sábado, 1 de outubro de 2011

Orson Welles, Facebook

Ao rever ontem o magistral Citizen Kane na Cinemateca fiquei com um pensamento depressivo na mente. Hearst, e a época aurea do jornalismo, tiveram em Orson Welles um brilhante biógrafo, que captou numa obra maior do cinema o espírito, a hubris e magnificência daqueles que se julgavam acima do comum e se arrogavam do direito de criar ou manipular a opinião pública através do controlo dos jornais. Hoje Hearst é uma nota de rodapé em parágrafos sobre dead media, monopólios e afins, mas Citizen Kane, esse filme ruidoso, ritmado e magnífico, perdura.

E nós? Vivemos uma era comparável à época em que os jornais inflamavam opiniões e competiam aguerridamente. Agora, os personagens maiores do que a vida desta história contemporânea são engenheiros brilhantes capazes de transformar pequenos nichos da nossa atenção em negócios multimilionários que pervadem a sociedade contemporânea. Qual é até agora a resposta cultural? Sò me recordo do esquecível The Social Network, noventa e tal entediantes minutos de product placement, cuja única cena minimanente memorável só é porque o realizador utilizou a técnica do tilt-shifting sublinhando a artificialidade e virtualidade das redes digitais. Faz falta um Orson Welles para criar uma crónica imortal das profundas mudanças conceptuais que vivemos nesta sociedade hiper-mediatizada.