domingo, 24 de janeiro de 2010

Growing Up Digital



Don Tapscott (1998). Growing Up Digital: The Rise of the Net Generation. Nova Yorque: McGraw-Hill.

O digital e a internet estão a modelar uma nova geração, diferente de todas as que a precederam. O poder transformativo das novas tecnologias confere aos jovens de hoje capacidades inéditas, que colocam em causa instituições, modos de vida e de trabalho. A enorme diferença entre esta nova geração, denominada pelo autor de N-Generation, e as que a precedem provoca desafios sociais e económicos, geradores de medos e ansiedades. Escrito em 1998, fez uma previsão correcta da revolução que a internet como meio de comunicação interactivo que dá voz a todos os seus utilizadores está a provocar na sociedade.

O que é esta n-gen? Constitui-se de crianças e adolescentes que convivem com a tecnologia nas formas em que brincam, socializam, aprendem e crescem enquanto pessoas. É uma proposição que assusta pais, educadores, instituições e estados. Os medos de alienação social, riscos de segurança e derrube de modelos estabelecidos cegam os membros de gerações prévias, que esquecem os desafios que eles próprios tiveram que responder ao afirmarem-se como geração. Alguns medos traduzem desconfiança e desconhecimento face aos novos media, outros reflectem o canto de cisne de instituições que se vêem numa curva descendente rápida em direcção à obsolescência.

Medos como os da falta de socialização, riscos de segurança e perda de valores morais são desmontados pela análise à utilização da internet pelos jovens. Esta é utilizada como um meio social (que a actualidade comprova com a enorme popularidade das redes sociais, incipientes à data de publicação da obra) que esbate barreiras geográficas e se alicerça na construção de relações com base na partilha de interesses e não na proximidade física, embora esta continue a existir. Mais do que alienar, expande a tipologia de relações sociais. Os riscos de segurança online são reais, mas menos significativos do que os da vida real. Não implica desvalorizá-los, mas criar culturas de medo e protecção exagerada revela-se contraproducente e danoso no que respeita à partilha livre de informação. A imagem da nova geração como uma sem valores, agarrada ao imediato de uma cultura online de jogos, navegação e conversação vista como alienante é desmentida pelo activismo online revelado pelos jovens, que passa por coisas tão simples como a criação de comunidades de interesses lúdicos como pela intervenção social potenciada pela rede.

É no declínio do poder de algumas instituições que se encontram os maiores dilemas que a n-generation (ou e-generation, se preferirem) enfrenta. Um exemplo é o controle de estados e instituições sobre a informação disponível e a correspondente visão do que é social e intelectualmente aceitável, nulificado por um meio que coloca todo o tipo de informação disponível a todos. Aqui, o desafio está no desenvolvimento de visões críticas perante a informação disponível, um dos medos que alicerça a visão do perigo digital mas que é desvalorizado pelas novas gerações, que desenvolvem meios formais e informais de validar a qualidade da informação a que têm acesso. Outro exemplo, relacionado com o primeiro, está no declínio dos meios de comunicação unidireccionais numa era em que as ferramentas digitais dão a possibilidade a todos de criarem os seus meios de comunicação.

Um exemplo que Tapscott utiliza continuamente é o da televisão, meio passivo que captura a atenção durante muito tempo sem exigir reflexão crítica, opondo-o aos novos media, imediatos, interactivos e cuja interactividade exige o desenvolvimento de capacidades de análise e reflexão. O que queremos para as nossas crianças? O modelo de passividade televisiva, seguro e conhecido, mas estéril, ou o mais enriquecedor modelo de interacção e partilha mediado pela tecnologia, assustador por nos ser desconhecido quanto às suas implicações e desenvolvimentos futuros?

Este dilema tem um peso bem real nas finanças: como é que as economias de consumo, que se baseiam na venda de bens padronizados a uma vasta gama de indivíduos similares nos comportamentos e desejos, com a similaridade estimulada pelo veicular de iconografias de modos de vida através de meios de comunicação unidireccionais, se adaptam aos novos consumidores, atomizados, capazes de discutir abertamente a informação que antes era aceite quase sem reflexão? Aqui Tapscott apresenta uma série de ideias que hoje já vemos em prática.

É na educação que os desafios causados pela tecnologia mais se fazem sentir. Este é um meio de transformações lentas, que pouco se alterou ao longo de décadas, e que se vê abalado pelas novas tecnologias. Outros media, como o cinema ou a televisão, não representaram ameaça ao modelo educativo tradicional, baseado na transmissão de conteúdos. Graças às suas similaridades foram adoptados como meios viáveis de aprendizagem. Mas os princípios da internet são radicalmente diferentes. Baseiam-se na colaboração, discussão, procura activa e interacção estimulante multidireccional. Não se coadunam com a noção de transmitir um tipo de informação a todos, em que um elemento assume o papel de sábio transmissor. Também não se relacionam facilmente com um sistema pensado de forma estanque e direccional.

Para mais, os desafios complexos de uma modernidade global, interrelacionada e sob ameaça ambiental obrigam a competências que os sistemas educativos tradicionais não estão desenhados para estimular. Aqui, Tapscott debruça-se um pouco sobre o construtivismo enquanto pedagogia pensada para estimular construção autónoma do conhecimento, pensamento crítico, criatividade e resolução de problemas, que se adapta perfeitamente às novas tecnologias. Esbarra, no entanto, com o formalismo da escola enquanto instituição, em particular na estanquicidade dos currículos e tempos e no modelo de transmissão de conhecimento. Outra barreira está na reacção do sistema a estes desafios, que se traduz num regresso aos elementos (back to basics), centrando-se na aprendizagem de conhecimentos tidos como essenciais (que o são) e na sua medição por testes estandardizados, sem dar o necessário passo seguinte na direcção da interpretação e pensamento crítico.

Tapscott termina o livro com uma nota de cautela e uma série de conselhos aos pais, educadores, empresários e políticos sobre como se adaptar e responder aos desafios da nova geração mediada pela tecnologia digital. Um deles é combater eficazmente a infoexclusão, que não se resolve com a simples distribuição e disseminação de equipamentos. Ter computador e ser capaz de o dominar não são sinónimos de ser capaz de agir e interagir na nova sociedade global, em rede, do conhecimento. Para isso são necessárias competências críticas, de análise e reflexão, que cabe à anterior geração estimular nas novas gerações.

Citações:

These latter technologies are unidirectional and controlled by adults. They are very hierarchical, inflexible, and centralized. Not surprisingly, they reflect the values of their adult owners. By contrast, the new media is interactive, malleable, and distributed in control. As such it cherishes a much greater neutrality. (p:26)

We are undergoing yet another vast and trembling shift from the magic of television to the magic of the interactive digital media. As with typography, and unlike the broadcast media, communications are recordedbased on the written word. Only this time such communications are many-to-many (unlike the press and TV which are one-to-many). Digital communications are both real time (chat), and nonsimultaneous (email, voice mail, computer conferences, bulletin boards, Web sites); and they extend beyond the eyes and ears to embrace (eventually) all the senses. While N-Geners do have all the world's information at their fingertips, it isn't accessed simply by pointing the mouse over the right link and clicking. It is accessed by choosing the right link to click on from a menu of items in the thousands. Never before has it been more necessary that children learn how to read, write, and think critically. It's not just point and click. It's point, read, think, click. (p: 63)

The lecture, textbook, homework assignment, and school are all analogies for the broadcast mediaone-way, centralized, and with an emphasis on predefined structures that will work best for the mass audience. (p:129)

"I think that we have underestimated the importance of play in general," Seely Brown says. "This technology and the way children use it may be opening up the kid part in all of us. It may enable us to get back in touch with free-form thinking and playing with ideas, images, relationships with other people, and so on. To be able to engage in more of a playful brainstorming, playful construction of ideas is increasingly important, as is the importance of being able to recognize the multiple forms of intelligence that we all have. (p:160)

The reason for this violence, and boys' attraction to it, is rooted in the traditional play patterns boys have always exhibited. Video and computer games replicate almost exactly the backyard culture of a boy's play space. (p:164)

Though it may be discomforting to admit, throughout history children have always played violent games. Early in this century, young boys played "war" with lines of tin soldiers, knocking them down one by one, or in one fell swoop, in a simulated battle. The next generation played cowboys and Indians or cops and robbers, where the youngsters themselves fell down and played dead. When parents stopped buying soldier figures and fake guns, children created their own weapons and continued to play out good guy/bad guy plots. Children are attracted to violence and critical studies of older media forms, including the fairy tale, suggest it is not always in children's best interests to remove from their cultural experience all material that parents deem is too provocative or violent. (p:165)

If so much of our development as individuals is dependent upon our grasp of the activities our parents don't know about, then pushing the limits on behavior norms (no matter how angry it makes adults) has to be considered a normal part of growing up. (p:177)

The digital media cannot be compared to the television, as the market determinists would have us believe. TV is basically a passive form of entertainment. The new media require the active, informed, literate participation of a user. The pattern of TV growth will not be replicated, because purchase and use of the new media ae skewed toward those who are literate and motivated for active participation. It is precisely those children who are disadvantaged in education, family income, and personal empowerment who will be least able and least motivated to embrace the new media. (p:257)