quarta-feira, 21 de dezembro de 2005

Mais uma vitória na guerra das ideias.

BBC | Victors hail US evolution ruling

Há uns tempos atrás deixei aqui um artigo sobre um grupo de pais na américa que moveu um processo em tribunal ao conselho escolar da sua localidade. O motivo prendia-se com a defesa, da parte do conselho escolar, de que o design inteligente, uma visão creacionista sobre a evolução das espécies perfeitamente absurda e defendida apenas pelos fundamentalistas cristãos (sim, eles existem, e se não se fazem rebentar com coletes cheios de bombas também tentam aterrorizar a sociedade numa guerra de ideias). Acontece que o tribunal deu razão aos pais. Foi uma vitória do conhecimento científico na guerra contra as trevas religiosas, num país onde essa guerra é tão importante que cientistas de renome dedicam boa parte do seu tempo a promover debates e conferências na américa profunda contra as patranhas defendidas pelos alucinados que acreditam piamente nas palavras, letras e pontuação da bíblia.

E cá entre nós, seria possível uma situação semelhante? À partida, não; os programas das disciplinas são definidos pelo ministério da educação, que apesar dos seus muitos defeitos é perfeitamente claro nos programas de conteúdos disciplinares que implementa. No entanto, casos como a recente guerra de palavras às voltas com os crucifixos na sala de aula deixam-me a pensar... com o alastrar do obscurantismo religioso representado pelas seitas neo-católicas que engordam a olhos vistos, não é de desacartar a hipótese de num futuro talvez mais próximo do que isso uma destas seitas se dedicar a tentar convencer o ministério da educação de que a visão científica da evolução das espécies é um mero ponto de vista, tão importante quanto a visão creacionista (que não diz deus criou o mundo mas diz a evolução é sinal de que existe uma inteligência a controlar a evolução das espécies, o que no fundo é a mesma coisa). Geralmente não nos preocupamos, olhando para as seitas como associações de cretinos e mentecaptos que estão a ser vigarizados por alguns líderes religiosos que utilizam os dízimos e esmolas dos seus fieis para financiar iates, aviões privados e chorudas contas bancárias, tudo em nome de deus.

Há poucos anos atrás, quando era director de turma da pior turma de 5º ano da escola de Mafra, tinha uma aluna de origem suiça que pertencia à seita evangélica. O avô dessa rapariga, um suiço culto e inteligente, vinha bastantes vezes à escola falar comigo sobre o desempenho da aluna. De todos os encarregados de educação, ele era o único que se distinguia, por um ponto: enquanto as mamãs e as avós dos meninos e meninas passavam o tempo na sala de espera na coscuvilhice, ele passava o tempo a ler. A ler livros, não a ler jornais desportivos. Uma vez, tremi quando o vi entrar. Reparei que trazia debaixo do braço um livro sobre o design inteligente. Sendo ele o mesmo tipo que se queixara da docente de língua portuguesa, que em desespero de causa para tentar motivar os alunos utilizara excertos do Harry Potter, alegando que a docente ensinara feitiçaria na sala de aula, o que era contrário ao espírito religioso que incutia na neta, pensei logo que me vinha perguntar porque é que não era ensinada nas aulas de ciências aquilo que os fanáticos religiosos consideram a outra alternativa à teoria da evolução das espécies. Felizmente, não o fez.

Este pode parecer um problema inexistente. Mas eles andam por aí...