quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Batman Black And White #01


É bom sentir que de vez em quando a DC Comics ainda sabe mimar os seus leitores com pequenos grandes trabalhos de banda desenhada. O que distingue a editora das restantes no mundo dos comics é saber manter para além da gama de títulos de consumo direccionados ao público juvenil algumas obras mais experimentais ou fora de norma, bem como revisitações graficamente ricas dos seus principais personagens. Algo que a Marvel tentou, falhando redondamente. Por outro lado, a crescente tentativa da DC em rivalizar com a arqui-rival no mercado cinematográfico tem ditado algumas agruras desastrosas na redefinição de personagens com décadas de história para caber no estreito espartilho do cinema de acção com efeitos especiais. Mas adiante. Graças a comics como este Batman Black And White a DC ainda vai mantendo o estatuto de qualidade visual que a diferencia no meio.

Quando digo que nós, leitores, somos mimados... é porque este comic é uma delícia. Começa com Chipp Kidd, autor do belíssimo Batman Death By Design a escrever e a definir um ambiente visual retro muito bem traduzido para a prancha pelo ilustrador Michael Cho. O tom replica o ar kitsch e inocente do personagem nos anos 60. Fica o aviso: cuidado com as armas de raios. Em vez do raio da morte podemos levar com um feixe de partículas que nos remete para as vastidões geladas da Coreia do Norte. Porque... apenas porque.


A cereja em cima do bolo delicioso é o inconfundível traço dinâmico e elegante do veterano Neal Adams. Tempos houve em que os argumentos patéticos da golden age eram salvos pelo brilhantismo deste ilustrador. Nesta edição especial um Batman zombie deambula pelas ruas de Gotham, incapaz de enfrentar os verdadeiros vilões do crime: sistema financeiro rapinante, desespero do desemprego ou leis populistas que transformam em graves crimes menores para manter a aura de dureza de responsáveis políticos. Contra estes vilões o mais inteligente dos heróis é impotente. Quanto ao toque zombie fiquemo-nos pelo clássico estratagema do sonho. Um pormenor curioso é a ausência de arte final nas ilustrações de Adams. Não há a suavidade da tinta, apenas a energia do traço do lápis a explodir na vinheta.


A Poison Ivy sempre foi sensual. Mesmo no estilo cartoon do ilustrador Joe Quinones a bela vilã continua elegante. A história é bem humorada, misturando a insanidade de Harley Quinn com a sabedoria química de Ivy e hamburguers contaminados com um vírus vegetal. E quando a circunspecta cientista tira a bata, o queixo do leitor cai. O meu caiu com esta elegante mistura de pin up com super-heróis.


O estilo expressivo de Sean Murphy é muito bem aproveitado numa história frenética de John Arcudi, que herdou de Mike Mignola o fardo de escrever os argumentos de B.P.R.D. para a Dark Horse. Sente-se a velocidade no traço e no uso dinâmico do grafismo e composição visual.


Para terminar, algo que faz recordar a estilização de Alex Toth. Confesso que por momentos ainda tive a esperança de estar a contemplar o desenho deste ilustrador, mas a autoria dos desenhos que acompanham esta história de crimes e bonecos de ventríloquos pertence a Chris Samnee.

Totalmente a preto e branco, Batman Black And White deslumbra pela mestria dos traços dos ilustradores escolhidos. As histórias oscilam entre as excelentes e as normais, que não levantam sobrolhos, mas ficam para segundo plano perante os docinhos para os olhos.