, alguns ainda com tatuagens guiné 1972 amor de mãe e com saudáveis atitudes homofóbicas durante todo o ano, durante estes três dias vão roubar as roupas e as maquilhagens às mulheres e desfilam pelas ruas pefeitamente transvestidos. Os homens lusos, machos inabaláveis que passam um ano inteiro a gabar-se da sua potência e a lançar impropérios contra as paneleirices e afins, durante três dias percorrem as ruas em mini-saias, cintos de ligas e decotes generosos echidos à custa de muito papel. Entretanto, as suas mulheres imaginam-se esculturais e bronzeadas e desfilam pelas ruas quase vestidas com vestígios de lantejoulas. Haverá aqui algum desejo escondido na psique mais profunda do homem português que vem ao de cima nestes três dias?