quinta-feira, 7 de março de 2013

Sonhos húmidos


"Tudo se deve a Salazr, que deve ser hoje o orgulho legítimo de todos os Portugueses, por ter corajosamente afrontado todos os obstáculos, sem desfalecer, e ter trasnformado um País decadente em uma nação próspera e prestigiada."

Assim se conclui o livro de história para a 4.ª Classe editado nos anos 40. Após uma liminar exploração da história de portugal termina com uma listagem elogiosa dos feitos do estado novo, terminando com a devida vénia ao übermensch que foi capaz de tirar o país da decadência e dar-lhe um novo e brilhante rumo. As palavras são bonitas, mas a verdade histórica mostra o estado novo como um longo período de obscurantismo social, político e económico onde a sociedade portuguesa estava pensada para protecção dos privilégios de uma elite rarefeita enquanto a grande massa do povo era reduzida à pobreza e ignorância, apregoadas como virtudes singelas por um regime totalitário fossilizado.


Nestes tenebrosos tempos contemporâneos de crise económica, política e social, quando vemos grande parte das liberdades e garantias constitucionais serem erodidas pela pressão financeira, diktats da troika e uma classe política corrupta e a soldo dos interesses do tipo de capitalismo ganancioso que dá mau nome aos capitalistas, é difícil não pensar que secretamente muitos dos que agora nos tutelam vivem numa nostalgia pelos saudosos bons velhos tempos em que um povo humilde e sereno laudava as migalhas da elite. É difícil não notar isso num sistema educativo cujo ministro tem uma visão decididamente instrucionista do que deve ser a escola, alicerçada no exame como finalidade geral da aprendizagem e com a  evocação do prestígio do colégio privado como forma de encobrir mais uma negociata descarada em que serviços públicos são desmantelados para favorecer empreendedores privados com dinheiros públicos.


 Estes antigos manuais devem aparecer nos sonhos húmidos da nossa classe governante. Sonhos de um tempo em que as massas intencionalmente empobrecidas sejam instruídas com o mínimo necessário para desempenharem tarefas na nova economia competitiva assente na mão de obra barata, sob o desdém dos meritocráticos grandes senhores que dominam este pobre país estrangulado por uma elite corrupta que se advoga detentora da verdade.  Uma distopia que a cada dia que passa parece cada vez mais próxima.

Intrigante aquele FIM após o elogio a Salazar. Na propaganda politica que passava por ensino de história Salazar e o Estado Novo eram o fim da história portuguesa. Após tortusosos centénios de glorias e decadência, um novo futuro sob o olhar zeloso do dtador?