Os leitores mais atentos ao post em que eu imaginava um apocalpise zombie em fátima poderão ficar surpreendidos: o que é que a dúvida cartesiana tem a ver com os infernos? Na verdade, enganei-me. Queria ter antes escrito o dilema de Pascal.
Blaise Pascal foi um grande matemático e filósofo francês que dedicou a segunda metade da sua vida à filosofia religiosa com um carácter quase místico. É o autor das Meditações, um livrinho cheio de postulados sobre o acreditar em deus e ter fé. Como é que um matemático que inventou uma das primeira calculadoras mecânicas se vira para o misticismo? Pensou, pensou, e concluiu que o sentimento religioso assentava num paradoxo: se deus não existe, não existem céus nem infernos, não existe alma e não há qualquer diferença entre viver uma vida virtuosa e uma vida dissoluta. No momento da morte, tudo se acaba. Nada se ganha nem nada se perde. Mas a possibilidade de deus existir muda tudo: a vida virtuosa será recompensada com os céus, e a vida dissoluta com os infernos. Não há maneira de sabermos se deus existe ou não. Só o saberemos no momento da nossa morte. De maneira que para Pascal a fé religiosa tornou-se uma aposta: se apostarmos em deus, e vivermos uma vida virtuosa, se ele existir ganhamos o céu. Se não existir, não perdemos nada. Ao apostar numa vida dissoluta, se deus não existir nada ganhamos, é certo. Mas se deus existir, ganhamos uma eternidade de sofrimentos no inferno. Para Pascal, a aposta correcta era na existência de deus. Se deus não existir, não perdemos; se deus existir, ganhamos.
É um ponto de vista bizarro, mas com uma lógica implacável. Mesmo assim, não sou homem de apostas, e continuo-me ateu.