segunda-feira, 26 de dezembro de 2005

Natal, por fim

O fim do natal traz sempre consigo uma fortíssima dose de nostalgia. Depois da correria da procura consumista de prendas, depois dos excessos alimentares da consoada em família, depois da troca de prendas de simbologia pervertida nestes tempos em que temos fácil acesso a tudo, depois do suave mornar do dia de natal, fica sempre um gostinho nostálgico a natais passados. As memórias dos natais da nossa infância, mágicos como tudo o era nesses tempos passados, ressurgem com força na nossa mente, fazendo-nos ansiar pelos tempos em que tudo era mais simples. Uma idade de ouro, por assim dizer.

(Se alguém achar que esta minha descrença nas loucuras natalícias se deve a um desgosto com as prendas dadas, desengane-se: melhor prenda que a minha, os quartetos de corda completos de Dimitri Shostakovich, não houve.)

O momento mais curioso da noite de natal foi o da troca de prendas. Enquanto os mais novos se dedicavam a trocar as prendas sentados no sofá da sala, os mais velhos conversavam animados à volta da mesa cheia de comida e garrafas, algumas vazias e outras ainda nem por isso. Ao sair da cozinha e entrar na sala, estendem-me uma prendinha embrulhada em papel vermelho. Ao olhar para ela, percebi algo de muito importante. Olhei para o embrulho, e pensei cá com os meus botões que me estava perfeitamente nas tintas para o conteúdo do embrulho, que me estava perfeitamente nas tintas para a entrega da prenda. Olhei para os meus pais e para os pais da minha rapariga, animadíssimos no convívio, e percebi que aquilo que tinha realmente valor era o que se estava a passar à volta da mesa. As pessoas, juntas, a partilhar um momento. Tudo o resto, as prendinhas, os presépios, as toneladas de decorações farsolas made in china que atravancam as casas, as ruas e os locais de trabalho não passam de pálidas imitações do verdadeiro espírito de natal, um espírito que nada tem a ver com o natal mas sim com o melhor do que a espécie humana tem para oferecer.