Ontem terminaram mais umas eleições legislativas. O resulato era previsível - vitória do PS, com maioria absoluta, e derrota do PSD e do PP.
Boas notícias.
Santana Lopes, uma curiosa nulidade de língua afiada a condizer com forte vacuidade mental, desapareceu do radar. Políticamente, está morto, e espero que brevemente o enterrem.
Como não sou especialmente messianista nem sebastianista, não espero no Sócrates um salvador da pátria. Sabendo que os governos, hoje, são essencialmente governos de gestão, submetidos às conjunturas sócio-económicas, às directivas da UE e aos orçamentos e planos plurianuais, apenas espero do PS uma gestão cuidada. Talvez, à luz da história recente, uma esperança utópica...
Mais boas notícias. O CDS/PP sempre foi um partido que vivia acima das suas possibilidades, e exercia uma influência vastamente superior ao seu real poder. Mas os demolidores resultados para a direita destas eleições estão a levar à demissão do Paulo Portas. Como o PP sempre viveu (e se tornou "partido de estado") a partir do carisma do Portas, o PP sem portas irá reduzir-se a mesquinhas lutas internas e a uma posição na vida política equivalente à sua real nulidade. Não há aí grande perda.
Outra boa notícia: o meu voto contribuiu para uma subida em flecha do Bloco de Esquerda. Longe vão os tempos em que o BE disputou (e perdeu) um mísero deputado com o PSD. Agora estão lá oito bem seguros, e se continuarem a trabalhar bem, mais se seguirão. A esquerda moderna, intelectual e em sintonia com o século XXI, está a chegar ao poder. E o PCP está a perder as suas oportunidades, mantendo-se como se mantém na sua arqueológica posição campesino-proletária. Embora isso não lhe retire influência nem importância histórica.
Sempre fui um péssimo jogador de xadrês. A falta de paciência sempre se impôs sempre que me vejo frente a um tabuleiro. Mas mesmo se fosse um bom xadrezista, nunca jogaria contra o Presidente da República. Com jogadas e manobras subtis e seguras, Jorge Sampaio conseguiu cilindrar o PSD (lembrem-se que ele é do PS), eliminar Santana Lopes, limpar o PS e criar condições para o PS ter a sua maior vitória eleitoral de sempre.
Como? Vejamos:
A corrente crise política foi despoletada pela nomeação de Durão Barroso para a presidência da comissão europeia. Todos o criticam por isso, apelidando a atitude de fuga e "tachismo".Eu não partilho dessa opinião - a comissão europeia é o governo de facto da união europeia, e tem poder supra-nacional. Ao nível mundial, dos grandes jogos políticos, diplomáticos e económicos, é a comissão europeia que dá cartas, não os governos nacionais. Ter um português como presidente da comissão europeia é honroso e prestigiante. Não o perceber significa esquecer-se de que há um mundo para além das fronteiras portuguesas.
Após a demissão de Durão Barroso, o Presidente da república tomou a decisão mais contestada da sua carreira: manter o status quo político, mantendo o partido vencedor das últimas eleições (o PSD) no poder, o que permitiu a ascensão de Santana Lopes. Isto com a justificação da legalidade e contra a vontade de todos, que queriam eleições antecipadas. Mas eleições antecipadas pouco iriam resolver. Na altura, os partidos de direita detinham os votos. E o PS estava sob a liderança de Ferro Rodrigues, líder desacreditado pela sua presença nos governos de Guterres e pelos escândalos a envolverem-no no escândalo Casa Pia. O PS dificilmente chegaria a governo. Contra quase todos, o PR esperou. Deixou Santana Lopes enterrar-se mais, a cada dia que passava no governo. Os media, os jornais e as televisões, estavam ao rubro com cada vez mais críticas à actuação e incompetência do governo. E Ferro Rodrigues, percebendo a decisão do presidente como uma ofensa pessoal, demite-se da liderança do PS, abrindo caminho ao mais carísmático e acarinhado Sócrates. Meses depois, perante mais um sinal de incoerência e desgoverno, quando todos já estavam bem fartos do PSD, o Presidente demite o governo, e convoca as presentes eleições, que terminaram com este resultado inédito para o PS. Tudo isto, sem perder a imagem e a credibilidade, aparentando estar acima das tricas políticas.
Jogada de mestre. Xeque-mate.