terça-feira, 28 de novembro de 2023

The Afghanistan Papers


Craig Whitlock (2021). The Afghanistan Papers: A Secret History of the War. Nova Iorque: Simon & Schuster.

Se se surpreenderam pela rapidez com que o regime afegão colapsou quando os americanos se retiraram do país, este livro explica bem o porquê. Quando os Estados Unidos decidiram retirar-se do pais e colocar um ponto final numa guerra que durou vinte anos, as estimativas mais pessimistas apontavam para alguns meses para que os talibans derrubassem o governo afegão. Na verdade, o colapso foi tão súbito que o governo caiu durante as últimas semanas da retirada americana, com os talibans a controlar o país enquanto o exército supostamente bem treinado e no qual foram investidos milhões em material se eclipsava sem resistência. E todos recordamos o horrendo caos no aeroporto de Kabul nos últimos dias, com multidões de afegãos dispostos a tudo para fugir do país, porque sabiam bem o destino que os esperava sob o governo dos mullahs. 

Como é que isto foi possível? Como é que em vinte anos de operações militares, não foi possível derrotar os ultraconservadores islâmicos e dar os passos para uma democracia funcional e começar a retirar o país do seu ambiente medievalista? Essencialmente, através de uma série de erros crassos, de estratégias com pouco sustento na realidade do terreno, de puro desconhecimento da cultura, da confiança excessiva em senhores da guerra considerados como parceiros, mas que noutros países seriam meros criminosos. E, como demonstra este livro, um clima constante de sofismas que disfarçava os falhanços sob uma retórica de vitória e estabilização no terreno.

A sequência de erros é alucinante, e fica no ar a pergunta de como é que políticos, militares e analistas supostamente bem treinados e competentes conseguem persistir durante décadas em erros estratégicos que se medem em vidas perdidas, e num impressionante derreter de dinheiro. Fica-se com a impressão que estando a máquina montada, era considerada imparável e tinha de se manter a qualquer custo. 

Desde apaparicar líderes corruptos a promover iniciativas de combate à produção de  ópio cujo efeito era aumentar a produção, investir em infraestruturas civis e tecnológicas que os afegãos não tinham capacidade de operar (há uma deliciosa sobre uma esquadra de polícia construída que os polícias afegãos que a iam usar não sabiam como abrir as portas), treinar forças armadas que eram notáveis pela sua ineficiência, a lista é enorme. E se se perguntam como um país pode preferir um regime de religiosos medievalistas, isso percebe-se porque as alternativas supostamente democráticas eram piores, os talibans eram vistos pelas populações como confiáveis face à rapacidade e desmandos dos senhores da guerra. O resto, é de recordar que o Afeganistão é um país em guerra constante desde os anos 80. 

São gerações perdidas para os combates, populações que mal conhecem mais do que as suas montanhas, de tremendo atraso educativo, económico e social. Tudo coisas que a intervenção americana pretendia mudar, mas falhou, redonda e tragicamente. Aquela terra fica para a história como uma das zonas amaldiçoadas do planeta, onde grassa o medievalismo religioso e um milenar fechamento cultural.