quinta-feira, 11 de setembro de 2025

Nether Station


Kevin Anderson (2024). Nether Station. Ashland: Blackstone Publishing.

Devo avisar-vos. Este é um daqueles livros que vos provocará insónias. Não estou a escrever isto como comentário sobre o seu conteúdo, que quem o ler depressa descobrirá ser um belíssimo voo literário de horror cósmico lovecraftiano. As insónias são provocadas pelo ritmo de leitura, este é um daqueles livros que se quer sempre continuar a ler, a virar a página, mesmo que a noite já vá adiantada. Sim, é assim tão empolgante e de leitura tão escorrida, mas outra coisa não seria de esperar deste autor, veterano do lado mais pop da FC, com vários livros da série Star Wars no seu currículo. Nota-se, na clareza da sua prosa e no ritmo que impõe à história.

Boa capacidade de escrita não serve de muito se a história a contar não for interessante, e aí afianço-vos que este livro brilha. É um cruzamento perfeito entre Hard SF e horror lovecraftiano, que traz o terror cósmico, bem, não consigo colocar de outra forma, ao cosmos. A história segue as desventuras de uma investigadora no espectro autista, especializada em buracos negros, e fascinada por una anomalia detetada na orla do sistema solar - um possível wormhole. As sondas para lá enviadas desaparecem sem deixar rasto, o que faz perder o interesse das agências espaciais, mas a situação muda quando anos depois se detetam os sinais emitidos pelas sondas a partir de Alfa Centauro, mostrando que a anomalia espacial permite atravessar o espaço-tempo e interligar diferentes sistemas solares. E nesse momento, a investigadora recebe um convite irrecusável.

Houve alguém que sempre manteve o interesse na anomalia, um magnata da indústria espacial (retratado, a bem da nossa sanidade de leitor, como um megalómano explorador e não como um sucedâneo muskiano). Líder na exploração de minérios no sistema solar, tem a base tecnológica e financeira para poder montar uma expedição aos limites do sistema, para investigar in situ o buraco de verme. A sua principal motivação é o orgulho pessoal de ser um explorador, de ficar com o nome registado na história por ser o primeiro a pisar um solo desconhecido, mas também não lhe escapa a possibilidade de se o buraco interliga sistema solares, se abrir todo um novo horizonte de exploração lucrativa. A sua nave de exploração é mais do que uma nave, está pensada para ficar no local e tornar-se uma estação permanente.

Ao fim de cinco anos de viagem (eu disse-vos, o livro combina terror com hard SF), e sucedem-se as descobertas mirabolantes. Cadáveres mumificados de seres alienígenas, asteróides que albergam instalações técnicas e militares de tecnologia anciã mas avançada, um misterioso tempo de gelo espacial, de arquitectura não-euclidiana com estátuas que retratam criaturas que ao ser contempladas, o cérebro se mostra incapaz de compreender.  Começam também as peripécias, com os primeiros testes de envio de cobaias vivas para lá do horizonte do buraco a cavar mais fundo o fosso do horror. É um crescendo que se desenvolve de forma inevitável, com imensos sustos, mortes misteriosas, criaturas possuídas pela loucura, zombies alienígenas e males que corrompem a vegetação e animais. 

Anderson acelera o avanço da história com alguns elementos deus ex machina, que permitem perceber a lógica dos mistérios. E assim ficamos a saber da guerra cataclísmica que opôs seres alienígenas ao jugo tirânico de monstruosos seres capazes de escravizar civilizações, criaturas de horror cósmico que após sacrifícios titânicos foram banidas da realidade e escorraçada para os espaços intersticiais. Criaturas que dormem, aprisionadas no não-espaço entre o tecido do universo. Criaturas que aguardam o momento de despertar na sua senda destrutiva, e o ato de seres conscientes atravessarem os buracos de verme é o despertador que necessitam.

É, de facto, uma mistura perfeita entre terror e ficção científica. Anderson pega no mythos lovecraftiano e cruza-o com a FC clássica, exploratória e procurando base científica. A inspiração óbvia é At The Mountains of Madness, diretamente referenciada na narrativa, mas também inclui uns polvilhos de The Colour Out of Space. A leitura é excelente, o ritmo imparável, e a satisfação para os conhecedores e amantes lovecraftianos, imensa.