terça-feira, 21 de fevereiro de 2006

Concrete Island

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Wikipedia | J. G. Ballard
J. G. Ballard's Book Reviews
Through the Crash Barrier: J. G. Ballard's Conrete Island

J. G. Ballard é conhecido entre nós pela obra-prima que é Crash, uma confluência apocalíptica entre tecnologia, sexualidade e o vazio dos frios espaços urbanos. A carreira deste escritor de culto iniciou-se nos anos setenta, época em que Ballard se dsitinguiu como uma das mais interessantes vozes da British New Wave, um grupo de escritores de ficção científica que revolucionaram este campo literário. Ao longo de uma vasta obra que começa na FC mas evolui para uma confluência de literatura pura, ficção científica e uma visão muito pessoal sobre o que constitui a realidade, Ballard disseca, sem nos poupar pormenores, os jogos de ideias que estão subjacentes à nossa realidade, à nossa sociedade e às nossas visões sobre o mundo. Ballard retrata um mundo em que a psique humana, distorcida porque esvaziada de pontos de apoio e referências, se degladia com a implacabilidade de uma tecnologia fria criada por homens que numa tentativa de buscarem a transcedência do humano se descobrem vazios, com uma necessidade imperiosa de preencher o vazio das suas almas com obsessões e novos rituais que retomam o lugar dos antigos rituais perdidos com o desenvolvimento científico e tecnológico.

Concrete Island explora um não-espaço, um espaço que nos rodeia permanentemente mas que é invisível aos nossos olhos. Em todos os pontos de confluência das nossas estradas e vias rápidas, símbolos de um progresso que avança a uma velocidade inabalável, encontramos espaços como os descritos em Concrete Island. Tratam-se daqueles terrenos baldios que estão na confluência entre a geometria fria das estradas, entre cruzamentos, ao centro de rotundas, entre as vias de acesso, as passagens superiores e a via rápida. São os espaços invisíveis entre as veias e as artérias do nosso sangue motorizado da cor do petróleo. Estes espaços são invisíveis, não-espaços, não porque não existam, mas porque nunca reparamos neles. Honestamente, quem é que repara nos troços de estrada abandonada por entre as ervas daninhas que crescem entre as estradas permanentemente percorridas por veículos com violentos vectores de velocidade?

Com uma precisão que abandona a adjectivação literária e abraça a frieza da linguagem jornalística, J. G. Ballard descreve o acidente rodoviário que atira o jaguar de Maitland, um arquitecto afluente dividido entre uma mulher indiferente, uma amante ocasional e um emprego em que os seus colaboradores estão habituados aos seus regulares desaparecimentos, para o centro de uma ilha no meio da confluência de auto-estradas. Maitland, um Robinson Crusoe moderno, afunda-se cada vez mais na sua ilha rodeada de automóveis, há medida que se confronta com as suas psicoses e motivações interiores. O fluxo de tráfego é permanente, funcionando para Maitland como um oceano inatravessável. A sua psicologia impede-o de criar uma jangada que deixe sair da ilha onde naufragou.

Maitland não está só. Enquanto assistimos à sua progressiva degradação física e mental, em que a personagem estabelece sempre como um objectivo cada vez mais longínquo a saída da ilha e o regresso à sua vida normal, assistimos também ao choque com os outros habitantes desta ilha deserta no meio da cidade - Proctor, um ex-acrobata com deficiências mentais, e Jane, que talvez seja uma prostituta, e que para Maitland encerra o segredo de como sair da ilha.

Concrete Island é um romance em que a super-civilizada figura do arquitecto, o grande mestre dos tempos modernos, decai para um barbarismo primário enquanto tenta reclamar com sua uma ilha baldia no meio de um mar de trânsito imparável. Irónico e avassalador, Concrete Island ressoa com a linguagem extremamente visual de Ballard, escritor cujas palavras têm o dom de gerar imagens cristalinas na mente do leitor.