terça-feira, 11 de novembro de 2014
Terrores curtos na noite escura.
Uma belíssima surpresa, o espectáculo Curtas de Terror e Outras Coisas Fantásticas, a que assisti na noite de dia 8 no Palácio do Sobralinho. Os espectadores eram levados a percorrer os corredores escuros de um palácio com o seu quê de elegante decadência de fin de siècle para assistir a três momentos teatrais/performances. Na primeira delas Ana Vilela da Costa canalizava Audrey Hepburn com a performance Alice in Underwear, sobre o imaginário de Alice no País das Maravilhas com algum toque da nostalgia surreal do fantástico do passado. Uma alice vintage que recorda o seu coelho num décor simples mas eficaz, com o seu quê de antiquário e com estímulos videográficos e aurais. Houve ali belíssimos momentos estéticos.
Noutra sala escurecida assistimos a um trabalho de iluminação notável de Alexandre Lyra Leite no desconcertante Bounjour Chérie, performance minimalista onde uma criatura que faz recordar o loplop de Ernst contempla uma mulher deitada sobre uma mesa ao som de passagens dos Cantos de Maldoror de Lautréamont. O trabalho de luz, com focos certeiros a quebrar o negrume da noite, reflexos subtis na superfície polida da mesa, deixou-me encantado.
Terminou com a voz hipnótica de Bruno Schiappa nas suas repelentes Memórias de um Psicopata, micro-peça que já conhecia do Teatro Rápido mas que num decadente salão palacial fin de siécle de tecto com painéis deslubrantes mas com o restante espaço num vazio austero ganhou toda uma nova dimensão de horror. Note-se que qualifico de repelente no bom sentido. O texto é fortíssimo e incómodo, com a voz pausada e grave do actor cadenciada pelo barulho metálico da cadeira de rodas a circular pela sala a deixar os espectadores desconfortáveis. Que é, no fundo, um dos objectivos da peça.
Excelente, a ideia a de usar um palácio à noite, mergulhando espectadores em labirintos de corredores escuros para degustar peças curtas e happenings de horror/fantástico. Uma iniciativa do Palácio - Espaço de Criação.